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Pedro Menezes

Por Pedro Menezes*

ACERVO DA COLUNA
Publicado quarta-feira, 08 de janeiro de 2025 às 15:26 h • Atualizada em 08/01/2025 às 17:39 | Autor: Pedro Menezes

Precisamos de mais filmes sobre a ditadura

Obras sobre o período da ditadura militar revelam um Brasil que ainda luta para encarar seu passado

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Imagem ilustrativa da imagem Precisamos de mais filmes sobre a ditadura
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Entre 2009 e 2024, a Academia Brasileira de Cinema indicou zero filmes sobre a ditadura para representar nosso país no Oscar. “Ainda Estou Aqui” quebrou um tabu que durava desde “O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias” em 2008.

Nesse mesmo período, a Argentina conquistou dois prêmios que o cinema brasileiro nunca teve: “O Segredos de Seus Olhos” levou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2010 e “Argentina, 1985” venceu o Globo de Ouro na mesma categoria em 2023. Ambos são sobre a ditadura argentina.

Enquanto evitava a ditadura, a Academia Brasileira de Cinema insistiu noutros temas. É fácil adivinhar qual foi o mais frequente. Não sei onde você está lendo esse texto, mas acho que não é no meio da rua. Se for, guarde o celular, por favor.

Não foi só a segurança pública que apareceu mais de uma vez. Relações familiares e dilemas da juventude vem logo a seguir como temas mais frequentes. A lista brasileira ainda tem dois filmes sobre palhaços e outro sobre circo, assim como um documentário sobre um cinema e outro sobre um cineasta.

Nos 45 anos que se passaram desde 1980, apenas três filmes sobre a ditadura estiveram na lista anual da Academia Brasileira de Cinema: além dos dois já citados, o terceiro foi “O Que é Isso, Companheiro?”, em 1998. Que o leitor me perdoe pela informação, mas nesse período a Argentina também ganhou o Oscar de 1986 com “A História Oficial”, outro filme sobre ditadura.

Não são só os argentinos que alcançam algum sucesso internacional com esse tipo de filme. “O que é Isso, Companheiro?” chegou à lista final do Oscar, “O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias” foi indicado ao Urso de Ouro em Berlim e “Ainda Estou Aqui” enche o Brasil de orgulho no presente. Esse três filmes tiveram um custo de produção menor que a receita de bilheteria. Foram sucessos bem acima da média, tanto no público quanto na crítica, tanto no Brasil quanto no exterior.

Desconfio do que o leitor de direita está pensando nesta fase do texto. Revoltado com o questionamento do seu querido chavão, este leitor talvez se lembre de outros filmes sobre a ditadura. É claro que existem outros exemplos, mas será que justificam o discurso de que produzimos filmes demais sobre a ditadura?

Quando olhamos para a lista de indicados às grandes premiações nacionais, vemos “Marighella” (2022) e alguns outros, mas a conclusão se mantém. Relativamente poucos filmes sobre a ditadura aparecem na lista. Outros temas são bem mais frequentes.

É natural que a ditadura militar apareça em alguns filmes brasileiros. Um quarto de século separa o golpe e a eleição de 1989. Além de longo, foi um período crucial na formação do Brasil. O legado da ditadura está por aí até hoje. Se está na realidade, é natural que esteja também no imaginário e nas produções culturais.

O incômodo com filmes sobre a ditadura provavelmente tem outra explicação. Desde 1964, a direita brasileira interdita qualquer debate sobre o seu período mais sombrio. “Ainda Estou Aqui” tem entre seus méritos o retrato das deslavadas mentiras contadas pelos militares, que até hoje negam as violações de direitos humanos e até mesmo o caráter autoritário do regime.

O problema é da direita brasileira, e não do cinema brasileiro. Filmes sobre a ditadura gera um siricutico danado em quem gostaria de esquecer o tema. A polêmica remete a uma das cenas mais impactantes do último filme de Walter Salles.

Nela, um jornalista pergunta a Eunice Paiva se o governo brasileiro não teria prioridades mais urgentes do que o passado. A personagem Fernanda Torres responde com apenas uma palavra: “não”.

É uma resposta profunda. A ditadura brasileira restringiu o acesso à educação básica porque matou Rubens Paivas . Temos um grande passado pela frente e precisamos de mais filmes sobre a ditadura.

Aos incomodados, cabe uma reflexão. A ditadura não se faz presente por culpa dos cineastas. Se quiserem que a importância do período diminua, seria mais efetivo parar de apoiar as velhas mentiras dos novos golpistas.

*Pedro Menezes é analista político do Grupo A TARDE

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