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O pós-carlismo de ACM Neto

O carlismo conservou seus traços principais quanto ao método de dominação política

Publicado segunda-feira, 23 de maio de 2022 às 00:00 h | Atualizado em 29/05/2022, 18:55 | Autor: *Cláudio André de Souza
ACM Neto e Cacá Leão
ACM Neto e Cacá Leão -

O carlismo de ACM, como “pensamento único”, soube muito bem se reciclar num processo de conversão às instituições democráticas e liberais. Conservou, porém, seus traços principais quanto ao método de dominação política, por meio da ocupação, de forma autoritária, de espaços de poder na administração do Estado, o que também ocorria com controle e profunda cooptação de segmentos do mercado e da sociedade civil.

Se não se pode negar o legado autocrático de ACM na política baiana, isso não exclui enxergar, por outro lado, sua habilidade política no exercício do poder. Além disso, também é verdade que duas lideranças foram responsáveis por criar uma transição pós-carlista ao grupo: Luís Eduardo Magalhães e ACM Neto.

O primeiro já estava com seu caminho traçado: ser candidato a governador da Bahia em 1998 e provável sucessor de FHC em 2002. Seu trágico falecimento, em abril de 1998, interrompeu uma linhagem sucessória que estava em andamento no carlismo, aderente ao pluralismo político, com forte capacidade de diálogo e liderança, já que ele era líder da base aliada do governo FHC, tendo sido presidente da Câmara dos Deputados (1995-1997), sucedido por ninguém menos que Michel Temer (PMDB), o que torna fácil deduzirmos qual seria o provável protagonismo reservado ao político baiano.

O falecimento precoce de Luís Eduardo levou ACM Neto a ser projetado como a liderança política a herdar o espaço do seu tio. Nas eleições de 1998, o jovem político visitou mais de 40 municípios e discursou em quase todos os palanques. Já naquela eleição, assumiu um protagonismo que pavimentou a sua eleição a deputado federal em 2002, como o mais votado da Bahia. Depois, manteve-se à frente dos “dias difíceis” que se deram com a derrocada do carlismo, sacramentada com o falecimento de ACM em 2007.

O que chamamos aqui de pós-carlismo representa, conceitualmente, um marco temporal de reconfiguração do grupo sob a liderança atual de ACM Neto. É inconteste, inclusive, sua adesão aos valores democráticos e liberais; em contraste, o pluralismo político como princípio foi negado por seu avô ao longo de todo o processo político em que esteve à frente, na política baiana.

Por que fazemos essa digressão? Ela decorre da necessidade de sairmos vivos da “guerra das pesquisas”; o peso de ACM Neto é resultado de uma carreira política de protagonismo local e nacional nas últimas duas décadas. Ao liderar o pós-carlismo, na verdade, ele aglutina consigo uma parte importante do eleitorado baiano que se identificava com seu avô, somada a outra parte que avalia positivamente sua passagem à frente da prefeitura de Salvador. As próximas eleições marcarão o reencontro de Lula com um carlismo menos carlista, despolarizado e repaginado. São outros tempos.

*Professor Adjunto de Ciência Política da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB) e um dos organizadores do “Dicionário das Eleições” (Juruá, 2020).

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