O governo driblou a crise fiscal. Agora só em 2027
Armando Avena explica como o Congresso permitiu que o governo evitasse cortes e adiou o debate sobre o rombo fiscal para depois das eleições

A questão fiscal, é como o casamento, não se resolve com rompante, mas com jeitinho. O mercado financeiro – e a imprensa vinculada a ele – ainda não percebeu que na base de cortes brutais de despesas e de impostos não se resolve a questão. A questão fiscal brasileira só será resolvida com muita negociação e mudanças na Constituição, de modo a desengessar o orçamento, desvincular as receitas, cortar as despesas discricionárias e reduzir o montante brutal de subsídios que beneficiam um amplo segmento do setor privado.
Enquanto isso não vem, o governo, como sempre, deu um jeitinho e driblou a questão fiscal empurrando-a para 2027.
O drible veio com o aval do Congresso que liberou o governo de ter de alcançar o piso da meta fiscal e se livrou da necessidade de cortar R$ 30,2 bilhões em despesas neste ano. Uma emenda aprovada na semana passada modificou a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) estabelecendo que o governo poderá apresentar este ano um rombo de até 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB) nas contas públicas, ao invés de déficit zero. Ou seja, não será mais necessário equilibrar receitas e despesas e um déficit de R$ 31 bilhões será aceitável.
E, assim, foi possível driblar o déficit zero, previsto no arcabouço fiscal, pois o Tribunal de Contas da União prometia intervir, se não fosse buscado o centro da meta. Não fosse isso, o governo teria de cortar na carne R$ 42,3 bilhões até o fim deste mês, o que poderia paralisar serviços essenciais e suspender as emendas parlamentares.
Nesse casamento não se sabe quem traiu quem, mas já se sabia que seria impossível garantir déficit zero sem parar o país, pois, para isso, seria preciso cortar despesas discricionárias faltando dois meses para o encerramento do exercício.
E a situação só não ficou pior porque a Câmara aprovou também o projeto de lei que revisou gastos com o seguro-defeso, incluiu o Pé-de-Meia no piso constitucional da Educação e outras medidas. E ainda há a expectativa do Congresso aprovar o aumento dos impostos sobre bets e fintechs.
Assim, 2025 está resolvido e 2026 é ano de eleição, de modo que, embora o arcabouço fiscal já tenha furo por todo lado, ninguém vai querer discutir a questão fiscal, que fica adiada para 2027.
Neste ano, o novo governo, qualquer que seja sua orientação política, terá obrigatoriamente de adotar medidas para a contenção da dívida pública, que vai fechar o ano beirando 79% do PIB.
Nada tão grave assim, afinal, como dizia Mário Henrique Simonsen, “dívida não se paga , se rola”, mas será preciso viabilizar superávit primário nas contas públicas, pois senão a rolagem da dívida ficará muito cara, ainda mais com a resistência do Banco Central em reduzir a taxa Selic em15% ao ano. Em 2027, será necessário encarar definitivamente o problema fiscal, acabando com muitas vinculações orçamentárias, eliminando parte substancial dos subsídios e cortando despesas.
A questão fiscal é como o casamento. não se resolve com rompante, mas sempre chega um momento em que o jeitinho não funciona mais e aí é preciso resolver as coisas.
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