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Por que setembro tem cheiro de caruru na Bahia? Conheça a história por trás da tradição

Na Bahia, o caruru une catolicismo e religiosidade africana em celebrações que atravessam gerações

Isabela Cardoso

Por Isabela Cardoso

26/09/2025 - 6:05 h
Caruru de São Cosme e São Damião servido para frequentadores do Pelourinho, em 27 de setembro de 1995
Caruru de São Cosme e São Damião servido para frequentadores do Pelourinho, em 27 de setembro de 1995 -

Caruru tem na Bahia o ano inteiro, mas setembro é diferente. O mês chega com cheiro de quiabo, dendê e camarão seco espalhado pelas ruas, atravessa as casas e ecoa nos terreiros. É quando o prato deixa de ser apenas comida e se transforma em símbolo de devoção, memória e identidade.

Durante todo o mês, famílias e comunidades preparam carurus em homenagem a São Cosme e Damião e aos orixás Ibeji, reforçando a tradição que une gerações em volta da mesma panela. Essa tradição nasce da mistura entre fé católica e religiosidade africana, como explica o antropólogo e babalorixá Vilson Caetano, professor da Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia (UFBA).

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“Esta festa se explica pela relação construída entre os santos católicos Cosme e Damião e os orixás Ibeji, da tradição iorubá. No Brasil colônia, o culto dos primeiros estava relacionado à saúde e estes santos são celebrados na liturgia católica no dia 26 de setembro", conta o babalorixá, em entrevista ao Portal A TARDE.

Essa mesma relação é lembrada na Umbanda como exemplo de resistência cultural. Para Adriana Teixeira, pedagoga e sacerdotisa da Mesa Branca de Caboclo, o sincretismo é mais do que sobrevivência.

“Cosme e Damião são santos católicos que eram médicos e essa cultura foi difundida aqui na Bahia... O sincretismo religioso fala da astúcia, da inteligência e da capacidade dos nossos ancestrais de continuarem cultuando as suas divindades africanas na época da escravidão, representados por santos. O significado dessa oferta é muito importante, porque é um momento de conexão com as crianças e um resgate ancestral de tradição", destaca a mãe de santo.

Caruru de São Cosme e Damião
Caruru de São Cosme e Damião | Foto: Olga Leiria / Ag. A Tarde

Caruru: festa, alimento e símbolo

O termo “caruru” carrega múltiplos sentidos: o prato, a festa e até o próprio quiabo. Vilson lembra que a diversidade dessa expressão é tamanha que a tradição se reinventa em diferentes contextos.

“Uma coisa é o caruru oferecido dentro de um terreiro ou por uma pessoa iniciada no candomblé. Outra coisa é o caruru oferecido por uma pessoa que não possui qualquer vínculo com estas religiões. O que une estes dois carurus são os chamados preceitos, mas são preceitos diferentes", explica.

Na prática, tanto na Umbanda quanto no Candomblé, a festa se organiza em torno da fartura e do protagonismo infantil. "Simboliza a prosperidade, a pureza, a alegria da criança. Lembrando que todos nós temos uma criança interior dentro de nós e, muitas vezes, por diversos desafios da vida, a gente esquece que tem essa criança. É o momento de lembrar da infância e lembrar que podemos ter esperança em uma vida melhor", conta Adriana.

Nos terreiros, cada comunidade dá forma própria ao caruru. Sete crianças participam do banquete servido especialmente para elas, enquanto os adultos cantam e tocam atabaque.

“Faz parte do banquete uma mesa oferecida a 7 meninos ou a 6 meninos e uma menina que comem as iguarias num prato enquanto os adultos entoam canções. Há comunidades também onde os pratos são substituídos por uma grande gamela e as crianças comem juntas", explica Vilson.

Vilson Caetano, antropólogo e babalorixá
Vilson Caetano, antropólogo e babalorixá | Foto: José Simões/Ag A TARDE

O banquete como remédio sagrado

A fartura e os símbolos dos alimentos transformam o caruru em oferenda e em remédio espiritual. Vilson ressalta os elementos indispensáveis. “O primeiro é a presença de crianças, pois elas significam a continuidade. Depois a fartura de comida, que traz abundância, e por fim, as bebidas ligadas ao prazer, à alegria e à celebração".

Cada ingrediente ganha ainda o peso de uma devoção específica, representando a energia de um orixá, explica Adriana. “Os elementos que não podem faltar no caruru é o quiabo, o camarão, o dendê, a castanha, o gengibre e o amendoim. Já os elementos do prato são: caruru, vatapá, arroz, feijão fradinho, feijão preto, farofa de dendê, xinxim de galinha, banana frita, milho branco, pipoca. Cada alimento representa um orixá. É um banquete rezado e consagrado, feito com zelo e devoção", conta Adriana.

Adriana Teixeira, pedagoga e sacerdotisa da Mesa Branca de Caboclo
Adriana Teixeira, pedagoga e sacerdotisa da Mesa Branca de Caboclo | Foto: Arquivo Pessoal

Tradição que resiste

Apesar das mudanças sociais, a tradição do caruru permanece como elo entre passado e futuro. Para Adriana, a continuidade depende da ação de cada geração.

“Muitas pessoas reclamam que a tradição está se perdendo, mas nós somos a continuidade dos nossos ancestrais. Eu sempre costumo falar, se você gosta de caruru, faça o seu. Tradição se mantém viva fazendo. Nossos ancestrais só morrem quando a gente esquece as práticas que eles faziam. É possível e necessário que as crianças de hoje saibam que existe essa tradição e que ela é viva", completa a mãe de santo.

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candomblé caruru são cosme e damiao umbanda

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