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05/03/2023 às 5:30 | Autor: Priscila Dórea

BRASIL

Apenas 38% dos cargos de liderança no país são ocupados por mulheres

Igualdade no mercado de trabalho permanece um desafio

Jamile Musafiri, empresária e proprietária da Madame Nalwango, startup de moda especializada em estampas africanas
Jamile Musafiri, empresária e proprietária da Madame Nalwango, startup de moda especializada em estampas africanas -

As mulheres superam em 4,8 milhões o número de homens no Brasil, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e mais de 48% das 108,7 milhões de brasileiras sustentam a casa. Enquanto isso, apenas 11% dos conselhos de empresas (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) e somente 38% dos cargos de liderança no Brasil (Women in Business 2022), são ocupados por mulheres. A conta não bate, mas a busca por equidade é ininterrupta, com gerações de mulheres avançando para ocupar os espaços de poder.

“Mas é preciso fazer isso com simpatia para com as outras mulheres. Mulheres abriram o caminho para eu poder estar aqui hoje, mas outras tantas foram silenciadas”, afirma a líder indigena Kandara Pataxó, que é coordenadora de mulheres indígenas no Conselho de Cacique, diretora do Centro de Atendimento às Mulheres Vítimas de Violência Doméstica, co-fundadora da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (ANMIGA) e diretora nacional de mulheres da Confederação Nacional da Agricultura Familiar do Brasil (Conaf).

Esse desejo de fazer parte das decisões de Kandara já dava sinais em sua infância. “Eu era a menina rebelde que queria ver e saber de tudo, em um tempo em que nem mesmo as anciãs do território tinham espaço de opinião”, conta. A mãe dela, Iamani Pataxó, a primeira cacica do território Coroa Vermelha, foi uma de suas grandes inspirações, assim como Dona Mirinha, Sônia Guajajara, Ce´lia Xakriaba´ e muitas anciãs que vieram antes dela.

“Hoje sinto orgulho de estar onde estou por mérito de luta, mas não alcancei nada disso sozinha e sim com o coletivo. Por isso que para mim, toda conquista vem acompanhada de responsabilidade e essa é a razão do porque precisamos sair das falas. Discursos bonitos não valem muito se não forem postos em prática”, enfatiza a líder indigena.

E quem bem entende de praticar tudo aquilo a que se propõe é a artesã Rosângela Ferreira Ramos. Crocheteira de mão cheia - com peças que vão das blusas aos biquínis -, ela também faz faxina e depilação em domicílio. “Me viro nos trinta, né? É a lei da sobrevivência e é algo muito pesado, mas não há outro caminho, à medida que envelhecemos as oportunidades de trabalho diminuem. Porém, independente dessas dificuldades, acho que é preciso manter a dignidade acima de tudo e persistir. Sou uma pessoa muito persistente e por isso acabei me tornando a minha própria inspiração, sei o quão duro eu trabalho”, afirma.

Rosângela (ou Rosa, como é chamada) tem uma filha de 30 anos, é separada e, apesar dos muitos trabalhos que têm - com uma clientela fiel criada só no boca a boca -, a artesã se mantém positiva sobre o futuro e o presente. “As oportunidades mudam muito com o passar dos anos, mas a gente vai se transformando e mudando à medida que as necessidades surgem, e a vida segue seu curso. Por isso que, se eu pudesse dizer algo para as outras tantas mulheres que estão aí na luta todos os dias, é que perseverem e se mantenham firmes naquilo que acreditam”, aconselha.

Mudança de governo

E para muitas mulheres, o momento para perseverar diante das escolhas e se manter combativas por seus direitos nunca foi tão propício como agora. Uma delas é a comunicóloga, mestre em gestão, radialista e empresária, Jamile Musafiri, proprietária da Madame Nalwango, loja de roupas que tem como objetivo desmistificar que tudo que vem de África deve ser consumido apenas por pessoas de religião de matriz africana ou que são negras. Para ela, a mudança de governo é mais que um alento, é uma esperança real de mudança.

“Essa mudança de governo está trazendo de volta aquilo que é nosso e que nos foi cancelado por políticas públicas de uma liderança que não abraçava a diversidade que é o Brasil. Já atuei na diplomacia, inclusive estrangeira, e era notório o papel do Brasil enquanto referência de mediação, mas perdemos isso, ficamos congelados nos últimos anos. Hoje, a composição do governo foi escolhida com cuidado e dentre as muitas frentes de defesa que eles estão trabalhando, a luta contra o machismo ganha muita força com um governo que é construído justamente para ser antimachista”, aponta a empresária.

A líder indigena Kandara Pataxó, salienta que os últimos quatro anos foram de resistência. “Nós, povos originários, já nascemos com o objetivo de ser resistentes, por isso que, apesar da mudança de governo ser muito bem vinda, não foi recebida com comodismo. É ótimo que o governo seja sensível às causas indígenas e das mulheres, mas precisamos continuar falando e demandando ações dele. Já há uma mudança de comportamento, mas além dela, queremos que as políticas públicas cheguem de fato”, enfatiza.

Assim como Kandara, uma das principais inspirações de Jamile Musafiri é materna. Sua mãe, a advogada Silvia Cerqueira - especializada em Direitos para as Mulheres e Afrodescendentes -, foi quem desde muito jovem a guiou para ser a melhor pessoa possível, levando a vida com inteligência e buscando independência. Ela cresceu sendo ensinada e encorajada pela mãe a todo momento, e um dos grandes avanços que percebeu com o passar dos anos foi a mudança de pensamento das mulheres.

“Da minha adolescência até hoje, percebi um maior número de mulheres buscando empoderamento pelas linhas do empreendedorismo e empresariado. Antes, o ecossistema de negócios era bastante fechado, com perfis e endereços totalmente masculinos. Uma barreira masculina, entende? Não que a presença masculina seja um problema, pelo contrário, isso faz parte da sociedade e vivemos nesse ecossistema, a questão é a igualdade. Ainda não encontramos esse ponto de igualdade entre os gêneros, mas a luta continua. O momento agora é de avançar ainda mais”, garante Jamile Musafiri.

Igualdade no mercado de trabalho permanece um desafio

Debates sobre os direitos das mulheres acontecem nos dias de hoje com grande intensidade se comparado a décadas atrás, mas a paridade - a igualdade e equilíbrio de salário ou mesmo entre níveis similares dentro âmbito profissional, entre homens e mulheres -, ainda demandará muitas lutas. Um dos grandes vilões dessa situação é o patriarcado, “assim como o machismo, que está incrustado na nossa sociedade e a cada dia que o combatemos, mais ele aparece”, afirma a professora, ativista e vereadora, Marta Rodrigues.

É por essa razão que hoje notamos, presenciamos e combatemos tanto o aumento da misoginia e do machismo, aponta Marta, pois ele veio principalmente do último governo, declaradamente machista. “As consequências foram graves, com o aumento de feminicídios e de casos de agressão contra as mulheres, além da retirada de programas e políticas públicas, que agora retornam com o governo Lula. Hoje há uma esperança maior de que voltemos a ser um país que debate, formula, elabora e coloca em prática políticas para as mulheres”.

Mesmos com as dificuldades políticas e sociais dos últimos anos, as longas lutas contra o assédio e a chamada ‘cultura do estupro’ avançaram de forma positivas em alguns momentos, pondera a CEO do Wakanda Educação Empreendedora, Karine Oliveira. Mas é apenas combatendo toda forma de discriminação oriunda de uma sociedade patriarcal, que tais lutas se tornarão conquistas concretas e a paridade de gênero, em todos os espaços e direitos, poderá sair do âmbito do desejo e se tornar uma realidade para as mais de 108 milhões de mulheres do Brasil.

“Acho que um dos sinais que vai nos fazer perceber que estamos chegando lá de fato, será quando pudermos permanecer em qualquer lugar sem precisar usar de estratégias para não ser assediada ou violentada. Inclusive, quando a gente puder apenas sair para beber em paz, sabe? A mudança de governo muda muita coisa, porque era muito difícil você lutar contra algo que uma liderança diz não existir. Esse é o momento de retomar as políticas de conquistas sociais por paridade de gênero em todos os locais. De forma obrigatória nas empresas, nos setores e no alto escalão, em todos os espaços”, enfatiza Karine Oliveira.

Internet é uma aliada para projetar referências femininas

Nessa extensa luta das mulheres por direitos e respeito nas últimas décadas, a internet - com todas as suas problemáticas -, se tornou uma importante aliada. “Hoje podemos pesquisar e encontrar mulheres que se tornam referência para nós, conseguimos abrir espaços, e trocar informações sobre o que cada uma está passando dentro de suas ocupações e o que ainda é preciso melhorar. Temos nos articulado mais e nos dado conta da existência dessas mulheres que sim, estão em todos os espaços, o que nos faltava era conhecer essas histórias”, explica a empresária Karine Oliveira.

CEO da Wakanda Educação Empreendedora - negócio de impacto social que usa linguagem informal e regional para falar sobre empreendedorismo -, Karine ressalta todo o histórico de luta social e política que contribuiram para que as mulheres sejam reconhecidas nos espaços de poder e outras instâncias. “Era muito escasso na minha adolescência conseguir conhecer uma mulher doutora, química, engenheira e etc, que estivesse em uma multinacional. Elas sempre existiram, mas eu não conseguia ter acesso a elas e suas histórias. Então, como elas iriam me inspirar ou representar?”, questiona a jovem baiana, que foi capa da revistas Forbes em 2020.

Para a jornalista, ativista, fundadora do Movimento Eu Não Mereço Ser Estuprada e autora dos livros Os meninos são a cura do machismo, Presos que Menstruam e Eu, Travesti, Nana Queiroz, ocorreu um despertar das mulheres jovens através das redes sociais entre os anos 2010 e 2020, com a massificação do conceito de feminismo. “Não era o tipo de informação que se encontrava com facilidade, assim como discussões sobre empoderamento feminino e proteção contra violência doméstica, por exemplo. Não existia essa fartura de fontes e serviços online, com mulheres se organizando para ajudar outras mulheres”, afirma.

A internet teve um papel importante na democratização do acesso à informação e ajudou a ampliar a consciência das mulheres sobre o que é certo, o que é justo, o que elas merecem e o que não é aceitável, não só nos relacionamentos. “Mas isso também gerou uma reação oposta, com homens que não estão preparados para esse empoderamento e mulheres que se aliaram a eles por medo de ficar sem o amor masculino caso mudassem. Tem ocorrido uma reação muito grande do conservadorismo e dessa mensagem de misoginia que eles passam”, pondera Nana Queiroz.

Rumo à Idade Média

Por essas razões, a grande batalha hoje é em prol da desradicalização do Brasil, nos mais diversos âmbitos, aponta a jornalista, pois é a radicalização que está levando as pessoas a questionarem se a terra é redonda e se as vacinas são boas, por exemplo. “É uma guinada rumo à Idade Média muito pesada. E quem precisa combater isso são todos aqueles que prezam pela evolução da civilização humana. É uma batalha que não é só política, mas também de inteligência emocional, para entender que uma mulher empoderada, por exemplo, não enfraquece os homens”, explica.

E ainda que cargos de poder reconhecidos sejam importantes para o avanço da equidade, Nana Queiroz salienta que inspirações femininas de empoderamento podem ser encontradas em todo o lugar. “Nós vemos mulheres do nosso dia a dia conquistando coisas e nos dando espaço para acreditar em nós mesmas. A identificação é algo muito poderoso, porque quando uma mulher sobe, ela naturalmente traz outras mulheres pela força do exemplo. Tenho inspirações intelectuais como Bell Hooks, Clarice Lispector e minha própria ancestral, Raquel de Queiroz, mas elas não são mais poderosas pra mim do que as mulheres reais que passaram pela minha vida me mostrando que era possível”, afirma.

E é notável essa inspiração que vem das mulheres do nosso dia a dia, mulheres aparentemente comuns, mas que não são de forma alguma ordinárias, pois todas elas deram os passos iniciais que permitiram que essas histórias e ponderações fossem contadas até mesmo aqui, nesta edição de A TARDE. “Do ramo empresarial, mulheres como a Camila Farani, Monique Evelle e Adriana Barbosa são importantes inspirações para mim. Mas a minha grande inspiração continua sendo a minha mãe, Cátia Santos, que mostrou que tipo de mulher eu gostaria de ser no mercado de trabalho, com idoneidade, respeito e alegria”, conta Karine Oliveira.

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