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Por Carlos Leal*

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ACERVO DA COLUNA
Publicado sábado, 28 de janeiro de 2023 às 11:31 h | Autor:

A Bahia perde Claudete Macêdo: o retrato fiel da Bahia

A cantora faleceu nesta sexta-feira, 27, em Salvador

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Artista é um dos grandes nomes do samba na Bahia
Artista é um dos grandes nomes do samba na Bahia -

Sempre fui fã da cantora Claudete Macêdo, desde os tempos que a via cantar dos festejos do Dia do Samba ou às vezes nas festas do Corin-Efan. A partir daí passei a prestar mais atenção ao seu trabalho. Voz forte, mulher mais forte ainda, nem sempre foi lembrada pela mídia como uma das pioneiras da nossa música. Mas foi. Durante a pandemia me veio a ideia de escrever um livro-reportagem sobre a nossa cantora, ele continua a todo vapor, mas o meu sonho não será realizado: entregar uma edição a ela. Fiz algumas visitas, a família me acolheu com carinho, mostrou e tirei fotos de material, conversava com ela, mesmo sem ela responder, eu sabia que me entendia. Meu livro vai sair, sem a presença da nossa cantora, mas a história de CLaudete é tão incrível, que não pode ser esquecida.

Quando o sambista Riachão (1921-2020) convidou Claudete Macêdo para participar do seu disco Humanenochum (2000), acertou em cheio ao dividir com ela os vocais na música Retrato da Bahia: Claudete tem uma história de vida e uma trajetória artística que retratam a vida de muitas mulheres que lutaram para conquistar seu lugar ao sol. Foi uma artista da resistência, uma mulher que mesmo nas adversidades, amou o Pelourinho como poucas pessoas, morou lá até o último segundo de sua vida. É o retrato fiel da Bahia ou não é?

Nascida em 26 de outubro de 1933, Claudete começou a cantar ainda criança, com apoio da mãe quando ainda estudando no Colégio Antero de Brito, no Centro histórico de Salvador. No início da sua carreira, cantava em qualquer lugar, bastava que a convidassem. Uma das curiosidades da sua carreira é que aos 15 anos foi vencedora de um concurso de música no Rio de janeiro, mas cantando fox, não samba.

Em entrevista a Raimundo Dalvo da Costa Silva para sua pesquisa de mestrado intitulada Cotidiano, Memória e Tensões: a trajetória artística das cantoras de rádio de Salvador de 1950 a 1964, a cantora disse que sua mãe chegou a se esforçar e pagar o valor do que seria seu cachê para que ela não cantasse em determinadas boates. Nessa época, até em serviços de alto falantes em bairros como Pau da Lima e Baixa do Sapateiro, por exemplo, Claudete se apresentava. Com a popularização do rádio nas décadas de 1940 e 1950, Claudete passou a ser atração em programas de auditório e a ganhar popularidade. Devido ao seu talento, foi contratada em 1962, pela Rádio Sociedade da Bahia, onde ficou por quase 10 anos.

Mas seu sucesso veio mesmo quando passou a cantar no carnaval de Salvador, que tinha o rádio como o grande divulgador da festa. Foi na lendária Cantina da Lua, do Mestre Clarindo Silva, que conheceu parceiros que levou para a vida inteira. Um deles foi Zé Pretinho, com quem gravou na década de 1960 um compacto duplo intitulado Carnaval da Boa Terra que tinha dentre as canções, Flor de Laranjeira, seu grande sucesso até hoje. Claudete contou em entrevistas que o disco teve uma excelente vendagem: era comercializado em lojas, em kombis, nas ruas, em feiras... mas ela nunca soube quantos foram prensados ou vendidos.

Jornalista prestou homenagem à sambista na Bienal do Livro, em Salvador
Jornalista prestou homenagem à sambista na Bienal do Livro, em Salvador | Foto: Arquivo Pessoal

Sua discografia não é muito extensa para uma artista com quase 80 anos de carreira: são apenas dois Lps e nove compactos, alguns deles vendidos hoje a peso de ouro em alguns sites. A artista chegou a morar no Rio de Janeiro, mas o amor pela Bahia falava mais alto. Foi na Terra de Todos os Santos que ela resolveu fixar residência e isso foi determinante para que seu trabalho não tivesse repercussão em todo o país.

Claudete sempre disse que muitas vezes era visível o machismo que reinava no meio artístico. Os homens não aceitavam fazer menos sucesso que as mulheres: “Tinha uma coisa engraçada: os colegas cantores não queriam se apresentar depois de mim. Eles iam pegar o roteiro porque, quando entravam, era guerra mesmo. Então ele dizia assim: deixe eu ver onde eu estou. Aí eu não quero estar, depois de Claudete, não. Era inadmissível para eles fazer menos sucesso que uma mulher”. Isso acontecia porque ele entrava com a calma dele, e Claudete entrava sambando, rodando, fazendo e levantando a plateia. Com seus requebros, encantava o público numa época em que os homens ainda não exploravam a expressão corporal para acompanhar as músicas.

Vamos reverenciar a primeira mulher a cantar no bloco carnavalesco Vai Levando, mulher que compôs para o Bloco Filhos de Gandhi, cantora de blocos como Os Filhos do Morro, Os Internacionais, O papagaio, Lá vem elas, além de vários afoxés. Viva o Samba da Bahia, Viva Dona Claudete Macêdo, patrimônio CULTURAL da nossa Bahia.

Vá em paz, amiga Claudete! Nós, aqui, lembraremos de você!

*Carlos Leal é jornalista, escritor, pesquisador e produtor cultural

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