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A Tarde Memória

Por Priscila Dórea

ACERVO DA COLUNA
Publicado domingo, 11 de maio de 2025 às 8:00 h | Autor:

Mães de Santo representam o acolhimento da maternidade espiritual

Representantes das casas de Candomblé nagô, jeje mahi e banto zelam tanto pelos filhos e filhas da religião quanto por suas comunidades

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Imagem ilustrativa da imagem Mães de Santo representam o acolhimento da maternidade espiritual
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Pilares de resistência, sabedoria e acolhimento. Em iorubá, a palavra Mãe se diz Iyá. Na Bahia, tanto as sacerdotisas das casas nagô, as ialorixás, quanto aquelas dos terreiros banto (as mametos) e jeje mahi (as donés) são guardiãs de ensinamentos ancestrais que atravessam gerações. Em suas casas, elas recebem e criam muitos filhos e filhas, cultivam a cultura, protegem tradições, enfrentam a intolerância e fortalecem suas descendências a partir da ancestralidade.

Neste domingo, Dia das Mães, o A TARDE Memória relembra as mulheres que se tornaram inspiração e exemplo de força espiritual e que oferecem um outro colo conselheiro e cheio de amor. Mães que sabem ser firmes quando é preciso e que direcionam os caminhos quando necessário.

Além das obrigações religiosas e do direcionamento espiritual dos terreiros, as Mães de Santo, como são popularmente chamadas na Bahia, zelam pelas comunidades do entorno das suas casas de culto, buscando junto às instâncias do poder público reivindicar melhorias, mas também fazendo muita coisa por conta própria, como projetos sócio-educativos e a valorização da cultura afro baiana.

Historicamente, as Iyás da Bahia sempre foram combativas e articuladas, buscando sempre engrandecer o Candomblé, recebendo intelectuais, estudiosos e autoridades governamentais, isso quando elas próprias também não eram escritoras.

Um exemplo é Mãe Aninha, fundadora do Ilê Axé Opô Afonjá, que lutou junto ao governo de Getúlio Vargas para que o povo de santo tivesse liberdade de culto, ainda nos anos 1930. No mesmo terreiro, Mãe Senhora recebia intelectuais e escritores como Jorge Amado e Jean Paul Sartre. Enquanto, Mãe Stella de Oxóssi, que comandou o Afonjá de 1976 até 2018, ano de sua morte, era escritora e acadêmica.

No Terreiro do Gantois, Mãe Menininha foi um verdadeiro símbolo de resistência e acolhimento, suavizou barreiras e levou para o mundo o poder da fé e tradição, alcançando artistas, políticos e intelectuais. No Curuzu, Mãe Hilda não apenas comandou o Ilê Axé Jitolu, mas ergueu as bases do bloco Ilê Aiyê, o primeiro bloco afro do Brasil e foi uma força sem igual dentro do movimento negro.

Mameto Mirinha, fundadora do Terreiro São Jorge Filho da Gomeia, fez da sua casa um símbolo da nação banto e uma mãe não apenas para os filhos e filhas de seu terreiro, mas de toda a comunidade de Portão, em Lauro de Freitas, atuando politicamente e garantindo direitos. Já no Terreiro do Bogum, a fé de Doné Nicinha sustentou os ritos da nação Jeje, preservando os ensinamentos dos voduns e garantindo que a espiritualidade jamais fosse apagada.

A seguir, conheça a história de algumas dessas grandes mães:

Mãe Tatá da Casa Branca
Mãe Tatá da Casa Branca | Foto: Cedoc | A TARDE

Mãe Tatá de Oxum

Altamira Cecília dos Santos (1923-2019) foi Iyalorixá do Ilê Axé Iyá Nassô Oká (de tradição Ketu/Nagô), a Casa Branca do Engenho Velho, entre os anos de 1985 e 2019. Filha de Maria Deolinda Gomes dos Santos - a Papai Oké - e sexta Ialorixá da Casa Branca, Mãe Tatá possui uma trajetória marcada pela preservação das tradições, enquanto se mantinha à frente da luta contra a intolerância religiosa. Ela ficou conhecida por sua sabedoria, serenidade e elegância enquanto liderava o terreiro de Candomblé mais antigo do Brasil, contribuindo para que o seu legado, intrínseco ao da Casa Branca, seja de resistência e fortalecimento da cultura afro-brasileira.

Mãe Aninha, fundadora do Ilê Axé Opo Afonjá
Mãe Aninha, fundadora do Ilê Axé Opo Afonjá | Foto: Cedoc | A TARDE

Mãe Aninha de Xangô

Eugênia Ana dos Santos (1869 - 1938) foi a fundadora do Ilê Axé Opô Afonjá (de tradição Ketu/Nagô), foi uma defensora da resistência do povo negro brasileiro, com uma visão para além de seu tempo e uma trajetória que tornou seu legado rico e inspirador. Na linha de frente nas lutas para garantir liberdade religiosa aos praticantes do candomblé, foi por meio de sua coragem e influência - além do apoio do ministro Osvaldo Aranha, seu filho de santo - que o Decreto Presidencial nº 1202, que pôs fim à proibição dos cultos afro-brasileiros, foi promulgado em 1934. Mãe Aninha também instituiu o Corpo de Obás de Xangô, grupo que auxilia a Iyalorixá e zela pelo terreiro. Jorge Amado, Dorival Caymmi e Carybé foram obás do Afonjá.

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| Foto: Cedoc | A TARDE

Mãe Senhora de Oxum

Maria Bibiana do Espírito Santo (1890-1967), descendente da família africana Asipá, originária de Oió e Ketu, foi iniciada no candomblé ainda jovem e assumiu a liderança do Ilê Axé Opô Afonjá em 1942. Ela recebeu os símbolos do sacerdócio diretamente de sua mentora, Mãe Aninha, e possui uma trajetória marcada pela preservação das tradições da nação e pela luta contra a intolerância religiosa. Sua liderança, que seguia muitos dos preceitos de Mãe Aninha, foi essencial na manutenção do Afonjá como um espaço de inabalável resistência e preservação das tradições africanas no Brasil.

Mãe Stella de Oxóssi
Mãe Stella de Oxóssi | Foto: Cedoc | A TARDE

Mãe Stella de Oxóssi

Maria Stella de Azevedo Santos (1925-2019) foi a quinta Iyalorixá do Ilê Axé Opô Afonjá, onde foi iniciada aos 14 anos. Enfermeira, articulista de A TARDE e autora de nove livros, Mãe Stella ficou conhecida por sua luta pela garantia dos direitos do povo negro e pela intelectualidade, que a tornou uma referência na literatura e na cultura afro-brasileira, com escritos essenciais sobre o Candomblé. Mãe Stella recebeu o título honoris causa tanto da Universidade Federal da Bahia (2005) quanto da Universidade do Estado da Bahia (2009). E, em 2013, se tornou a primeira iyalorixá imortal da Academia de Letras da Bahia, ocupando a cadeira número 33.

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| Foto: Cedoc | A TARDE

Mãe Menininha de Oxum

Maria Escolástica da Conceição Nazaré Assunção (1894-1986), mundialmente conhecida como Mãe Menininha do Gantois, é bisneta de Maria Júlia da Conceição Nazareth, a fundadora do Ilê Iyá Omi Axé Iyamassê (casa de tradição Jeje-Ketu), o Terreiro do Gantois. Mãe Menininha foi a iyalorixá da casa entre 1922 e 1986. A sua família era originária da Nigéria e sua liderança ficou marcada pela firmeza delicada com a qual comandava o terreiro, o que contribuiu para torná-la uma voz forte na Bahia, dentro e fora do candomblé. Com centenas de filhos de santo espalhados por todo o país, Mãe Menininha lutou pela legalização do candomblé e sua completa aceitação por toda a sociedade brasileira.

Mãe Hilda
Mãe Hilda | Foto: Antônio Queiroz | Cedoc | A TARDE

Mãe Hilda de Obaluaê

Hilda Dias dos Santos (1923 - 2009) foi a fundadora do Ilê Axé Jitolu ( casa de tradição jeje) e é uma referência espiritual e cultural dentro das religiões de matriz africana, com sua influência ultrapassando os espaços do terreiro. Educadora e ativista, em 1988 Mãe Hilda idealizou e fundou a Escola Mãe Hilda, voltada para as crianças do Curuzu e onde o ensino da cultura afro-brasileira ganha espaço ao lado de disciplinas como português e matemática. A Ialorixá também foi uma força sem igual dentro do movimento negro na Bahia, além de ter sido a guia e maior incentivadora do primeiro bloco afro do Brasil, o Ilê Aiyê, que teve o nome escolhido por ela e foi co-criado por seu filho, Antônio Carlos dos Santos - o Vovô do Ilê.

Mãe Mirinha de Portão
Mãe Mirinha de Portão | Foto: Cedoc | A TARDE

Mameto Mirinha dos inkices Mutalombô e Bamburucema

Altamira Maria Conceição Souza (1924 - 1989) foi a fundadora do Terreiro São Jorge Filho da Gomeia (de tradição banto). Foi iniciada ainda aos 9 anos e se tornou uma das mais importantes líderes do Candomblé banto na Bahia. Articulada e uma potente influência política, Mameto Mirinha buscou garantir transporte público regular e postos de saúde para a região de Portão e Lauro de Freitas, além de ter sido crucial na construção do Hospital Geral Menandro de Faria, deixando um legado não só de resistência, mas também de compromisso com a comunidade e seu entorno.

Mãe Nicinha Doné do Terreiro do Bogum
Mãe Nicinha Doné do Terreiro do Bogum | Foto: Agliberto Lima | Cedoc A TARDE

Doné Nicinha do Vodum Lokossi

Evangelista dos Anjos Costa (1911-1994) foi uma das grandes líderes do candomblé da nação Jeje no Brasil, ocupando a posição de Doné no Zoogodô Bogum Malê Rundó, o Terreiro do Bogum, entre 1978 e 1994. Ela sucedeu Doné Runhó, sua mãe biológica e espiritual, e ajudou a manter a tradição do terreiro viva enquanto fortalecia a identidade das religiões de matriz africana na Bahia, ocupando um papel fundamental na luta pela valorização da cultura afro-brasileira. Sua liderança foi marcada pela transmissão dos ensinamentos às novas gerações, garantindo que o Bogum continuasse sendo um dos pilares do candomblé Jeje no Brasil.

*Colaboraram Andreia Santana e Tallita Lopes
*Os trechos retirados das edições históricas de A TARDE respeitam a grafia da época
*Material elaborado com base em edições de A TARDE e acervo do CEDOC/A TARDE

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