Democracias em perigo
Coluna analisa a passagem do cientista político Steven Levitsky pelo Brasil e suas reflexões sobre o futuro das democracias

O cientista político e professor de Harvard, Steven Levitsky, tem sido uma das principais referências sobre as democracias contemporâneas e passou na última semana pelo Senado, pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pelo Palácio do Planalto. Autor de “Como as democracias morrem” (2018) e do livro mais recente “Como salvar a democracia” (2023), ele encontrou ministros do STF e o presidente Lula depois de participar do seminário “Democracia em Perspectiva na América Latina e no Brasil”.
A visita aos líderes políticos brasileiros pontuou como um balanço reflexivo em um país mergulhado em uma crise iniciada em 2013 e que tende a se encerrar em 2026.
O diagnóstico que percorre seus livros é claro: as democracias se desfazem por dentro, pela erosão de normas e das instituições que sustentam os freios e contrapesos. A Itália é governada por Giorgia Meloni desde 2022. Na Áustria, o FPÖ, partido de extrema direita de perfil nacional populista e cético em relação à União Europeia, venceu as legislativas de 2024. Na Alemanha, a AfD (Alternative für Deutschland), legenda de extrema direita com agenda anti-imigração, obteve vitórias históricas no Leste e ficou em primeiro na eleição estadual da Turíngia.
Na França, o Reunião Nacional (RN), partido de Marine Le Pen e Jordan Bardella, liderou o primeiro turno das legislativas de 2024 e ampliou sua influência. Em Portugal, o Chega se tornou uma voz crescente da extrema direita com um discurso defensor da “lei e ordem”, propostas anti-imigração, se tornando a principal força de oposição, deslocando o eleitorado português para a direita.
No caso brasileiro, Levitsky tornou-se leitura obrigatória porque antecipou riscos democráticos que ajudaram a explicar a ascensão do bolsonarismo como resultado de uma nova base social e ideológica marcante no eleitorado brasileiro.
A tentativa de golpe do 8 de janeiro é o retrato de um movimento ampliado que levou à democracia brasileira para as cordas, no entanto, as instituições trataram de tirá-las da defensiva. A reação combinou proteção do voto, atuação célere do sistema de Justiça e a aliança pontual em 2022 de setores democráticos que resistiram em moderar Jair Bolsonaro como fizeram em 2018.
A análise que Levitsky apresentou ao longo da semana foi que o Brasil reagiu com mais rapidez do que os Estados Unidos ao avanço das forças autoritárias. Também ressaltou a necessidade de impor custos a violadores recorrentes, fortalecer partidos e, passada a tempestade, devolver protagonismo à arena representativa, onde o conflito se processa legitimamente por votos e negociação.
O julgamento de Bolsonaro pela trama golpista do 8 de janeiro assegurará mais uma vez que as democracias são testadas, mas podem resistir e seguir em frente.
*Cláudio André é professor Adjunto de Ciência Política da UNILAB e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (UFRB). E-mail: [email protected].
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