Apagão geral
Confira a coluna Olhar Econômico desta sexta-feira
O Brasil viveu a partir das 8h31 da última terça-feira (15/08) a horrível sensação de um mundo sem energia. Apesar dos inúmeros sistemas de geração de emergência atuarem repondo eletricidade, para os sistemas essenciais, os distúrbios causados à população foram imensuráveis. Sem semáforos, metrô parado, sinal de celular funcionando de mal a pior, sem internet e elevadores, todos ficaram atônitos sem saber da extensão do ocorrido, aguardando retorno rápido, que na Bahia iniciou no final da manhã se estendeu até o início da tarde. Uma parada cardíaca no organismo chamado SIN – Sistema Interligado Nacional que abastece as regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e parte da Região Norte!
Guardadas as devidas proporções e respeito aos vivos, a interrupção de quase todo sistema de energia no Brasil é um incidente gravíssimo e que precisa ser investigado e estudado com muita profundidade. Temos um dos sistemas interligados mais extensos do planeta, com uma matriz energética rica e diversificada, com abundância das fontes renováveis e distribuídas pelo imenso território nacional. Somos exemplo para o mundo e situações como essas servirão de base para o aperfeiçoamento das condições seguras e estáveis de operação dos sistemas com geração de energia conectada em redes complexas, com múltiplas fontes, formas e cada uma com um funcionamento diferente.
Em se tratando de um evento técnico de grandes proporções, inusitado e de difícil diagnóstico, a ciência necessita de tempo e dados para emitir uma avaliação correta e promover um relatório que consolide causas, efeitos e ações para evitar a repetição de eventos similares. Nesse lapso de tempo, oportunistas do caos, sempre a postos, começaram a espalhar falsas responsabilidades com interesses meramente políticos ou econômicos. Estamos sendo vítimas das especulações e “fake-news” a disposição de interesses suspeitos. No momento de se preservar o senso de imparcialidade, reina a emissão de “supostas” verdades para confundir e dividir a opinião pública.
Nos últimos dias diversas redes sociais e jornalistas colocaram matérias impulsionando julgamentos errados como: “... bastou privatizar a Eletrobras que houve apagão no Brasil inteiro”. Ou ainda: “pode ter ocorrido um problema operacional nas linhas por causa de um abrupto aumento de produção de energia solar e eólica...” (SIC)!
A Revolução Científica, surgida entre os séculos XVI e XVIII, mudou o pensamento humano trazendo uma nova visão da natureza. A visão do mundo a partir da visão grega, dominante na ciência primitiva, ou a visão fundamentada nos princípios e dogmas da religião (Igreja) foram gradativamente substituídos pelo raciocínio, pela investigação e a metodologia científica essencial para a humanidade descobrir o funcionamento e a evolução do viver neste mundo. O conhecimento científico é a alavanca da evolução humana e está sendo colocado à prova pela comunicação fácil e de longo alcance das redes sociais de onde nascem os duvidosos cientistas e experts de tudo, sem nada na bagagem.
Em nota de 16/08/23 o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), informou que “concluiu a análise preliminar dos eventos ocorridos em 15/08/2023. Foi constatado que o primeiro evento da ocorrência foi a abertura, por atuação incorreta da proteção, da LT 500 kV Quixadá-Fortaleza II. O desligamento isolado não causaria o impacto visto no SIN e este é um ponto que ainda está sendo apurado. Neste momento, as equipes do Operador seguem aprofundando a análise da ocorrência, estando prevista para o dia 25/08 próximo a realização de reunião com os agentes envolvidos, além do MME e Aneel, para avaliar detalhadamente as causas e as consequências da ocorrência”. A ciência se baseia em “fatos”, não em opiniões! Esperamos meios de comunicação a divulgarem notícias sérias e comprovadas. Informação correta para formação de opiniões. A politização da ciência é um mal que causa danos ao mundo como na pandemia do Covid-19. A polêmica despropositada, inconsequente vem ganhando destaque e passando ao papel de protagonista, deixando a realidade em segundo plano. É esse legado que queremos deixar para nossos filhos e netos? O que esperar de um futuro em que ciência e mentira andem lado a lado, a primeira sendo desacreditada pelos interesses da outra? A verdade é que em 16/08/23, 87,4% da energia produzida no Brasil veio de fonte renovável, das quais 26,2% da geração eólica e solar fotovoltaica, conforme o IPOD – Informativo Diário de Operação emitido pela ONS. Apagou geral, mas não foi por conta da energia renovável!
*Engenheiro eletricista, especialista em Gestão e Comercialização de Energia Elétrica