A Taxa de Lixo (TRSD) de Salvador é (in)constitucional?
É inadmissível justificar um aumento de 50% em serviços já custeados por impostos pagos

A Taxa de Coleta, Remoção e Destinação de Resíduos Sólidos Domiciliares – TRSD, conhecida como taxa de lixo, vinha sendo reajustada, desde 2013, com base nos índices inflacionários, diferente do exercício de 2022, quando ocorreu um aumento de 50% para todos os imóveis da cidade, por conta da inclusão sorrateira de uma nova tabela na Lei 9.601/21, do Procultura.
A TRSD de Salvador utiliza vários elementos da base de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU como o Valor Unitário Padrão – VUP do logradouro (que compõe a Planta Genérica de Valores – PGV), área de construção, localização, utilização, zona e tipo do imóvel.
A Constituição Federal (CF) no seu artigo 145, II determina que as taxas não poderão ter base de cálculo própria de impostos, embora a súmula vinculante 19 do Supremo Tribunal Federal (STF) permita que a cobrança exclusiva em razão dos serviços de coleta de lixo adote elementos do IPTU.
A súmula vinculante 29 do STF, por sua vez, dispõe que só é constitucional se não houver integral identidade entre as bases. A apuração da TRSD de Salvador ocorre multiplicando o valor do m² da tabela de receita pela área construída do imóvel. Essa não seria uma fórmula similar à apuração do valor venal do IPTU na base de cálculo da construção quando se multiplica o valor do m² da construção pela área construída do imóvel?
O despautério da TRSD de Salvador reside no absurdo aumento de 50% de 2021 para 2022, com caráter confiscatório, sem qualquer fundamentação quanto ao incremento no custo dos serviços prestados pela municipalidade. Segundo o STF, o ente tributante, instituidor da taxa, tem o dever jurídico de demonstrar a relação de proporcionalidade entre o valor a ser arrecadado e a dimensão objetiva da despesa.
A ausência de vinculação do recurso à despesa específica é um indicador da falta de preenchimento dos requisitos constitucionais para a validade do tributo. É necessário comprovar, ainda, a efetiva aplicação do montante auferido no custeio da despesa pública.
O STF entende como serviço específico e divisível apenas o da coleta de lixo proveniente de imóveis. A TRSD deve estar completamente dissociada de outros serviços públicos de limpeza realizados em benefício da população e de forma indivisível. É inadmissível justificar um aumento de 50% para financiar a conservação e limpeza de logradouros e bens públicos como ruas, praças, calçadas, vias, bueiros, pois esses serviços já são custeados pelos impostos pagos pelos contribuintes soteropolitanos, como o IPTU. Desta forma, só é constitucional a TRSD instituída em razão exclusivamente da coleta domiciliar, sendo inconstitucional sua destinação para limpeza urbana.
*Karla Borges é professora de direito tributário