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Por Luiz Mott

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ACERVO DA COLUNA
Publicado sábado, 20 de maio de 2023 às 13:38 h | Autor:

Dandara X Princesa Isabel: Invencionice sem história oral

Uma reflexão sobre o Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria

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Luiz Mott é um antropólogo, historiador e pesquisado
Luiz Mott é um antropólogo, historiador e pesquisado -

Atribui-se a de Gaulle (1962), presidente da França, essa trágica, mas acertada opinião: “O Brasil não é um país sério...” Prova de nossa falta de seriedade, é o tal Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria, onde estão registrados, em folhas de aço, o nome de 64 brasileiros (51 homens e 13 mulheres), considerados protagonistas da nossa liberdade e da democracia. De Tiradentes a Brizola, de Maria Quitéria a Zuzu Angel, de D.Pedro I a Chico Xavier. Alguns, merecidamente, são muito reverenciados de norte a sul do Brasil, outros, ilustres desconhecidos\as, ou pior, “vips” sem qualquer base documental que abalize sua história e heroísmo. Infelizmente é o caso de Dandara dos Palmares, cujo nome, no último dia 13 de maio, foi colado em substituição na placa de identificação do logradouro Avenida Princesa Isabel, na Barra, em Salvador. Pirataria soi disant politicamente correta e aplaudida pela lacração identitária radical, em protesto contra a considerada falsa abolição.

Dandara é uma invencionice criada no século atual, na esteira do resgate da pouquíssima documentada história do Quilombo de Palmares. Quando, em 1995, arrolei cinco pistas etno-históricas sugestivas de que Zumbi não era heterossexual – redundando na época em vandalismo em meu carro e pichações no muro de minha casa nos Barris. Na ocasião, o escritor negro Joel Rufino escrevia: “os brasileiros sempre acreditaram que negros famosos e ricos devem se casar com brancas, e autores mais românticos inventaram uma mulher branca para o líder dos Palmares. Legenda romântica…” Não há provas documentais de que o líder palmarino teve mulher e filhos. Também não há documento antigo algum que nomeie Dandara como esposa de Zumbi e muito menos que tiveram três filhos citados em suas b iografias fajutas: Motumbo, Harmódio e Aristogíton. Fonte: Portal da Fundação Palmares... O anacronismo destes nomes chega a ser ridículo: Harmódio e Aristogíton foram dois heróis atenienses que teriam matado o tirano Hiparco (Séc. V d.C). Nem Nina Rodrigues, em seu livro, Tróia Negra (1904), ousou imaginar tais conexões do quilombo com a mitologia grega. Dandara escrava do eurocentrismo...

Ah! dirão os\as racialistas mais radicais: Dandara foi silenciada, como outras supostas heroínas negras, pelos machos brancos eurocêntricos, que cancelaram sua história oral e lugar de fala. Ledo engano: tudo o que se continua repetindo sobre a suposta vida e heroísmo de Dandara - que lutava capoeira, que era exímia estrategista e se suicidou - tudo foi inventado nas últimas décadas.

Vivam, sim, nossas verdadeiras heroínas: Rosa Egipcíaca, a primeira escritora negra e Esperança Garcia, a primeira advogada negra, ambas escravizadas do século XVIII.

*Luiz Mott é professor titular de antropologia da Ufba

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