ENTREVISTA | ISABELA SUAREZ
Baía Viva promove desenvolvimento sustentável da BTS
Fundação Baía Viva se destaca pela aplicação de recursos privados em suas ações
Por Da Redação
Declaradamente apaixonada pelo que faz, a advogada Isabela Suarez é presidente da Fundação Baía Viva, organização social sem fins lucrativos que busca resgatar a importância turística e ambiental das ilhas da Baía de Todos os Santos. Além disto, ela é membro da Comissão de Meio Ambiente da OAB-Bahia e coordenadora do núcleo de sustentabilidade da Associação Comercial da Bahia (ACB). Nesta entrevista ao A TARDE, ele fala sobre o trabalho à frente da fundação na preservação ambiental.
São mais de duas décadas de história da Fundação Baía Viva. Na sua avaliação, o que de principal tem sido feito nos últimos anos, nas ilhas dos Frades e Bom Jesus dos Passos, no âmbito socioambiental?
A Fundação Baía Viva nasceu da necessidade de resgatar e valorizar as relações socioambientais. O cenário vivenciado no final dos anos 90 era de decadência na inter-relação dos atributos da Baía de Todos os Santos, amplificado pela falta de planejamento ocupacional, com consequente e sistêmica degradação dos recursos naturais. Diante da importância histórica como marco no processo de construção civilizatória do Brasil, a Baía de Todos os Santos, sofria com a precariedade socioeconômica e territorial das comunidades residentes. Com objetivos bem definidos, a Fundação Baía Viva, nesses 22 anos, vem com muito esforço e sensibilidade, resgatando a identidade, a sociabilidade, o prestígio e a dignidade dessas comunidades.
A temporalidade do trabalho feito pela Fundação, através da mobilização dos atores sociais e econômicos, aliados de maneira inédita, culmina em pioneirismo protagonista da consolidação para a preservação do meio ambiente, com significativa melhoria da qualidade de vida das pessoas, a partir de iniciativas que promovem e vão continuar a promover a geração de renda, com potencialização e fomento da vocação local.
O que teria de inédito nesse processo de mobilização social e econômico? E como se manifesta de forma prática essa transformação conjunta com três pilares, que muitos ainda consideram distintos: ambiente – urbano – social?
A premissa de existência e atuação da Fundação Baía Viva é justamente a compreensão deste conceito, de enfrentar as dificuldades e propor soluções.Um meio ambiente sadio e equilibrado só existe, de fato, quando há dignidade, infraestrutura e oportunidade de geração de renda àquela população local. O que há de inédito é justamente essa visão amplificada que a Fundação buscou ter, identificando a vocação econômica, respeitando a identidade territorial, dentro do sentimento de pertencimento e a sociabilidade estabelecida nas ilhas. Conseguimos, através de uma equipe multidisciplinar, a participação e aderência dos moradores das Ilhas, demonstrando a eles que não era um projeto de gaveta, mas, uma realidade, que eles já poderiam vivenciar, usufruir, participar e diagnosticar os resultados. De forma prática, viabilizamos a restauração do patrimônio histórico – muito presente na Baía de Todos os Santos (BTS), posteriormente a implantação de infraestrutura básica, hoje, já estamos buscando as condições intermediárias e com persistência iremos avançar mais.
É um trabalho complexo, pois se trata de requalificações urbanísticas e ambientais. Contudo, a atuação da Fundação Baía Viva se destaca pela aplicação de recursos exclusivamente privados em todas as suas ações, com pressuposto no desenvolvimento sustentável da BTS. Não há como separar as melhorias urbanísticas da consequente melhoria ambiental, um exemplo claro disso são os estaleiros de Bom Jesus dos Passos. Antes, a manutenção das embarcações era feita dentro da água, com derramamento de óleo, graxa, e tudo mais, hoje, aqueles profissionais possuem um ambiente adequado para realizar o trabalho, sem impactar o meio ambiente.
Então, através do trabalho que vocês realizaram e realizam, foi possível perceber uma relação harmônica entre meio ambiente e desenvolvimento?
Total! Isso é notório, basta observar o cenário e terá um diagnóstico comparativo das áreas onde conseguimos atuar, com outras que ainda não iniciamos esse trabalho de resgate histórico-urbano-social-ambiental. Isto porque, ainda há muitas áreas que carecem de investimento e planejamento da ocupação, principalmente aqui em Salvador, onde o cenário é de absoluto subdesenvolvimento. A falta de planejamento tem gerado em outras localidades um processo acirrado de favelização, com impactos ambientais seríssimos, como a geração de resíduos sólidos (lixo), esgoto a céu aberto, impermeabilização indiscriminada, entre outras agressões ao meio ambiente.
Qual é a importância da vocação turística das ilhas da BTS e quais são as localidades que tendem a se destacar mais nesse quesito? Existe algum projeto governamental que mereça destaque nessa região?
O turismo representa um dos principais segmentos econômicos do mundo, e tem sido uma das atividades que mais cresce nas últimas décadas. Em um panorama socioeconômico como a do Estado da Bahia, é fundamental promover o Turismo como um eixo de desenvolvimento sustentável. A BTS reúne uma infinidade de possibilidades, não fosse à falta de infraestrutura turística, poderiam perfeitamente protagonizar a preferência dos visitantes. Entretanto, o abandono e a opção por decisões equivocadas em relação às atividades vocacionadas, não fizeram emergir destinos como os edifícios históricos do Paraguaçu, a Baía do Iguape, a ilha de Cajaíba, a Escola Técnica de São Bento das Lajes, os engenhos de todo o Recôncavo, contra costa de Itaparica, as cidades turísticas de Cachoeira, Jaguaripe, Nazaré, Santo Amaro, São Francisco do Conde e tantos outros. Nesse contexto, Ilha dos Frades e Bom Jesus dos Passos se posicionam como locais de destaque, face a todos os investimentos aplicados.
É uníssono que o planejamento das atividades náuticas é uma extensão do ordenamento costeiro, para tanto, uma estratégia bem construída, pode tornar o Brasil um destaque no Mercado Náutico Mundial, são 8.500 quilômetros de costa atlântica navegável com a facilidade de poder ser utilizada durante boa parte do ano. Temos a 1ª baía do Brasil em dimensões e a 2ª do mundo, com possibilidades reais de transformar a economia de diversos municípios através do desenvolvimento do Turismo Náutico. Nesse sentido, merece destaque o programa do governo do Estado – PRODETUR que recentemente concluiu a entrega de 12 intervenções distribuídas entre vários pontos do recôncavo baiano.
Os projetos que a Fundação Baía Viva têm desenvolvido também contribuem para a geração de emprego e renda das populações locais? Caso sim, quais podem ser destacados?
Trata-se de um projeto de mudança de paradigmas, de preparação dessa população, onde são fomentados o empreendedorismo e a educação ambiental como instrumentos de aprimoramento da geração de renda. Entretanto, o projeto não possui caráter assistencialista. Por isso, podemos afirmar que as ações desenvolvidas pela Fundação Baía Viva contribuem, para a geração de emprego e renda dos moradores da região. Nossos projetos buscam a valorização gastronômica, artística, cultural e empreendedora dessa população. Podemos assim, afirmar que, ao longo de duas décadas, milhares de empregos e empreendedores foram beneficiados nessa região, pois proporcionamos a estas pessoas dignidade e independência para gerirem economicamente suas vidas.
Precisamos de um capítulo à parte para listar todas as atividades que nesses 22 (vinte e dois) anos, beneficiaram a região. Portanto, diante dessa imensa colaboração, destaco algumas delas que contribuem de maneira muito eficaz para o crescimento da empregabilidade: Cerimonial Loreto, Estaleiro de Bom Jesus dos Passos e as requalificações dos centros gastronômico e culturais da região.
Como o combate a pesca de bomba na Baía de Todos os Santos afeta a sustentabilidade das áreas urbanas de seu entorno, inclusive da capital, Salvador?
A ocupação do litoral é formação de grandes centros urbanos em seu entorno é fenômeno humano histórico e recorrente. Aqui na Baía, por exemplo, além da colonização de exploração e da sede da primeira capital do país,atividade econômica que justificou o povoamento da América portuguesa foi dada pela cultura da cana-de-açúcar e a implantação dos engenhos. As naus eram o meio de transporte que levaram essa mercadoria, pelo oceano Atlântico, em direção ao Velho Continente, além da necessidade de defesa do imenso território. Mais recentemente o fenômeno se acentua, em razão do avanço tecnológico, da revolução industrial, houve aumento populacional. As áreas urbanas, hoje, concentram grande parte das atividades sociais, e a zona costeira cumpre um papel fundamental recreativo, turístico, cultural, ecológico, científico, de transporte, geológico, histórico, entre outros. Neste contexto, a importância estratégica da zona costeira brasileira pode ser evidenciada em vários aspectos, seja pelo mosaico de ecossistemas que abriga enorme biodiversidade, ou pelos interesses citados, além dos aspectos econômicos. Encerrar e combater a pesca de bomba, predatória, danosa e altamente impactante é proteger todos eles, portanto, é garantir a sadia qualidade de vida, o equilíbrio, a sustentabilidade e as funções sociais da cidade em território continental. Em especial, destaco que também assegura a higidez das feições de estuários, restingas, costões rochosos, manguezais, marismas, entre outros aspectos sensíveis do patrimônio natural marítimo que repercutem no dia a dia de cada cidadão e do planeta, notadamente quanto às mudanças climáticas, pois que, como se sabe, os mares são os verdadeiros pulmões do mundo.
Em geral toda a faixa marítima e terrestre da Zona Costeira está sujeita a vetores de desenvolvimento em franco processo de expansão, dentre os quais destacam-se o turismo, a aquicultura e pesca, a exploração petrolífera, as grandes estruturas industriais, portuárias e etc... Não só na interface costeira estão situadas as fontes dos problemas incidentes na região, há conexões diretas e indiretas estabelecidas tanto com o ambiente marinho quanto com a porção continental do território. Daí, toda ação de proteção ao ambiente marinho, como o combate a pesca com bombas e outras ações da FBV, são ações de proteção do continente, das cidades e, claro, de Salvador.
E o contrário. Os impactos urbanos afetam os mares e ilhas?
Claro. O meio ambiente é sinérgico. Tudo está, em alguma medida, conectado. O destino final da maior parte das substâncias descartadas em cursos d'água ao longo das bacias hidrográficas é o ambiente marinho. Adiciona-se a isto o aporte de resíduos sólidos, em especial materiais plásticos, que se decompõe lentamente no ambiente natural e/ou não são diluídos. Estes materiais possuem formas e tamanhos diversos e podem facilmente ser confundidos com alimento por diversos animais e podem, por tanto, prejudicar atividades como a pesca, a navegação e o turismo. O papel das cidades na busca pela sustentabilidade é determinante. O lixo ainda é um dos principais desafios dos governos na área de gestão sustentável. No entanto, na última década, o Brasil deu um salto importante no avanço para a gestão correta dos resíduos sólidos. Mas não é só. É preciso cuidar de transporte, lazer, moradia, circulação, saneamento, infraestrutura, cultura, emprego, saúde, educação. Tudo isso impacta nos mares e ilhas. E é por isso que a FBV tem projetos verdadeiramente sustentáveis, que envolvem o tripé da sustentabilidade nas Ilhas e comunidades em que atua, com resultados significativos na proteção dos mares, da natureza, mas, igualmente, das pessoas.
Com base na sua experiência, quais são os maiores desafios de desenvolver projetos socioambientais nas ilhas da BTS?
Nunca se discutiu tanto sobre a temática socioambiental e todas as providências necessárias para garantir a manutenção dos recursos naturais e o bem-estar das futuras gerações. Já está provado que os instrumentos de comando e controle precisam ser complementados por instrumentos econômicos. Entretanto, muito se discute, mas pouco se faz para enfrentar aquela que, sem dúvida, é a maior inimiga do meio ambiente: a miséria que se encontra a população. A desigualdade social é o grande obstáculo para o alcance do desenvolvimento sustentável. A inciativa privada é uma aliada indispensável nessa construção. Todos nós do setor privado, poderíamos desempenhar um papel infinitamente mais relevante na solução dessa questão, não fosse um ambiente de hostilidade direcionado ao setor empresarial. Ademais, não podemos deixar de falar sobre a caluniosa campanha contra o desenvolvimento regional, onde há uma deturpada estigmatização do empresário, provocada por alguns segmentos da sociedade civil, que em conjunto com órgãos do Estado, afastam, aqueles que poderiam ser os grandes parceiros da Baía de Todos os Santos.
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