ICONOGRAFIA ESPIRITUAL
Bahia como nunca se viu: obras raras de Mario Cravo Neto voltam aos holofotes
CAIXA Cultural exibe lado menos conhecido de Mario Cravo Neto com obras nunca vistas
Por Eugênio Afonso

Nome fundamental para a construção da identidade imagética da Bahia, um dos mais renomados fotógrafos baianos volta aos holofotes soteropolitanos através da exposição Mario Cravo Neto: Sob o Sol da Bahia.
Com curadoria do também fotógrafo – e filho de Mario –, Christian Cravo, a mostra, que reúne fotografias, objetos, vídeos, desenhos e pinturas em aquarela tem abertura hoje, às 19h, na CAIXA Cultural, com visitação aberta ao público a partir de amanhã.
Christian conta que o propósito é revelar o período experimental de Cravo Neto, antes de sua consagração internacional, destacando sua intensa fase de experimentação artística e formação de linguagem própria.
“A mostra busca também reafirmá-lo na história da arte brasileira como um artista plural, que tensiona fronteiras entre documental e mítico, gesto e rito, entre a Bahia arquetípica e a subjetividade de um corpo em transformação”, destaca o curador.
Em cartaz até 2 de novembro de 2025, a exposição oferece ao público uma imersão na Bahia das décadas de 1960 e 1970, revelando um tempo e uma atmosfera que já não existem na contemporaneidade.

Mario Cravo Neto: Sob o Sol da Bahia apresenta um recorte da obra do fotógrafo entre 1967 e 1975. Uma fase marcada por intensa produção artística e encerrada por uma fatalidade que redefiniu sua trajetória – Mario sofreu um acidente de carro, em 1975, que o imobilizou parcialmente por um ano.
A partir daí, o artista passou a desenvolver uma técnica de retratos em estúdio com fundo branco — marco de sua projeção internacional e de sua ruptura com a sombra artística do pai, o escultor Mario Cravo Júnior.
“Esse recorte mostra os anos formativos e experimentais de Cravo Neto, um período marcado por descobertas, influências internacionais, colapsos pessoais e a busca por uma linguagem própria”, ressalta o curador.
“Foi nesse tempo que ele escolheu a fotografia como principal meio e consolidou temas e técnicas que moldariam sua produção futura. O recorte também busca destacar um lado menos conhecido de sua trajetória artística”, complementa.
Peças raras

Ao todo, o público vai se deparar, dentre outros trabalhos, com 40 fotografias coloridas e em preto e branco, que retratam pescadores, estivadores, plantações de tabaco e representações afrodescendentes em Salvador e no Recôncavo Baiano.
“São desenhos, pinturas, fotografias e colagens pouco ou nunca vistas, desvelando os caminhos técnicos, poéticos e, acima de tudo, experimentais que precederam uma produção mais emblemática, focada no imaginário afro-atlântico”, detalha o curador.
Dividida em quatro núcleos (fotografia, película em movimento, escultura e pintura), a mostra oferece uma leitura transversal da produção do artista, destacando seu processo criativo, influências e experimentações com cor, forma e espiritualidade.
Tem ainda as aquarelas que evocam o movimento das ondas do mar, enquanto os filmes em oito milímetros exploram o corpo em três diferentes dimensões: a dança, o trauma e o nascimento da filha. As obras serão exibidas em um projeto expográfico que integra vídeos, objetos e gravuras.
“Nem tudo é inédito, mas grande parte da exposição apresenta obras pouco ou nunca vistas. Portanto, há uma predominância de material raro e pouco acessado pelo público anteriormente. Como recorte do período, é a primeira vez que este conjunto é apresentado”, informa o curador.
Novo patamar

Christian lembra que Cravo Neto foi um artista baiano de grande relevância, especialmente na fotografia, onde construiu uma linguagem própria, profundamente ligada à espiritualidade afro-brasileira, ao corpo e ao território baiano.
“Ele elevou a fotografia a um novo patamar nas artes visuais brasileiras e influenciou gerações de artistas, tornando-se referência para a arte baiana e nacional”, salienta o filho.
Para ele, o legado de Cravo Neto é o de uma produção artística que atravessa linguagens (fotografia, escultura, pintura, cinema) e que dialoga com questões como identidade, espiritualidade, corpo, natureza e a cultura afro-brasileira.
“Ele deixou uma obra poética, complexa e intensa, que continua sendo estudada, preservada e difundida pelo Instituto Mário Cravo Neto. Hoje, o instituto preserva e difunde seu legado artístico em parceria com o IMS (Instituto Moreira Salles). Vale ressaltar que o propósito atual é o de colocar luz em fases e aspectos menos conhecidos de sua trajetória artística”, exalta o curador.
Ainda segundo Christian, o multiartista via a dignidade cotidiana do povo baiano com profundo respeito. “Ele fotografava pescadores, estivadores, plantações e corpos negros com uma abordagem poética e simbólica, buscando uma iconografia própria que captasse a potência espiritual e estética da Bahia”, finaliza.

Como parte do projeto, estão previstas também uma visita mediada com o curador (02.8), uma oficina de introdução à fotografia com Rafael Martins (09.8) e, no dia 28 de agosto, um bate-papo com Christian Cravo e o artivista Bené Fonteles.
Toda a programação é gratuita e pode ser conhecida no Instagram @exposicaomariocravoneto.
Realizada pela Via Press, a mostra integra a programação comemorativa dos 45 anos da CAIXA Cultural no Brasil e dos 25 anos em Salvador. O patrocínio é da própria CAIXA e do Governo Federal, com apoio institucional do Instituto Mario Cravo Neto.
Exposição ‘Mario Cravo Neto: Sob o Sol da Bahia’ / A partir de amanhã até 02 de novembro / Visitação: terça-feira a domingo, das 9h às 17h30 / CAIXA cultural (Rua Carlos Gomes, 57, Centro) / Gratuito
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