CADERNO 2
Banda baiana Headhunter D.C. comemora 35 anos com novos projetos
Mesmo com temas mórbidos do death metal, banda tem vida longa e prestígio
Por Bruno Santana*
"Desgraça ao corpo de Deus, enterrado e esquecido numa tumba decrépita. Seu apodrecimento é o meu prazer". "Horror é tudo que eu vejo. Eu sinto dentro de mim uma vontade de gritar. Estou morrendo, não posso me salvar. Não há vida, apenas sofrimento". "O mal está à solta, a morte está chegando com seu poder incontrolável. Saudações ao inferno!".
Essas são três estrofes (traduzidas livremente, já que as músicas são cantadas em inglês) de canções do Headhunter D.C., banda de death metal soteropolitana que comemora, em 2022, 35 anos de existência com uma trajetória e reconhecimento invejáveis. E, embora três recortes de letras não sejam suficientes para resumir três décadas e meia de produção artística, o parágrafo acima já dá uma boa ideia do tom e da filosofia que levaram o grupo a uma posição de destaque no cenário do metal nacional e internacional.
Atualmente, composta pelo vocalista Sérgio "Baloff" Borges, os guitarristas Danilo Coimbra e Tony Assis, o baixista Stanley Serravalle e o baterista Daniel Brandão, o Headhunter D.C. comemora seus 35 anos em grande estilo. No próximo dia 2 (sexta-feira), em São Paulo (SP), a banda será uma das atrações da 14ª edição do Setembro Negro, um dos festivais de metal mais tradicionais do Brasil. Por lá, o grupo e seus fãs poderão comemorar o marco de ser a banda mais antiga do death metal brasileiro em atividade constante, sem interrupções ou hiatos.
Segundo Sérgio, que acompanhou a banda desde as origens e entrou como membro oficial em 1989, o aniversário é uma demonstração de como o Headhunter D.C. conseguiu deixar sua marca num cenário tão característico.
Ainda de acordo com o vocalista, não há como apontar um momento principal ou de destaque nesses 35 anos de banda. "Cada objetivo alcançado, por menor que possa parecer, já deve ser considerado um grande marco em nossa carreira, principalmente tendo como parâmetro as dificuldades que temos enfrentado ao longo dessas três décadas e meia para manter uma banda como a nossa ativa sem qualquer apoio externo numa cidade como Salvador. Após tantas batalhas, e vendo seu trabalho servindo de referência para diferentes gerações, uma hora finalmente essa ficha cai, e isso é motivo de muito orgulho para nós", conta.
Made in Bahia
Desde a fundação em 1987, pelo guitarrista Paulo Lisboa (que deixou a banda em 2017), o Headhunter D.C. sempre teve orgulho de se apresentar como uma banda baiana, mesmo produzindo e tocando nos principais estúdios e palcos do Brasil afora. De fato, a história do Headhunter D.C. tem alcance mundial. O Born… Suffer… Die (1991), álbum mais famoso da banda, é considerado um clássico do gênero, e o grupo já realizou turnês extensas pela Europa e América do Sul.
Segundo Sérgio, nascer e se formar num estado que não é comumente associado ao metal representou alguns obstáculos para o grupo. "Até meados dos anos 90 isso se refletia até nas resenhas de nossos trabalhos nas publicações do Sul e Sudeste, quando frases do tipo 'se você acha que na Bahia só tem axé e frevo' eram muito corriqueiras quando se referiam a nós", relata.
Sobre possíveis conflitos com grupos conservadores ou religiosos, Sérgio diz que a banda nunca chegou a sofrer perseguição, mas faz um alerta sobre o momento atual do Brasil. "Felizmente, nunca tivemos problemas nesse sentido, o que é até um contraponto em termos de Brasil, e principalmente Bahia, com toda sua religiosidade histórica, mas com a sombra do fascismo institucionalizado encobrindo o país novamente. Não estamos longe de voltar à era obscura da censura e da repressão no Brasil. Como vê, ainda temos muito a lutar", afirma.
Teatro ou modo de vida?
As letras mórbidas e brutais, o tom de descrença absoluta na humanidade e a frequente evocação da morte e do sofrimento são elementos frequentes nas canções do Headhunter D.C. — basta notar que o "D.C." no nome da banda refere-se a "Death Cult", ou "culto à morte".
Nesse sentido, há quem se pergunte até que ponto as letras e pensamentos da banda fazem parte de um sistema filosófico real, seguido por seus membros e fãs, ou representam uma performance teatral empregada para atingir objetivos puramente estéticos. De acordo com Sérgio, as duas hipóteses são verdadeiras, mas a turma do death metal, de fato, acredita naquilo que canta.
"A parte estética, seja nas capas dos discos, nas fotos e nas performances ao vivo, sempre foi muito importante, mas se não houver uma base ideológica forte e consistente nada disso faz sentido e tudo acaba sendo tão fake quanto uma nota de três reais", explica.
"O lado ideológico sempre foi tão ou mais importante que o musical para nós, até porque o metal está muito além do que um mero gênero musical. Estou dentro do metal extremo há mais de 35 anos. Não sou um mero personagem inserido num contexto meramente musical e estético, então, em meu caso, o autor não se separa da obra", conclui.
Agora, para os passos seguintes dos autores e das obras, os membros do Headhunter D.C. preparam-se para os próximos capítulos da banda. Em breve, o grupo voltará aos estúdios para gravar o seu sexto álbum, intitulado Rise of the Damned…, que deverá ser lançado em 2023. Também está nos planos, uma nova turnê que deverá cobrir as principais cidades do Brasil e, "se tudo der certo" (palavras de Sérgio), incluirá também uma perna na Europa e, pela primeira vez, nos Estados Unidos.
*Sob a supervisão do editor Eugênio Afonso
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