Campanha busca coibir tutores que jogam cães e gatos nas ruas
Abandono aumenta em dezembro e impacta abrigos
Mês em que o “espírito natalino” aflora, dezembro deveria ser a época em que humanos exercem compaixão para com os animais. Só que não. Na contramão do discurso preconizado pelas máximas cristãs, justo neste período é quando os abrigos ficam repletos de casos de abandono dos mais cruéis. Com a chegada do período de férias, cães e gatos costumam ser deixados para trás. Por conta disto, todos os anos, acontece a campanha Dezembro Verde, que luta pela conscientização contra o abandono dos animais.
A intenção é tentar pelo menos amenizar a prática perversa que, muitas vezes, inclui requintes de crueldade: animais acorrentados sob o sol e chuva, sem água nem comida, jogados ao lixo, atirados ao mar e até atropelados e mutilados. No Brasil, o abandono de animais é crime desde 1998, de acordo com a Lei 9.605/98. Em 2020, com a aprovação da Lei Federal 14.064/20, o guardião identificado pode ter pena de até cinco anos de prisão. Contudo, a legislação é insuficiente para conter o problema.
“Os abandonos ocorrem pela ausência de responsabilidade em todas as épocas do ano, com as mais variadas justificativas: crise econômica, desemprego, separação, gestação, mudança de imóvel, de país, viagem, o animal cresceu, adoeceu, problemas comportamentais, dentre outras, criando-se uma cultura de que os abandonos nessa época do ano se ampliam”, explica Ludmila dos Prazeres Costa, 47 anos, vice presidente da REMCA (Rede de Mobilização pela Causa Aninal) e membro da Comissão Especial de Direito Animal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-BA). Socióloga, professora universitária e advogada especialista em Direito Animal, Ludmila chama a atenção para a necessidade uma ação integrada com a participação efetiva da sociedade civil e poder público..
“A diretoria vai ampliar, agora em janeiro, o programa de castrações mensais e o ‘Rações para quem mais precisa’”, explica a diretora de proteção animal do municipio de Salvador, Michele Holanda.
“Recebo no meu instagram @marina.adota diariamente de 9 a 11 pessoas dizendo para eu ir ‘buscar’ senão vão jogar na rua”, conta a empresária Marina Di Domizio Guimarães para quem falta consciência das pessoas ao decidirem ter um animal em casa. Atualmente, ela abriga 140 cães e mantém em lar temporário mais de 200. Com o espaço cada vez menor para os bichinhos, ela está preparando a transferência para outro imóvel, num local reformado e pensado para os animais. A obra está sendo financiada por recursos próprios e o apoio da família e amigos. Obstinada pela causa animal, Marina arca com o custo de alimentaçâo e remédios, funcionários e a manutenção do espaço.
“Não existe convênio para abrigamento para controle populacional de animais de rua, a realidade não vai mudar até que o poder público passe a atuar na base do problema que é educação [dos humanos] e castração em massa [dos animais]”, afirma Patruska Barreiro, 46 anos, que mantém 150 animais sob a tutela do instituto que leva seu nome (@institutopatruska). A Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) dá suporte a mais de 400 animais.
Abrigos em crise
O aumento do abandono, além de ser um caso de saúde pública, agrava um outro aspecto da questão: a dificuldade de sobrevivência dos abrigos, todos lotados, muitos em colapso financeiro porque vivem apenas de doações. Este é o caso do Abrigo São Francisco de Assis, mantido pela Associação Brasileira de Proteção Animal (ABPA-BA), organização fundada em 1939, que acumula uma dívida de R$ 87 mil. Com 9 funcionários e uma despesa mensal de mais de R$ 60 mil, a ONG não conseguiu pagar o 13º dos colaboradores. O espaço atualmente abriga 189 cães e 200 gatos. “A situação atual é de superlotação, por conta da estrutura física do local, falta de espaço adequado e canis interditados por perigo de desabamento ou inundação”, explica a presidente da entidade, a advogada Cristina Della-Cella.
A situação de dificuldade se repete no Abrigo Doce Lar (@docelar10), fundado pela administradora Constança Costa, 48 anos. “A dificuldade financeira que nos acompanha durante todo o ano fica ainda mais contundente neste período por conta do abandono”, explica ela. No mês passado, foram 28 animais abandonados na porta da instituição, sendo 15 deles filhotes caninos de uma só vez. Na primeira quinzena de dezembro já foram oito animais. Atualmente o espaço abriga 400 animais, incluindo, além de cães e gatos, porcos, cavalos e ovelhas que representam um custo mensal de R$ 95 mil. Segundo ela, deste montante, R$ 75 mil sao financiados pelo Hotel e Lar Temporário Doce Lar Pets. “Então fazemos rifas vendemos artigos em nossa lojinha e fazemos campanhas de ajuda”, afirma. O espaço possui 8 funcionários, além de 15 diaristas.