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Uma ameaça na energia do sol

Publicado sexta-feira, 01 de julho de 2022 às 06:00 h | Atualizado em 01/07/2022, 11:45 | Autor: Luiz Carlos Lima* | [email protected]
Imagem ilustrativa da imagem Uma ameaça na energia do sol
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A principal característica da vida é a contínua circulação de energia. Em qualquer das formas que se manifeste, está sempre em transformação, migrando de uma condição a outra num movimento ininterrupto e infinito. O Sol, nossa fonte primária de energia, é o manancial da vida no planeta terra. Seus raios de luz e seu calor se transformam em energia química através da fotossíntese e promovem o alimento. Se transformando em calor, traz os ventos e as chuvas, que suprem a lavoura e permitem o clima ameno para existência neste mundo que habitamos.

Toda essa harmonia em movimento não pode ser interrompida, pois provoca a morte. Quando a água estagna, apodrece. Quando o fruto não se transforma em alimento, estraga. Quando o homem para, adoece e se aproxima do fim. Quando os processos evolutivos da humanidade não fluem, a sociedade padece e todos sofrem.

Precisamos estar atentos e combativos aos agentes da estagnação da energia evolutiva do planeta. Esse tipo de ação nociva ao movimento se apresenta de diversas formas. Nos dias atuais, aqui no Brasil, o setor de energia renovável, especificamente com uso da fonte solar fotovoltaica através da geração distribuída, sofre um ataque desses agentes contra a livre circulação de energia.

Os grandes grupos econômicos ligados às distribuidoras de energia estão buscando interromper, ou pelo menos dificultando ao máximo, os trâmites de acesso à geração da própria energia pelos consumidores. A Lei 14.300, promulgada em janeiro de 2022, que regula as premissas da geração distribuída, estabeleceu um prazo de um ano para assegurar o não pagamento do uso do fio aos que protocolarem seus pedidos de acesso até a data limite de 6 de janeiro de 2023. Por razões óbvias, os processos de liberação dos acessos passaram a um movimento de “operação tartaruga”.

Prazos não atendidos e, quando o são, em sua maioria saem com reprovações através de justificativas absurdas, muitas vezes no último dia do prazo regulamentar. Artimanhas para postergação dos processos são sinais inequívocos da ação de um agente passional atuando como gestor de algo que não atende aos seus interesses. É o paradoxo de um sistema equivocado, onde o responsável pela conexão da rede, operação e manutenção delas é o mesmo ente que fornece o produto que ali vai ser vendido, e possui filiais concorrentes aos que pedem acesso ao mercado.

União dos pequenos 

Num paralelo compreensível, imagine João, dono de uma farmácia que deseja se instalar no único centro comercial da cidade, cujo proprietário é também dono de uma farmácia concorrente. Óbvio que João vai enfrentar todas as dificuldades possíveis para viabilizar o funcionamento de seu negócio.

 Assim estamos no setor de energia. A distribuidora é a dona do centro comercial e dona da farmácia que já está por lá. Tudo isso acontecendo, e o poder concedente nada ou pouco opina sobre a situação. Nessa guerra do pequeno David com Golias, a união dos pequenos é a grande arma. Nesse sentido, no último dia 22 de junho, a Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara de Deputados se reuniu pela primeira vez para colocar um olhar no assunto. Foram quase oito horas de debates, com a presença de parlamentares, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), dos representantes das distribuidoras de energia e das associações que representam as pequenas empresas do setor, tais como a Associação Brasileira de Geração Distribuída (ABGD), Associação Baiana de Energia Solar (ABS), Associação Brasileira de Energia Solar (Absolar), e outras. 

Um belo festival de apresentações pelas distribuidoras sobre uma realidade suíça, num subúrbio de favela no Brasil, contrastando com a apresentação de diversos exemplos do mau atendimento, ou mesmo de erros grosseiros por parte delas.

 Ao final da reunião, tanto a Aneel quanto a Comissão de Defesa do Consumidor engrossaram o tom e prometeram aumentar a fiscalização nos processos. Vamos esperar para ver, afinal o modelo brasileiro permite que os grupos econômicos, que detêm o controle da distribuição de energia no Brasil sejam também os donos de empresas de geração distribuída concorrentes. 

O cenário não está fácil para os empresários independentes que procuram um lugar ao sol. Onde está o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça, responsável por fiscalizar esses abusos do poder monopolista querendo interromper a energia do Sol ?

*Engenheiro eletricista, especialista em Gestão e Comercialização de Energia Elétrica

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