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A Tarde Memória

Por Andreia Santana*

ACERVO DA COLUNA
Publicado sábado, 08 de fevereiro de 2025 às 5:00 h | Autor:

‘Menudomania’ contagiou as adolescentes de Salvador há 40 anos

Em 1985, grupo de Porto Rico parou a cidade com agenda que incluiu shows na Fonte Nova e em um shopping center; além de clipe na baía de Todos-os-Sant

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Encontro de fã clubes no shopping itaigara preparou clima para o show do Menudo
Encontro de fã clubes no shopping itaigara preparou clima para o show do Menudo -

Os portões da Fonte Nova abriram às 13h, mas o show só iniciou às 19h30. O público começou a chegar ainda às 11h, quando o avião que trazia os artistas sequer havia aterrissado no aeroporto de Salvador, o que só aconteceu às 11h53 daquele mesmo sábado, 02 de março de 1985. Do aeroporto, o grupo seguiu para o hotel, no Campo Grande. Para a grande frustração da legião de fãs que seguiu o ônibus da turnê, nenhum dos rapazes apareceu na sacada da suíte presidencial para vê-las. Cansados da viagem e com uma apresentação marcada para dali a algumas horas, os cinco menudos preferiram poupar as forças para o palco. A agenda de compromissos que teriam de cumprir na cidade era extensa e o prazo de apenas três dias.

Meses antes da apresentação, integrantes de fã clubes se reuniram para combinar as caravanas que iriam para o evento. A caravana de 40 anos atrás, vale explicar para os novinhos, é o equivalente dos ‘bondes’ atuais. Mas, ao contrário dos memes na internet, esse rolê não tinha nada de aleatório e juntou adolescentes de todo o Estado.

O Menudo, um dos maiores fenômenos pop da década de 1980, estava no auge da fama quando fez show em Salvador. Por aqui, quem gostava do grupo sabia de cor as letras das canções entoadas no mais puro castelhano do Caribe ou, no mínimo, no portunhol mais cara de pau. Programas de auditório recebiam covers dos cinco garotos porto-riquenhos e era comum as disputas de dança para ver quem imitava melhor as coreografias. Os discos do Menudo vendiam como água no calor escaldante do verão baiano e o comércio lucrava com todo tipo de acessório para ‘menudete’ nenhuma ficar sem estoque de pôsteres, camisetas, bonés, cadernos ou faixas usadas na testa, com o nome do grupo ou dos integrantes: Charlie, Ray, Roy, Robby e Rick Martin.

A passagem do Menudo por Salvador entre 02 e 05 de março de 1985 foi amplamente coberta pela imprensa. A TARDE deu chamadas de capa, reportagens de destaque sobre o show do dia 02 na Fonte Nova e do dia 03 no terraço do shopping que patrocinou a vinda do grupo a Salvador, o Itaigara. As equipes de reportagem seguiram todos os passos dos rapazes, desde o desembarque até a despedida.

A edição de 03 de março de 1985 dedicou-se ao show, na noite anterior, e à cobertura da chegada, com muitas fotografias que além de exibir os sorrisos dos cinco menudos, mostravam o mar de adolescentes acompanhando o quinteto. “Cerca de 40 mil crianças e adolescentes cantaram e dançaram na Fonte Nova. ontem, junto com o grupo Menudo que, pela manhã, atraiu verdadeira multidão ao Aeroporto Dois de Julho, onde desembarcou às 11h53min, provocando muito choro e desmaios das adolescentes”, diz a chamada de capa da edição do dia 03.

Na manhã do sábado da chegada, 300 policiais militares cuidaram somente do desembarque do Menudo. Meninas emocionadas tiveram crises de choro ao ver os cantores descendo a escadinha do avião e, ao menos, 16 garotas desmaiaram e precisaram de atendimento médico. No show da Fonte Nova, à noite, foram 1200 homens dos 6º, 7º e 8° batalhões, do Batalhão de Choque, Esquadrão Águia e Corpo de Bombeiros. O público delirava e era difícil manter tantos fãs, a maioria pré-adolescentes cheios de energia, sob controle. “O público fez de tudo para se aproximar ao máximo do palco, para ver de perto seus ídolos, mas tinha um forte esquema de segurança montado”, acrescenta o texto de A TARDE.

Senhorita Magoo

Chegar perto do palco não era para todo mundo. A maioria do público ficou bem distante, o que dificultava até mesmo ver o show. Binóculos eram disputados por mãos ávidas e passavam de fileira em fileira. Cada um tinha o direito a poucos segundos de uso, mal dava para ver os menudos evoluindo a icônica coreografia de ‘Não se reprima’, o maior sucesso do grupo por aqui, ou de Persecución [perseguição, em espanhol], a música de abertura da apresentação.

Enir Assis tinha 15 anos e nem era assim tão fã do quinteto, embora tivesse os discos. Junto com o irmão e o pai, foi uma das milhares de adolescentes que estavam na antiga Fonte Nova. “Meu pai resolveu levar a gente para o show. Como ele não gostava de ficar no meio de muita gente, resolveu comprar o camarote”, conta.

A atualmente professora de 55 anos tem um certo trauma da experiência, ou melhor dizendo, uma frustração. Míope com grau muito forte, como uma versão adolescente do Mister Magoo, o personagem de desenho animado que vivia se metendo em confusões por não enxergar direito, Enir até foi à Fonte, mas não viu nada. “O camarote na Fonte Nova era bem distante do palco, bem distante mesmo. E adolescente, naquela época, não usava óculos. A gente precisava, mas não usava porque não ia pagar o mico de sair de óculos. Tinha uma mureta, eu fiquei debruçada na mureta para assistir ao show, só que não assisti nada. O Menudo estava desse tamaninho e eu não conseguia enxergar”, acrescenta.

Além da distância e da dificuldade com a miopia, Enir ficou decepcionada com o fato do show utilizar playback. Em vez dos cantores, de fato, cantarem, dublavam a própria voz, uma prática bastante comum na época. “O playback de antigamente não era a mesma coisa de hoje. A gente saiu antes do show terminar porque meu pai não queria pegar confusão. Tinha muita gente, muito grito, mal dava para a gente ouvir”.

O que a professora Enir mais recorda da época é dos muitos pôsteres do Menudo que uma prima tinha nas paredes do quarto, emoldurados, das legiões de fãs nas ruas seguindo o ônibus da banda ou gritando e cantando na porta do Hotel do Bahia; e dos garotos que não eram fãs do grupo, mas estavam sempre por perto como uma estratégia para paquerar as meninas que seguiam os menudos.

Senha para os hóspedes

Quem teve o azar de estar hospedado no Hotel da Bahia nos mesmos dias em que o Menudo ficou em Salvador precisou de senha para entrar no estabelecimento. “Pela primeira vez, em seus mais de 30 anos de existência, o Hotel da Bahia teve de fechar a sua entrada com tapumes e dar senha para os hóspedes que tinham a entrada controlada por um seguranças e um soldado da Polícia Militar”, diz trecho de reportagem do A TARDE, de 04 de março de 1985.

A mesma edição traz a cobertura do show privado que o Menudo fez, no domingo, dia 03, no terraço do Shopping Itaigara, para um público de duas mil pessoas. Na época, os ingressos custaram de Cr$150 mil a Cr$200 mil e famílias com quatro crianças, mais um responsável, chegaram a gastar mil cruzeiros, uma pequena fortuna, no período. “Antes das 17 horas, já era grande o movimento tanto no interior quanto do lado de fora do shopping. onde até após o Início do show, ficaram centenas que não tiveram condições de pagar os ingressos”, diz trecho da reportagem.

Na saída do shopping, para driblar essa multidão aglomerada em busca de um vislumbre dos ídolos, os menudos saíram disfarçados com fardas da PM. “O mais novo deles, Rick, estava totalmente coberto pelo capacete", comentou um tenente ouvido pelo repórter de A TARDE, na ocasião.

No dia 04 de março, os menudos também precisaram de estratégia para sair do Hotel da Bahia em direção ao Terminal Marítimo de Salvador, no Comércio, onde tomaram uma embarcação para gravar um videoclipe na baía de Todos-os-Santos. Na porta do hotel, as adolescentes não arredaram pé, convictas de que veriam os rapazes no retorno. No dia seguinte, eles embarcaram para Goiânia, para outra sequência de apresentações da turnê brasileira. Antes de ir embora, usaram as páginas de A TARDE para deixar um recado às baianas: “Por intermédio do diário A TARDE desejamos agradecer muitíssimo a calorosa acolhida que tivemos na Bahia. E podemos dizer que nunca esqueceremos. Um beijo”.

*Colaboraram Priscila Dórea e Tallita Lopes

*Os trechos retirados das edições históricas de A TARDE respeitam a grafia da época

*Material elaborado com base em edições de A TARDE e acervo do CEDOC/A TARDE

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