A TARDE registrou passo a passo de Elizabeth II na visita a Salvador
Rainha passou três horas na capital baiana durante visita oficial ao Brasil em 1968

Cleidiana Ramos
A edição de A TARDE de 4 de novembro de 1968 trouxe uma descrição pormenorizada das três horas que Elizabeth II, a rainha da Inglaterra que morreu hoje, quinta-feira, 8, passou em Salvador. Em três páginas foi documentada a movimentada agenda da soberana inglesa na passagem pela capital baiana durante a visita oficial que fez ao Brasil de 1º a 11 de novembro de 1968 para depois seguir em direção ao Chile.
Pontualidade, repicar de sinos e cerimônia anglicana
O iate real Britannia, que trouxe a rainha e o príncipe Philip para o desembarque em Salvador, chegou às 6 horas. Mas o desembarque de Elizabeth II na cidade ocorreu oficialmente às 9 horas quando ela desembarcou da sua lancha oficial que foi escoltada por outras da Marinha do Brasil. A chegada da rainha foi celebrada pelo repicar de sinos da Igreja da Conceição da Praia. Em seguida a comitiva se dirigiu para o Campo Grande para que Elizabeth II assistisse o serviço na Igreja Anglicana que, desde o rompimento com catolicismo ocorrido em 1534, no reinado de Henrique VIII, tem o monarca inglês como chefe. “Ao entrar no templo S. Majestade foi recebida polo Reverendo John K. Vallensis, presbítero da Igreja Anglicana”. (A TARDE 4/11/1968, capa).

Conversa com conterrânea no Clube Inglês
Ao sair da igreja, a rainha Elizabeth visitou representantes da comunidade britânica em Salvador. O encontro ocorreu no Clube Inglês, ainda hoje localizado no Campo Grande. No espaço, a rainha, segundo a reportagem de A TARDE, conversou longamente com a inglesa Violet Branch que morava em Salvador há 50 anos. “No diálogo mantido com Miss Violet, a rainha Elizabeth perguntou-lhe entre outras coisas se ela desejava voltar para seu país ao que a senhora respondeu que já não tinha esse desejo pois morava há bastante tempo no Brasil”. (A TARDE 4/11/1968, capa).
No Palácio da Aclamação Rainha interagiu com autoridades, jornalistas e artistas
A recepção oficial oferecida à Rainha Elizaeth II ocorreu no Palácio da Aclamação com o então governador da Bahia, Luís Viana Filho como anfitrião. Cerca de 200 convidados estiveram no espaço. Da sacada, Elizabeth II acenou para o público que estava na área externa. Acompanhada pelo governador percorreu o salão para ser apresentada a alguns dos convidados. Para cada pessoa tinha uma pergunta. A Odorico Tavares, por exemplo, perguntou se o grupo que dirigia era o fundado por Assis Chateaubriand, que era o embaixador do Brasil em Londres na época da sua coroação. Também reservou uma pergunta sobre A TARDE. “Ao jornalista Jorge Calmon. indagou a significação de "A Tarde" em inglês e também quantos jornais existem em Salvador. Aproximando-se do grupo de escritores e artistas informou-se com interesse dos trabalhos de Jorge Amado, Caribé, Genaro e Hansen Bahia”. (A TARDE, 4/11/1968, capa).

O cardápio da recepção no Palácio da Aclamação incluiu um cardápio com sucos de frutas regionais e outros pratos que não foram descritos. Mas a reportagem esteve atenta às escolhas de Elizabeth. Ela escolheu um suco de pitanga e um beiju, enquanto o príncipe Philip optou por um suco de mangaba. Mas Elizabeth nem pode saborear o beiju completamente devido à necessidade da famosa pontualidade inglesa para cumprir os compromissos. “Quando apreciava um desses manjares, a Rainha foi advertida de que só faltava um minuto para esgotar-se o tempo de sua permanência no Palácio. Deixou pela metade o beiju de que se tinha servido”. (A TARDE, 4/11/1968, capa).

Igreja de São Francisco encantou Elizabeth II
A rica e bela estrutura a Igreja de São Francisco encantou a Rainha Elizabeth II. A visita ao templo da arquitetura barroca parece ter impressionado a soberana inglesa. “Sua Majestade penetrou no templo seguida do Governador Luís Viana Filho e se dirigiu, pisando sobre o tapete vermelho estendido especialmente para a sua passagem, ao altar-mor. Antes, parou no centro da nave e se pôs a admirar a abóbada, os altares laterais e, com mais atenção, os entalhes dourados do altar-mor e partes adjacentes” ( A TARDE 4/11/1968, capa). A rainha também visitou o Claustro do Convento de São Francisco que faz parte do conjunto arquitetônico. Elizabeth foi a segunda integrante de uma monarquia a visitar a igreja. O primeiro foi Dom Pedro II quando fez uma visita a Salvador e até manifestou o desejo de levar uma imagem de São Pedro, problema que foi resolvido quando lhe presentearam com uma réplica.

Interesse por detalhes sobre peças marcou visita ao Museu de Arte Sacra
A arte religiosa continuou na agenda da rainha durante a sua visita por Salvador. Após a Igreja de São Francisco, Elizabeth II e sua comitiva chegaram ao Museu de Arte Sacra. De acordo com o texto de A TARDE, durante a visita, a rainha quis saber detalhes sobre as peças do acervo. “Sempre demonstrando curiosidade em conhecer todas as peças existentes no Museu, a Rainha Elizabeth observou ainda uma estátua de São Bernardo, trabalhada no século XVII pelo Frei Agostinho da Piedade além das seguintes imagens: "Jesus Flagelado", "Instituição da Eucaristia”, “O Sumo Sacerdote Melquisedeque”, “Anjo Tocheiro”, todas elaboradas nos séculos XV, XVI, XVII e XVIII”. (A TARDE 4/11/1968, p.2).

Rainha ganhou balangandã e samba de Camafeu de Oxóssi
De acordo com a reportagem de A TARDE, o evento de maior proximidade popular da rainha Elizabeth fora do círculo de autoridades e seus convidados foi o do Mercado Modelo. O protocolo foi quebrado com a abertura do precedente para que Elizabeth II recebesse presentes de populares, o que não era permitido segundo o protocolo das suas visitas. As atenções da rainha, no início do passeio pelo Mercado Modelo, recaíram sobre um bolsa, estilo sacola, confeccionada com sisal e com desenhos de referência a elementos da cultura baiana e a apresentação de capoeira do Grupo Camafeu de Oxóssi. Em seguida foi o momento da entrega de presentes ofertados pelos comerciantes do Mercado Modelo. “Foram-lhe entregues um balangandã trabalhado em prata, obra do artesão baiano Gerson Viana, colocado em um estôjo de jacarandá forrado em veludo, e uma corbelha de flôres naturais em nome de todos os duzentos e tantos barraqueiros do Mercado Modelo. Ao Príncipe Philip, o barraqueiro Américo de Oliveira Lopes ofereceu um berimbau especialmente fabricado para o ilustre visitante. A inscrição dizia: “Lembrança da Barraca do Imbé Preto”. A visita também inspirou um samba composto por Camafeu de Oxóssi: “Sua Majestade, Rainha Elizabeth/Sua visita muito nos honrou/Em colocar no seu roteiro/ A Igreja de São Francisco e o Mercado Modelo de Salvador/Esta é uma visita honrosa/de beleza sem igual /Deus salve sua Majestade e toda a Família Real”.

Despedida ocorreu pouco depois do meio-dia
A visita ao Mercado Modelo foi o último compromisso de Elizabeth II em Salvador. Assim como na chegada, os sinos da Igreja da Conceição saudaram a soberana inglesa. Ao lado do marido, o Príncipe Philip, a rainha deixou a capital baiana, segundo a reportagem de A TARDE, às 12h18min. As outras cidades visitadas pela rainha durante a sua visita ao Brasil foram Recife, Brasília, São Paulo, Campinas e Rio de Janeiro.
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