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Histórias & Sabores

Por Isabel Oliveira

ACERVO DA COLUNA
Publicado sábado, 26 de novembro de 2022 às 0:12 h | Autor:

Povo do quilombo de Conceição de Salinas é símbolo de resistência

Com alimentação à base de pescados, moradores têm no curioso pirão ou farofa de café a marca da perseverança

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Farofa de café e dendê
Farofa de café e dendê -

Vivendo nas praias marisqueiras do quilombo Conceição de Salinas, município de Salinas da Margarida, na Bahia, Lucinea Macedo Muniz acorda todas as manhãs tendo como horizonte a pesca, sustento das famílias quilombolas desde que ela se entende por gente.

Imagem ilustrativa da imagem Povo do quilombo de Conceição de Salinas é símbolo de resistência
| Foto: Alício Charot/ Acervo pessoal

O local foi reconhecido pela Fundação Zumbi dos Palmares como um quilombo remanescente de quase 320 anos, com informações “baseadas nas construções da Igreja Católica, fundamentada em alguns documentos da Igreja”, conta Lucinea.

Filha da terra, Eleonice Conceição Sacramento, em suas pesquisas conta no seu livro ‘Salinas Notícias Históricas’“ a igreja de Nossa Senhora da Conceição é um templo de mais de três séculos. Isso significa que quem construiu essa igreja foram pessoas escravizadas ou pessoas em fuga da escravização. O processo de escravização oficial terminou um tempo antes da data marcada para o fim da construção da igreja”, conta, reforçando o reconhecimento do local como quilombo.

Eleonice é marisqueira quilombola
Eleonice é marisqueira quilombola | Foto: Alício Charot/ Acervo pessoal

A marisqueira e pescadora Lucinea pertence a uma das muitas famílias de ex-escravos. A bisavó, dona Filomena, era filha de escravos neste pedaço de terra, uma das muitas comunidades de quilombos espalhados pelo Brasil.

“Segundo minha avó contava, a minha bisa Filomena era remanescente de escravos. E a comunidade quilombola recebeu a certificação da Fundação Zumbi dos Palmares baseada em relatos de documentos da Igreja Católica do século XVII”, afirma.

Quando a gente fala em povos originários, está falando de uma série de povos que foram, de certa forma, esquecidos, alienados da realidade cultural brasileira.

Alício Charot - pesquisador

Leonice relata que Filomena, segundo contam os mais velhos do local, “ foi uma das mulheres que povoaram Conceição, teve 13 filhos, entre eles dez mulheres. E aí a gente consegue puxar que nós estamos chegando à 9ª geração da raça de Filomena. A gente consegue puxar, antes de Filomena, Veridiana, a mãe de Filomena e mais três das suas irmãs. A gente também tem uma história oral, que eu sistematizei na minha dissertação, que se transforou em um livro: ‘Da Diáspora Negra ao Território de Terra e Água Conceição’. E a gente tem notícia da presença de Conceição, mas que essa seria uma mulher negra de posses, liberta, possivelmente ganhadeira que chega ao território em 1.700. Segundo as mais velhas, foi ela que mandou construir a igreja em homenagem a Nossa Senhora da Conceição”, conta.

Como toda a família, a maioria mulher, e todo morador da região, Lucinea apresenta seu modo de viver, que passa de geração para geração.

Imagem ilustrativa da imagem Povo do quilombo de Conceição de Salinas é símbolo de resistência
| Foto: Alício Charot/ Acervo pessoal

“Estamos na Baía de Todos-os-Santos, mas vivemos como em toda localidade ribeirinha. Basicamente, toda renda daqui é da pesca e do marisco, mar do qual saem toneladas de peixe da comunidade. Nós vivemos de marisco, peixe, camarão, dos crustáceos. O território desta localidade, o maior porto pesqueiro, tem mais ou menos umas 500 canoas motorizadas, pois hoje já não fazem mais aquele padrão de quilombo, quando as canoas eram de pau. Hoje já é de fibra. Tem algumas ainda de pau”, conta Lucinea.

A comida é, sem dúvida, um dos símbolos de resistência de qualquer quilombo. É preciso alimentar o espírito, mas também o corpo para nutrir a alma de resistência. Neste ambiente pesqueiro, há alguns séculos, o povo ribeirinho do quilombo Conceição de Salinas encontrou a perseverança que precisava para guardar suas vidas e alimentar seus ideais de liberdade. Mas quando se fala na alimentação é preciso considerar a participação dos povos originários, como lembra o pesquisador Alício Charot, que visitou mais de 20 quilombos da Bahia.

Alício Charot é pesquisador da vida e alimentação quilombola
Alício Charot é pesquisador da vida e alimentação quilombola | Foto: Alício Charot/ Acervo pessoal

“Quando a gente fala em povos originários, está falando de uma série de povos que foram, de certa forma, esquecidos, alienados da realidade cultural brasileira. A começar pelos índios, que são originários porque estavam aqui antes, por causa da invasão. Mas dentro de uma visão diaspórica a gente pode pensar nesses povos como povos negros, povos ribeirinhos, marisqueiros, todo esse grupo de pessoas”, afirma.

O pesquisador reforça que os negros, ao formarem os quilombos, encontravam os índios e estabeleciam uma relação de importante troca de culturas.

“Quando a gente fala de quilombo, a gente tem que falar de uma relação de povos negros que se rebelavam de um sistema escravista e iam para as matas que eles não conheciam. Ali, quem eles encontravam? Eram os povos indígenas, os pretos da terra. Quando a gente fala neste contato é muito importante porque a partir disso a gente vai compreender por que tantos pratos afro-baianos têm uma nomenclatura indígena e tantos pratos indígenas chamam a atenção para a relação africana”, explica.

Imagem ilustrativa da imagem Povo do quilombo de Conceição de Salinas é símbolo de resistência
| Foto: Alício Charot/ Acervo pessoal

Como todo quilombo, em Conceição de Salinas vive-se do que a terra oferece e aplica-se o que lhes foi ensinado para a sobrevivência. E a comida no quilombo de Conceição de Salinas é simples, como é simples a vida dos quilombolas à cata de mariscos, peixes, uma infinidade de crustáceos que o mar oferece. Como diz Charot, “ lá é uma cozinha que não tem segredos. Lá eles pegam uma quantidade variada de mariscos que a gente da cidade não conhece: rala-coco, papa-fumo, peguari, tarioba, sarnambi, guaiamum, ovas salgadas, ou sardinhas em Xangó e a utilização da farinha como base alimentar, como pirão, como farofa”, conta.

A farofa é um capítulo à parte para o mundo de Lucinea, alimento que muito conta sobre a história de vida dos quilombolas do local. Foi a farofa ou pirão de café que sempre alimentou, como complemento, a população ribeirinha, em Conceição de Salinas, nas grandes dificuldades

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“Tenho 63 anos, então desde menina, como a gente é uma comunidade da pesca, e como a vida da gente não foi muito fácil, era como a gente se alimentava, com o pirão do café, sempre à noite. Assava o peixe e nós comíamos com o pirão ou a farofa do café com azeite, com peixe assado ou peixe frito, o que houvesse no momento. Mas era basicamente o que nós comíamos, era o pirão de café com outros complementos”, conta. “Quem me ensinou foi a minha mãe. Éramos quatro filos, não tinha outro jeito a não ser comer o pirão de café”, ressalta.

E completa: “Como nós somos filhos de pescadores e não tinha muito recurso como hoje tem [arroz, macarrão, variedades], não tinha jeito. Então, meu pai pescava fora e quando mandava um dinheiro era no final de semana e quando tinha um pescador para trazer. Nós comíamos o que tinha que era a farofa, o pirão de azeite, que minha mãe adoçava, o café, e a gente não tinha recurso. O recurso era comer o pirão”, diz.

Vamos homenagear este povo resistente e persistente ensinando um alimento que é o retrato da perseverança de um povo: a curiosa farofa de café!

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| Foto: Elane Santana/ Acervo Pessoal

Receita de Farofa de Café ou Pirão de Café

Ingredientes

1/2 copo de café

Açúcar a gosto

250g de farinha de mandioca

3 colheres de sopa de azeite de dendê

Modo de fazer

Adoce o café. Em seguida, coloque no prato e despeje, aos poucos, a farinha e o azeite, sempre amassando com a mão. Quando se transformar em uma farofa, já está pronto. Caso queira que se transforme em pirão, pode colocar mais café e azeite para ficar na consistência do pirão.

A farofa ou pirão de café podem ser servidos com peixe frito ou peixe assado na brasa. Também podem ser servidos com carne seca.

NOTAS COM HISTÓRIAS & SABORES

FESTIVAL DE HAMBURGUER É A BOA PEDIDA PARA O FIM DE SEMANA EM SALVADOR

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| Foto: Divulgação

O maior roteiro gastronômico de hambúrguer do mundo, o Burger Fest, promete agitar o final de semana de Salvador com sua edição de 10 anos. Para deixar os fãs de hamburguer água na boca, os mais de 20 restaurantes, bares e hamburguerias participantes criaram receitas exclusivas, que ficarão disponíveis para o público até o próximo dia 30 de novembro. O festival valoriza pratos preparados com ingredientes premium, uma deliciosa combinação das melhores carnes com os mais diferenciados temperos, queijos e condimentos. Participam do tour gastronômico de Salvador, dentre outros restaurantes, o Leo Cintra Cozinha, Best Burguer Bahia (Doron); Brabock Burger (Federação)

MIRANTE FORTE SÃO DIOGO REPAGINA ESPAÇO, AMPLIA INSTALAÇÕES E LANÇA CARDÁPIO ASSINADO PELA CHEF CHUCA CARDOSO

Imagem ilustrativa da imagem Povo do quilombo de Conceição de Salinas é símbolo de resistência
| Foto: Divulgação

Localizado dentro da estrutura do Forte de São Diogo, no Porto da Barra, com uma vista de tirar o fôlego para a Baía de Todos os Santos, o Mirante Forte São Diogo comemora 5 anos e reabre suas portas com novas instalações, decoração repaginada - em projeto assinado pela AMBEV e empresa LUPO - e novo cardápio. O menu, recheado de iguarias da cozinha contemporânea, leva a assinatura da renomada Chef Chuca Cardoso (@chucagastronomia). O objetivo dos gestores do Mirante é proporcionar ao cliente uma experiência de turismo e lazer. Um ponto alto são as obras de Carybé, projetadas na fachada do Forte. Endereço: Av. Sete de Setembro – Barra. Contatos e reserva: 71 98263-8871 / 71 99228-3804

FESTIVAL GASTRONÔMICO DE AMARGOSA SEGUE ATÉ 4 DE DEZEMBRO

Conhecida como “Cidade Jardim”, Amargosa, no Vale do Jiquiriçá, sedia, até 4 de dezembro, a primeira edição do Festival de Cultura e Gastronomia. Com o tema “A felicidade mora nas melhores receitas”, o festival visa estimular o protagonismo de pratos que valorizam produtos locais como carne de sol, licuri, jenipapo, jaca, umbu, acerola e banana da terra. Ao todo, 20 pratos estão disponíveis para degustação do público nos diversos estabelecimentos participantes. Mais detalhes e endereços dos estabelecimentos podem ser acessados em festivaldeamargosa.com.br. A iniciativa é uma parceria do Sebrae, Prefeitura de Amargosa, Senac e Associação Comercial, Industrial e Agropecuária de Amargosa (Aciapa).

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