Salvador tem um tesouro que precisa de cuidados
A vida pulsa nos 17 hectares do Jardim Botânico
Encravado por entre casas, condomínios e prédios, o Jardim Botânico de Salvador parece ser um invasor do bairro de São Marcos, quando, na realidade, foi a cidade que invadiu o local, que antes era conhecido como Horto Florestal Mata dos Oitis.
O Oiti é uma espécie vegetal da Mata Atlântica, que deu nome inicialmente ao local. O Oiti da Bahia é uma árvore frutífera, pouco conhecida, mas cujo fruto pode ser consumido pela população. Hoje no Jardim Botânico existe pés de Oitis com mais de 200 anos.
Ao longo dos anos a região foi tomada por muitas construções e a área começou a ser degradada, perdendo boa parte da sua mata e das nascentes de vários rios. Apesar disso, de todos os remanescentes de Mata Atlântica, o Jardim Botânico é o que está no estágio mais avançado de conservação e regeneração da floresta.
Para o biólogo José Ricardo, o Jardim Botânico de Salvador, visto de cima, é uma ilha verde encravada no concreto. O ideal, segundo ele, era a criação de corredores ecológicos ligando o Jardim Botânico ao Parque de Pituaçu. Isso, para Ricardo, é possível e permitiria a troca constante de fauna e flora das regiões.
Em parceria com o IBGE, através do Projeto Radam Brasil, o Jardim Botânico mantém mais de 60 mil amostras de plantas desidratadas e devidamente armazenadas e catalogadas. Essas amostras são classificadas em ordem, família, gênero e espécies.
Todas essas 60 mil amostras ficam numa área do prédio principal do Jardim, num ambiente completamente controlado e refrigerado, livre de umidade. Segundo José Ricardo esse é um dos pilares que transformaram o local em Jardim Botânico.
Pesquisa, educação ambiental e conservação. Esses são os três pilares básicos que para que o antigo Horto Mata dos Oitis agora seja considerado um Jardim Botânico.
Porém, o maravilhoso espaço de educação e pesquisa ambiental de Salvador precisa de melhorias, para ganhar a classificação nacional, que hoje pode ser de A, B ou C. O Jardim Botânico de Salvador não se enquadra em nenhuma das três classificações.
O Jardim Botânico de Salvador é um fragmento florestal muito antigo, mas que está bem conservado, com uma biodiversidade muito grande de plantas, como Pau Brasil, Jacarandá, Sumaúma, Abricó de Macaco, Angelim, dentre outras.
Um inventário florestal está sendo feito para ter dados mais atualizados. Junto com técnicos do IGBE, a equipe do Jardim Botânico está fazendo um levantamento da diversidade de espécies do local. No final vai ser possível saber todas as plantas que existem, o volume de madeira e a quantidade de cada espécie.
Segundo o engenheiro agrônomo Márcio Pinheiro, através da educação ambiental o Jardim Botânico está recebendo muitos alunos das redes públicas e privadas. Em grupos de 40 a 45 alunos por vez, é possível fazer a visita guiada no local, incluindo até as trilhas.
O Jardim Botânico funciona de segunda a sábado, mas é objetivo da direção abrir também aos domingos. Porém isso demanda o fortalecimento da equipe de trabalho.
No local existe um jardim sensorial, que, no entanto, precisa ser melhorado para ter mais acessibilidade, especialmente para atender aos cadeirantes. Ainda é uma área pequena, mas que já possui algumas plantas ideais para as pessoas com deficiência visual, por exemplo.
Existe um projeto para a criação de um museu de etnobotânica, para mostrar a importância da planta para a nossa cultura, no nosso dia-a-dia, além do uso das plantas pela matriz africana e pelos indígenas.
Em termos de segurança, o Jardim Botânico tem o trabalho da Guarda Municipal durante as 24 horas do dia, mas, José Ricardo e Márcio Pinheiro afirmam que a convivência com a comunidade local é muito boa, uma vez que constantemente eles trocam informações sobre a importância do Jardim Botânico para a população dos bairros vizinhos e da cidade como um todo.
As principais necessidades do Jardim Botânico estão na ampliação das trilhas internas, hoje existem duas trilhas: dos Oitis e do Pau Brasil; na mobilidade dos acessos, especialmente para cadeirantes, além da construção do muro de contenção, para evitar a invasão que já está acontecendo em uma parte da área da mata.
Mas, José Ricardo e Márcio Pinheiro acreditam que o diálogo com a comunidade é uma forma importante de evitar essas invasões. Segundo eles, é preciso trazer a comunidade para dentro do Jardim Botânico. Não através das invasões, mas sim através do cuidado e da educação ambiental.
“É importante para a comunidade essa floresta preservada, por vários fatores. Além da qualidade do ar melhor e do clima, a mata evita o deslizamento de terra. Também tem a preservação das duas nascentes que existem no local e que contribuíam para o rio Pituaçu”, disse Márcio.
“A floresta não se vira sozinha, ela também precisa de cuidados para a sua conservação. Temos que fazer podas regulares, erradicar plantas invasoras, que prejudicam as árvores centenárias. Precisamos reintroduzir outras plantas e todo esse trabalho exige mão de obra, que hoje ainda é carente no Jardim Botânico. Além disso, o local também precisa ampliar o corpo técnico”, concluiu José Ricardo.
No momento o Jardim Botânico de Salvador está com um grupo do Inventário Florestal Nacional (IFN), formado por pesquisadores de vários Estados, que estão trabalhando com espécies da Caatinga. Eles estão usando o Herbário para fazer a taxinomia das plantas que estão chegando, para o inventário nacional. Já foram feitos os estudos dos biomas da mata atlântica e do serrado.
O Jardim Botânico é realmente um tesouro que precisa ser melhor preservado, pois a população de Salvador necessita da existência desse pedaço importante de Mata Atlântica e como fonte de pesquisa e educação ambiental, o espaço tem importância crucial para todos.