CARNAVAL
Deusa do Ébano se purifica antes do desfile do Ilê Aiyê

Por Maíra Azevedo

Os olhos marejados não deixam Alexandra Amorim, 33, esconder a emoção que sente ao passar pelos rituais de purificação para assumir um dos postos mais altos do Carnaval de Salvador. Ela é a Deusa do Ébano, rainha do bloco afro Ilê Aiyê, título que ganhou após concorrer com 60 candidatas.
Alexandra fica recolhida (numa espécie de retiro espiritual) até amanhã, dia em que de fato será coroada como a majestade do "Mais Belo dos Belos" e desfila como destaque do bloco. Até a coroação, ela passa por uma série de procedimentos de purificação e energização.
Os primeiros rituais acontecem ainda no terreiro Abassá de Ogum, em Itapuã, onde ela é abiã (pessoa que é postulante à iniciação no candomblé). Um banho de ervas e pétalas de rosas é o primeiro passo, e coube a mãe Jaciara - ialorixá do templo - banhar a deusa em suas águas sagradas.
"Eu me sinto honrada em cuidar da vida espiritual desta menina. Aqui, além de purificar, pedimos proteção, segurança e caminho; para que Ogum tome a frente de tudo, que Oxum dê a doçura e Iansã a força necessária para ela enfrentar a jornada de ser a Deusa do Ébano", diz mãe Jaciara.
A Deusa do Ébano ofertou um quilo de búzios e pediu proteção. Depois dos rituais no Abassá de Ogum, é chegado o momento de Alexandra ir para o Curuzu. Primeiro, uma passada na Senzala do Barro Preto, sede do Ilê Aiyê, para ouvir os conselhos do presidente do bloco, Antônio Carlos Vovô.
"É preciso ter força, não se deixar abater pelo cansaço, ou pelas possíveis provocações. Para ser a nossa deusa tem que ser uma negona 'mal-assombrada', ser educada, saber falar, afinal, vai ser nossa referência, vai representar o axé do bloco. É o sorriso no rosto, com a força do nosso povo", frisa Vovô.
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Orientações
Após os conselhos, é chegado o momento de se recolher. De agora em diante, Alexandra perde contato com o mundo profano. Celulares desligados, nada de contato com a internet e é a sua yá (mãe em iorubá), Jaciara Ribeiro, quem a leva para o Ilê Axé Jitolu, terreiro responsável pela parte religiosa do Ilê Aiyê.
A majestade negra do Carnaval de Salvador é recebida com honras. A ialorixá Hildelice e outras autoridades do Ilê Axé Jitolu têm agora a missão de guardar a Deusa do Ébano até a grande noite de sábado de Carnaval. Uma tradição que começou há 36 anos, quando surgia a Noite da Beleza Negra.
"Minha mãe (Hilda Jitolu) fazia questão de ter as deusas aqui, preparar e fazer todos os procedimentos para que tudo ocorresse da melhor forma possível. Agora, ela fica aqui recolhida e cuidamos de tudo. Temos que preservar a nossa deusa, ela vive dias de rainha", explica mãe Hildelice.
O tempo que fica no Ilê Axé Jitolu, Alexandra Amorim fica sob a responsabilidade de Maria de Lurdes, mais conhecida como equede Mirinha, e que coincidentemente foi a primeira Deusa do Ébano.
No encontro de gerações das rainhas negras, a primeira faz questão de dar um conselho à novata. "Não pode esquecer de uma coisa: toda deusa é altiva, ela tem o seu império".
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