Jabuti no poste
Confira a coluna Olhar Econômico
Lá se vão 27 anos que o governo da Bahia, junto com o governo Federal, privatizou a concessão de energia elétrica com a venda da Cia. de Eletricidade do Estado da Bahia - Coelba. Empresa criada em 16/10/1959 através da Lei estadual 1196 quando Juracy Magalhães era governador, atendia apenas 21 localidades em seu primeiro ano de existência. Ao longo dos anos incorporou os serviços de eletricidade providos pelas prefeituras e outras empresas de “força e luz”, como a CERC (Cia. Elétrica Rio de Contas), CEEB (Cia. de Energia Elétrica da Bahia), Sulvale de Correntina e usinas hidrelétricas como a de Funil, em Ubaitaba. Privatizada em 31/07/97, foi arrematada em leilão público por R$ 1,73 bilhão. O consórcio formado pela Caixa de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil (Previ), o Banco do Brasil Investimentos e o Grupo Iberdrola (Espanha) foram os vencedores. Atualmente o grupo espanhol controla a Coelba e outras 4 (quatro) distribuidoras de energia no Brasil: Celpe (Pernambuco), COSERN (Rio Grande do Norte), Elektro (interior de São Paulo) e a CEB (Distrito Federal). Em 2023 a Coelba teve um resultado (EBTIDA) de R$1,28 bilhão, conforme relatório aos acionistas do próprio Grupo Neoenergia, publicado em seu website.
A Lei 9.074/1995, que deu origem ao processo de privatização do setor elétrico no Brasil, no parágrafo 1º, artigo 4º, define que as concessões teriam prazo de 30 anos, podendo "ser prorrogado no máximo por igual período, a critério do poder concedente, nas condições estabelecidas em contrato" (§ 3º, artigo 4º), porém o interesse de prorrogação deve ser manifestado em até 36 meses antes da data final do respectivo contrato, e o poder concedente deverá responder em até dezoito meses antes dessa data. No caso da Coelba o período de concessão se encerra em 31/07/2027, e os baianos, através de seus meios representativos, podem e devem se manifestar sobre essa prorrogação, ou não, até 31/01/26. Ainda há tempo!
O MME–Ministério de Minas e Energia, através da Portaria 737/GM/MME, publicada no DOU de 22/06/23, estabeleceu uma consulta pública para definir as “diretrizes para as concessões de distribuição de energia elétrica com vencimentos entre 2025 à 2031”, Coelba inclusa. As informações, contidas na NT (nota técnica) 014 do SAER/SE (Subsecretaria de Assuntos Econômicos e Regulatórios) trazem uma proposta sobre o que deve ou não mudar nos atuais contratos de concessão. A surpresa ficou por conta do prazo para sugestões de apenas 30 (trinta) dias, para discutir um contrato feito há 30 anos e, se prorrogado, vai vigorar por mais 30. Apesar da missão quase impossível, foram recebidas 67 manifestações sobre o assunto, mas NENHUMA delas de qualquer entidade da Bahia. Como um assunto de suma importância na vida e economia de 14,1 milhões de habitantes e 6,6 milhões de consumidores baianos, nada têm a falar sobre o contrato de concessão para distribuição de energia no estado?
A distribuidora de energia elétrica é o agente mais capilar do mercado, chega cada dia mais a todos, portanto deve desempenhar um novo papel nos próximos anos. Um papel que reflita isenção diante de novos negócios com energia elétrica, a exemplo da geração descentralizada, ambientalmente sustentável por fontes renováveis; das ações para redução de gastos e ganhos de eficiência; da aplicação das novas tecnologias disruptivas que surgem à velocidade de um piscar de olhos; do uso das microrredes inteligentes de pequeno porte; das usinas virtuais despacháveis; da medição inteligente; dos veículos elétricos etc. Como construir uma equação financeira que permita o equilíbrio econômico-financeiro do agente de prestação dos serviços, assegurando os compromissos, garantindo bom atendimento e os benefícios para a sociedade, sem aumento das tarifas de energia? Como saber se isso é possível sem fazer uma concorrência pública, junto ao mercado? Um novo modelo de contrato é necessário levando em conta toda evolução, tendências do mercado de energia e da experiência advinda das PPP-Parcerias Público Privadas, instituída pela Lei 11.079/2004, sobretudo no que diz respeito a fiscalização dos serviços. É vital a participação das instituições representativas dos diversos setores da economia, Federações, Associações, Conselhos, Academia e outros agentes da Bahia e do Brasil, nessa discussão, hoje restrita a Brasília. Buscando um paralelo de fácil compreensão, é como prorrogar um contrato feito há 30 anos para contratar comunicação através de telefonia discada, sem considerar as evoluções tecnológicas e sem submeter ao mercado uma cotação dos custos dos serviços numa nova concorrência pública. No jargão popular, “jabuti não sobe em árvore, se está lá, foi mão de gente ou água de enchente”. Neste caso, o jabuti subiu no poste!
*Engenheiro eletricista, especialista em Gestão e Comercialização de Energia Elétrica