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A Tarde Memória

Por Cleidiana Ramos* | [email protected]

ACERVO DA COLUNA
Publicado sábado, 29 de abril de 2023 às 11:05 h • Atualizada em 29/04/2023 às 11:35 | Autor:

Reportagens de A TARDE acompanharam criação do salário-mínimo

Benefício é considerado uma das maiores conquistas dos trabalhadores brasileiros

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A TARDE, 2/5/1938, capa
A TARDE, 2/5/1938, capa -

Com valores diferenciados nas regiões do Brasil, inclusive no mesmo estado, o salário-mínimo foi criado em 1936, mas o seu valor foi fixado quatro anos depois em 1º de maio. O surgimento do benefício ocorreu em um contexto bastante complexo. Foi a era do primeiro governo de Getúlio Vargas, que durou 15 anos e incluiu uma ditadura formal denominada Estado Novo. Se por um lado Getúlio apostou em políticas trabalhistas por outro exercia um rígido controle dos sindicatos e tinha estados sob intervenção federal como a Bahia. A TARDE acompanhou os debates sobre esse que se tornou um importante marcador socioeconômico brasileiro noticiando as formações de comissões, dentre outros detalhes.

“O sr. Agamenon de Magalhães, ministro do Trabalho, submeteu à aprovação do presidente da República o regulamento da lei do salário-mínimo elaborado há pouco pela Comissão Especial, depois de ter recebido as sugesttões das classes interessadas”. (A TARDE, 4/7/1936, capa).

O benefício foi estabelecido pela Lei nº 185 de janeiro de 1936 e o Decreto-Lei nº 399 de abril de 1938.

“Em homenagem à data de 1.° de Maio, o presidente da Republica assignou, na pasta do Trabalho, um decreto approvando o regulamento que estabelece a organização do funcionamento das comissões de salário mínimo, a fim de dar cumprimento ao artigo 137, alínea H, da Constituição, nos termos do artigo 18, da lei 185, de 4 de janeiro de 1936. A fixação do salário mínimo a que o trabalhador tem direito, a retribuição do serviço prestado, competirá às comissões do salário mínimo”. (A TARDE, 2/5/1938, capa).

A TARDE, 2/5/1938, capa
A TARDE, 2/5/1938, capa | Foto: Arquivo | Cedoc A TARDE

Após a entrada em vigor do decreto presidencial em 1940, A TARDE fez uma reportagem analisando qual era o cenário da medida na Bahia. Em Salvador, o valor ficou na faixa de pouco mais de 150 mil réis como era chamada popularmente, no período, a moeda oficial brasileira, o real. O mesmo valor foi estabelecido para Ilhéus, Itabuna, Itacaré, Canavieiras, Belmonte e Itapira. Já na região de Alagoinhas ficou em 110 mil réis. Para demais municípios baianos foi adotado o valor de 90 mil réis.

“Na capital não haverá alteração sensível nos ordenados. Os mais baixos costumam beirar o limite assentado pela lei. Já fomos saber na Prefeitura quanto ganham os trabalhadores da municipalidade. Ganham 5$000 por dia. Seus vencimentos estão, portanto, dentro da lei. Informações outras, colhidas em empresas particulares, buscando conhecer a remuneração do operário braçal, entre nós confirmaram aquela presunção de inalterabilidade dos salários, ajustando-os à nova lei, na Bahia”. (A TARDE, 7/5/1940, p.2).

A TARDE, 7/5/1940, p.2
A TARDE, 7/5/1940, p.2 | Foto: Arquivo | Cedoc A TARDE

Segundo a economista, professora e doutoranda em Economia, Karina Lima, o salário-mínimo surgiu com algumas diferenças em relação à forma como é aplicado atualmente. Uma delas foi a característica de diferença de valores por região como destacou o texto de A TARDE. “De 1936 a 1940 foram instituídas comissões regionais para identificar nas diferentes regiões qual era o custo de vida e assim o salário-mínimo acabou instituído com valores diferentes”, conta.

De acordo com Karina Lima, o salário-mínimo, como ainda acontece hoje, surgiu para dar ao trabalhador as condições mínimas de moradia, alimentação, higiene e transporte. A padronização de valor para todo o Brasil só aconteceu na década de 1980. “A padronização começou em 1984 e com a promulgação da Constituição em 1988 ela foi regulamentada”, acrescenta a economista.

Cobertura

Desde a sua criação, o salário-mínimo no Brasil não chegava a cobrir todas as necessidades dos trabalhadores. Além disso, outras foram surgindo a partir dos novos debates em relação aos impactos do trabalho para a saúde. Elementos como o lazer, por exemplo, ganharam mais atenção como aspecto fundamental para o equilíbrio em atividades laborais.

A professora Karina Lima diz que em valores médios, o valor do mínimo no início da sua vigência, comparado a hoje ficaria em torno de R$ 1.200. O total não é muito diferente do que estava em vigor até o reajuste adotado pelo novo governo federal que o fez passar de R$ 1.212 para R$ 1302. Há ainda uma expectativa de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assine um decreto para entrar em vigor no próximo dia 1º com um reajuste para R$ 1.320 em uma política de valorização continuada do benefício.

“Em 1962, o salário-mínimo chegou a valer cerca de R$ 1.700 nos valores de hoje. Foi uma melhoria ampla para os trabalhadores daquele período cujo salário não dava para garantir as necessidades básicas. Naquele momento foi um grande avanço”, acrescenta a economista.

Conquistas

Em sua avaliação, a melhoria das políticas trabalhistas com a chegada do salário-mínimo ocorreu porque ele esteve acompanhado de outros benefícios como a aposentadoria e licença maternidade. “Getúlio Vargas que teve um primeiro governo complexo e marcado também pelo autoritarismo aproveitou um momento que lhe era propício para articular benefícios para categorias profissionais, afinal o mundo estava mudando. Em 1917 ocorreu na Rússia uma revolução socialista. Ele deu aparato para os sindicatos, mas ao mesmo tempo estes não podiam fazer greve e sim negociar diretamente com o governo”, analisa Karina Lima.

Outras decisões do próprio governo Vargas como a industrialização do país, o modelo chamado de desenvolvimentista e a criação de estatais levaram ao surgimento de novas classes de trabalhadores sobretudo nos centros urbanos. O trabalho, portanto, apresentava novas demandas e desafios e isso esteve muito presente nos debates sobre o mínimo como registrou uma reportagem publicada na edição de A TARDE de 12 de janeiro de 1940. Nas decisões sobre os valores do salário-mínimo ficou previsto um acréscimo para trabalhadores submetidos a atividades com riscos para a sua saúde no princípio conhecido com insalubridade.

“Para os trabalhos considerados insalubres, a comissão tendo em vista o disposto no artigo 4, do decreto 399, e Pragrapho do mesmo Art., resolveu fixar um valor adicional de 20, 30 e 40% dos respectivos salários de accordo com o maior ou menor grau de insalubridade”. (A TARDE, 12/1/1940, p.8).

Um valor salarial mínimo está presente, de acordo com a economista Karina Lima, em cerca de 90% dos países. O mais antigo é o da Austrália estabelecido ainda no século XIX. Já nos EUA e no Canadá o valor varia de acordo com cada região semelhante ao que aconteceu no início da sua vigência no Brasil. “Um dos modelos em que o mínimo acompanha outros benefícios como no Brasil é a França, mas lá também houve uma reforma com flexibilização desses direitos e que tem causado muita polêmica”, ressalta a economista.

Já em relação à valorização não há muito a comemorar. Segundo Karina Lima, o Brasil está no ranking dos 30 países com o salário-mínimo mais baixo ao lado de Colômbia e México. Mais um motivo para fazer do 1º de maio, que será comemorado na próxima segunda-feira, mais do que um feriado e, sim um dia para refletir sobre como conquistas históricas necessitam ser atualizadas e foco de uma luta continuada.

*Cleidiana Ramos é jornalista e doutora em antropologia

*A reprodução de trechos das edições de A TARDE mantém a grafia ortográfica do período.

Fontes: Edições de A TARDE, Cedoc A TARDE

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