Com açúcar, com afeto | A TARDE
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Com açúcar, com afeto

Publicado sábado, 16 de outubro de 2021 às 08:00 h | Atualizado em 18/10/2021, 18:43 | Autor: Isabel Oliveira
Os caderninhos de receitas das vovós são uma mistura de afeto e gulodice | Bolo da Luz/ Divulgação
Os caderninhos de receitas das vovós são uma mistura de afeto e gulodice | Bolo da Luz/ Divulgação -

A transmissão do conhecimento através das eras sempre foi de responsabilidades dos idosos, que passavam toda sabedoria acumulada de uma geração para outra. Assim ocorreu na Grécia do mundo antigo, nas sociedades das tribos indígenas, entre outras culturas para que os povos pudessem sobreviver.

Os cadernos de receita da vovó, que passam para o filho e muitas vezes vão para os netos, talvez carreguem um pouco desse sentimento intrínseco ao ser humano ao passar o conhecimento gastronômico para a geração seguinte em seus caderninhos misturados de afeto e gulodice.

Foi esse sentimento, talvez sem nem mesmo perceber, que a vovó Aída Silva Teles de Souza deixou para as quatro gerações da família. Boa cozinheira, afetiva e generosa, ela adorava alimentar a família com seu banquete particular. Aos domingos, a casa de dona Aída era uma festa.

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O caderno de receitas afetivo da vovó Aída Teles | Raphael Müller/Ag. A TARDE 

Todas essas impressões ficaram cravadas na memória do neto, Gustavo Carvalho, ligadas por profundos laços afetivos com a avó. “E foi justamente por isso que comecei a cozinhar, para manter essa história viva”, diz. “Todos os domingos a família se reunia. Eu adorava ver minha avó cozinhando, mas ela não me deixava ficar na cozinha. O dia do cozido era fantástico. Eu via toda aquela mulherada cortar legumes, fazer o feijão mulatinho, as carnes. Era uma fartura de mesa que ela compartilhava”, conta, cheio de emoção das lembranças.

Para o neto da dona Aída, é difícil dizer qual prato ficou mais marcado na memória. Há a torta de nozes do Natal e sua filha Mariana lembra do bolo de cenoura com calda de chocolate da bisa. Mas um dos pratos que merecem atenção e também ficaram marcados na memória afetiva de Carvalho, aquele preferido no caderninho de receita, é o caruru, feito por sua mãe, dona Maria José, e pela sua avó, no dia do seu aniversário, em 17 de outubro. O cheiro do acepipe exalando pela casa ainda é uma lembrança muito forte e está impregnado para sempre no coração de Gustavo.  

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O caderno de receitas da avó Aída vai para as mãos da bisneta Mariana, filha de Gustavo Carvalho | Raphael Müller/Ag. A TARDE

“O dia inteiro era cheiro de caruru pela casa toda. A banana frita exalando, a farofa sendo feita. Eu, que sempre ia observar como tudo estava sendo preparado, lembro de ir com a colherinha roubar um pouquinho da farofa. ‘Sai daqui, menino’, ouvia. À noite, a gente ia comer um dos meus pratos favoritos”, conta.

Até hoje Gustavo guarda o caderno de receitas que passou para a mãe e agora vai para a filha, Mariana, que também gosta de cozinhar e é estimulada pelo pai, tanto que Carvalho a presenteou com caderninhos de receita da bisa. Não só a ela, mas toda a família foi brindada com as receitas memoráveis da vó Aída. “Quando eu vejo as receitas escritas à mão nos livros, lembro de quando aquele prato foi feito e de quem estava presente. Para mim, uma receita traz mais lembranças do que uma foto”, revela.

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As guloseimas fazem parte da memória afetiva de muita gente | Bolo da Luz/Divulgação 

As lembranças dos almoços em família também fazem parte da memória afetiva de Fernanda Bamberg, cujos receituários eram transcritos num caderno até hoje guardado com o pai. Bamberg conta que muitas vezes se livra do celular e de qualquer aparato eletrônico, vai ler e fazer seus quitutes nas receitas que vem colecionando durante toda a sua vida, muitas delas copiadas do caderno da mãe.

“Minha mãe era nutricionista e uma cozinheira de mão cheia. Aprendi com ela a habilidade de misturar ingredientes e de fazer um bom prato. Quando estava viva, todos os domingos era na casa de meus pais. Nos reuníamos para o almoço, não importava o tempo que fizesse. Esses dias pareciam de festa de fim de ano devido à quantidade e à variedade de pratos que ela oferecia”.

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Fernanda Bamberg até hoje faz os quitutes das receitas colecionadas no caderno da mãe |  Fernanda Bamberg/Divulgação

Carregados de comidas afetivas, os cadernos de receitas também são retratos da cultura de uma época. Eles trazem ortografias que já nem mais existem e receitas démodé. Quem aí já ouviu falar ou teve o prazer de conhecer manjar branco, receita bem antiga; ponche; cueca virada; pudim de requeijão? E aquelas copiadas nos rótulos das caixas de produtos, como a Maizena? Os cadernos de receitas também falam e têm a marca dos seus donos. Uns aparecem com pequenos erros de ortografia; outros trazem as receitas coletadas com a vizinha e que levam o nome delas. Há aquelas afanadas da tia, as copiadas em revistas de época.

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Os cadernos de receitas também são retratos da cultura de uma época | Fernanda Bamberg e Bolo da Luz/Divulgação 

No caderno de receita de mais de 30 anos da mãe de Fernanda Bamberg, há alguns palavras com uso de ortografia mais antiga, mas o impagável nas receitas são alguns títulos, no mínimo, inusitados. Quem já ouviu falar em “De bunda para cima”? A receita leva camarão defumado ou seco, leite e sal. São os ingredientes na receita diferente. “Não discutia o assunto com minha mãe dessas receitas inusitadas, mas as lembranças são dos nossos almoços de domingo e, no Natal, a alegria de estar junto à família”, declara.

As lembranças dos almoços de domingo da família também fazem parte da memória de Joelia Simples, da empresa Bolo da Luz. É com muito afeto que ela conta sobre os oito irmãos dividindo a mesa do almoço, lambendo os beiços da comida gostosa que a mãe fazia. “Natal era a época que mais gostava. Havia o bolo, torta de frutas, peru e um pernil de dar água na boca de todo o mundo. Todos se deliciavam com a fartura da festa de Natal”, conta.

As receitas da família de Joelia não ficaram num caderninho, mas as lembranças da comida gostosa que aprendeu permaneceram na memória e foram levadas para a empresa Bolo da Luz.

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As receitas da mãe de Joelia Simplies não ficaram num caderninho, mas permanecem em sua memória afetiva | Bolo da Luz/Divulgação 

“Minha mãe sempre gostou muito de cozinhar. Ela fazia muito bem bolos de todo tipo: bolos de carimã, de aipim, de milho, considerados os melhores da cidade de Santo Antônio de Jesus. Eu fui a filha com o talento para gastronomia, aprendi tudo com ela. Até que um dia o padre Rogério, da Igreja Nossa Senhora da Luz, na Pituba, me chamou para fazer algo que ajudasse no projeto comunitário da igreja. Eu logo pensei no bolo da minha mãe para vender depois da missa”, conta.

Abertos próximos à pia, ao fogão, ao lado dos ingredientes, elementos que ajudam a oxidar as folhas e amarelar as páginas com o sabor do tempo, as lembranças dos cadernos de receitas ficam materializadas em nossas memórias, que guardam aquele almoço festivo de domingo, o bolo de fim de tarde regado a um café quentinho, os cheiros que vêm à tona e passam a ter significado familiar e especial. Os cadernos de receitas contam histórias das nossas vidas e estão impregnados de cheiros e sabor.

É em meio a tantas histórias afetivas que deixamos a receita do bolo de carimã da empresa Bolo da Luz, de Joelia Simples.

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Bolo de Carimã do Bolo da Luz

BOLO DE CARIMÃ

Do que você vai precisar:

- 1l de leite

- 1kg de carimã

- 3 ovos 

- 2 colheres cheias (sopa) de manteiga

- 1 coco fresco (também pode substituir por um pacotinho de 200g de coco ralado)

- 1 garrafinha de leite de coco (200ml)

- 1 colher de chá de sal

- 1 xícara de açúcar

Modo de preparo:

Tire a casca do coco e corte em pedaços. Bata todos os ingredientes no liquidificador, despeje na assadeira e coloque para assar em forno preaquecido (180°C) por aproximadamente 40 minutos ou até dourar. Facilímo! 

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