Brasil perde terreno no futebol moderno por não formar meio-campistas
Na nova coluna, Tostão analisa como o Brasil ficou para trás na evolução tática e estrutural do futebol mundial

Após a Copa de 1970, o passado, presente e futuro poeta e músico Pasolini escreveu que a poesia brasileira, a beleza, a improvisação e a fantasia, tinham derrotado a prosa italiana, organizada e previsível. Não foi bem assim. A seleção brasileira, dirigida por Zagallo, era prosa e poesia.
Na mesma época, o poeta, escritor e músico Chico Buarque, disse que os europeus eram os donos do campo, pela distribuição e ocupação dos espaços, enquanto o Brasil era o dono da bola, pela habilidade e carinho que a tratava.
O mundo e futebol mudaram, 50 anos, uma eternidade. Após a segunda guerra, a Europa, bastante destruída, iniciou a recuperação econômica e social, que se refletiu no futebol. Perceberam que para melhorar o espetáculo, atrair o público e ganhar dinheiro, precisavam formar mais talentos, melhorar os gramados, o calendário, a qualidade da arbitragem e diminuir a violência dentro e fora dos estádios. É o que o Brasil ainda não fez.
Evolução e bons jogadores
Com o tempo, além desta evolução, passaram a contratar os bons jogadores de outros continentes e contar com a ajuda importante dos emigrantes, que agora querem diminuir seguindo o modelo hediondo dos EUA. Hoje, o clichê dos anos 60 e 70 de que se formava um craque a cada semana no Brasil e que os europeus eram cintura dura, sem habilidade, não existe há muito tempo.
Os craques estão presentes em todos os continentes
Os europeus saíram também na frente nas mudanças estratégicas, especialmente nas duas ultimas décadas, com o aumento da intensidade do jogo, da compactação entre os setores e a marcação mais de perto por todo o campo, desde a saída de bola do adversário. Apenas recentemente, com o grande aumento de treinadores portugueses e argentinos, os times brasileiros passaram a adotar uma postura mais moderna, embora ainda timidamente.
Valorização dos meio-campistas
Outra grande mudança na Europa foi á valorização dos meio-campistas que jogam de uma intermediária a outra. Marcam, constroem e avançam. No Brasil ocorreu o contrário, ao dividirem o meio campo entre os volantes que marcam e os meias ofensivos que atacam. Depois de Falcão e Cerezzo, craques da Copa de 1982, o Brasil não teve um único meio-campista de grande prestigio mundial. Enquanto isso, os europeus tiveram Zidane, Kross, Modric, Xavi, Iniesta e tantos outros que encantaram o mundo. Nenhum era o clássico camisa 10 que o Brasil tanto pede.
O Brasil não tem um grande craque no meio campo porque não forma
Isso precisa mudar. Repito, pela milésima vez, o Brasil não tem um grande craque no meio campo porque não forma. Os jogadores de meio campo com grande talento são deslocados desde as categorias de base para atuarem mais perto do gol, pelo lado ou pelo centro. É preciso unir o passe especial do meio-campista com o drible espetacular dos meias mais avançados. Assim como o drible é o símbolo da individualidade, da habilidade, o passe representa o jogo coletivo. Os dois são essenciais.
No final de semana começa, pela primeira vez, a Copa do Mundo de clubes, com um enorme número de participantes de vários continentes. É jogo demais, mais uma competição para a FIFA, federações de cada país e investidores ganharem muito dinheiro. Os jogadores, especialmente os europeus, no mínimo, deveriam protestar, pois nesta época estariam de férias após uma temporada extremamente cansativa.
*Tostão é cronista esportivo, participou como jogador das Copas de 1966 e 1970.