Economia: das sacolas plásticas ao Boletim Focus
Confira a coluna do economista Armando Avena
A economia é uma ciência fria, complexa e cheia de nuances. Vou dar alguns exemplos do dia a dia. A Câmara de Vereadores de Salvador aprovou, fazendo bem à cidade e ao planeta, uma lei que proíbe a distribuição de sacolas plásticas nos supermercados. Foi bom, mas as redes de supermercados aproveitaram para reduzir seus custos e aumentar seus lucros e repassaram o custo aos consumidores que agora pagam pelas sacolas. É relativamente natural que seja assim, afinal o desejo de lucro é a essência do sistema capitalista, mas nossos edis vão ter de mudar a lei, senão irão prejudicar a população da cidade.
Como se vê, para que o desejo de lucro não ultrapasse limites, é fundamental a existência do Estado regulador que proteja o consumidor. Mas a economia tem tantas nuances, que esse mesmo desejo de lucro pode fazer com que um desses supermercados passe a dar sacolinhas de graça, ainda que diluindo o custo com aumento de preços, para assim atrair consumidores e aumentar seu market share.
É tão complexa a economia que, mesmo existindo um cartel, seus participantes podem ir de encontro ao lobby e reduzir seus preços, pois estão com muito estoque ou precisam de recursos imediatamente, como, aliás, acontece nos postos de Salvador.
Não vamos também esperar compaixão na economia. As enchentes no Rio Grande do Sul, por exemplo, não fizeram os preços caírem, pelo contrário, eles se elevaram. A solidariedade é um atributo das pessoas, não do processo econômico e muitos empresários vão se aproveitar das agruras gaúchas para se posicionar melhor. Estados produtores de arroz e de outros produtos podem ver na tragédia uma oportunidade para aumentar a produção, inclusive no Oeste da Bahia. (E aí o equívoco será o governo querer tabelar preços, o que nunca resolve). No turismo, setor no qual o Rio Grande do Sul é líder na atração de argentinos, haverá problemas e outros estados, como Santa Catarina, já se colocam como alternativa fazendo promoções e, aliás, a Bahia deveria fazer o mesmo.
A economia no sistema capitalista é assim, desalmada, e por isso precisa do Estado e de agências reguladoras – não para intervir diretamente, mas para estabelecer regulação.
E tem mais: a economia é casada com a estatística, um cônjuge que trabalha com a verdade, mas a verdade tem muitas interpretações. Assim, quando alguém diz, por exemplo, que as vendas no varejo cresceram é preciso perguntar: em relação a que? Elas podem ter crescido em relação ao ano anterior, o que é um bom sinal; mas podem estar caindo em relação ao mês anterior, o que é um mal sinal. Ou seja, não há verdades absolutas em economia, por isso, leitor, desconfie das redes sociais e dos políticos que bradam a pleno pulmões: “reduzimos a taxa de desemprego” ou “aumentamos o investimento”. Números soltos não dizem nada, é preciso ver o conjunto da realidade e os fundamentos da economia.
E, embora casada, a economia tem uma amante infiel, conhecida como expectativa, mas também chamada de projeção. Ela diz o que vai acontecer no futuro para assim dar informações aos agentes econômicos. No Brasil, uma dessas amantes infiéis é o famoso Boletim Focus, que toda semana faz uma previsão para o PIB, para a Selic e para a inflação. Que importância tem isso? Quase nenhuma, esta semana, por exemplo, pioraram as projeções, mas semana que vem podem melhorar: elas medem apenas o humor do mercado. Nos últimos 21 anos, o Boletim Focus errou em 16 vezes suas estimativas. Em 2023, previu que o PIB ia crescer 0,7% e ele cresceu quase 3%. Por isso, meu querido leitor, não acredite nas amantes, nem no cidadão que chega nas redes sociais e no WhatsApp dando lições e sabendo de tudo. Exija, como se faz com um médico ou um advogado, um diploma, um curso, um doutorado que dê a garantia de sua expertise.