ESPLENDOR BLACK
Com atrações internacionais, ‘Afropunk’ é no fim de semana
‘Afropunk’ será realizado no Parque de Exposições
Por Maria Raquel Brito*
A ancestralidade e o afrofuturismo se encontram mais uma vez no Parque de Exposições de Salvador neste próximo fim de semana. A quarta edição do Afropunk Brasil, que acontece sábado (09) e domingo (10), vai elevar a versão brasileira do festival a um novo patamar: nos dois dias, se apresentarão traz nomes como a rainha do neo-soul Erykah Badu, a sofisticada Lianne La Havas e o mais belo dos belos, o quinquagenário Ilê Aiyê.
Consolidado como o maior festival de cultura negra do mundo, o Afropunk encontrou o lar perfeito em Salvador, cidade mais negra fora do continente africano. No quarto ano, chega para uma edição plural em sonoridades e vozes, com duas atrações internacionais e apresentações dos mais variados gêneros musicais ao longo dos dois dias.
No sábado, por exemplo, o soul mesclado com jazz e hip-hop de Badu se encontra com ritmos como o samba de Jorge Aragão, o pagodão de Léo Santana e o rap rock do Planet Hemp. Além deles, se apresentam no primeiro dia Duquesa, Melly, Ilê Aiyê (que convida Virginia Rodrigues), e Irmãs de Pau e Evylin.
Já no domingo, a voz aveludada de Lianne La Havas ecoará ao vivo em Salvador pela primeira vez. O soul contemporâneo da artista britânica se unirá no palco com a potência de Liniker, sua convidada, e ao longo da noite o público presenciará também performances de Ebony, Mateus Fazeno Rock, Silvanno Salles, Timbalada, Fat Family (cantando Tim Maia), e Larissa Luz, que dividirá o palco com Edcity.
As 15 atrações desta edição serão dispostas entre os palcos Agô e Gira. A escolha dos nomes reflete o empenho do festival em resgatar as heranças africanas em todos os detalhes. Enquanto “Agô” vem do iorubá e é um pedido de licença para movimentos de passagem, remetendo à abertura de espaço e visibilidade para quem chega ao mundo da música, a “Gira” é, na Umbanda e no Candomblé, o ritual de contato com os orixás, simbolizando o encontro entre gerações.
Os palcos, que têm no total 100m de largura e 15,60m de altura, têm como temas inspiradores em 2024 as realezas africanas, os templos iorubás, a ancestralidade e a religiosidade afro-brasileira.
Depois de se apresentar no país outras quatro vezes, Erykah Badu já está familiarizada ao Brasil. Desembarca pela primeira vez, porém, em Salvador. Será como voltar para casa: em agosto, foi headliner do Afropunk Blktopia, no Brooklyn, Estados Unidos, em que fechou os dois dias de festival com shows viscerais. Com uma potência que atravessa gerações, ela trará agora toda a sua energia e sucessos para o palco do Afropunk Brasil.
Outra estreante em solo baiano é a britânica Lianne La Havas, cuja conexão com o Brasil vai além das outras duas vezes em que performou no país: lançou recentemente a canção Saudade dos aviões da Panair (Conversando no Bar), em parceria com o gigante Milton Nascimento. Com participação de Liniker, sua apresentação no segundo dia do Afropunk promete hipnotizar o público.
Além das atrações internacionais, grandes nomes de todo o Brasil levarão sucessos para o palco do festival. Um deles é Jorge Aragão, um dos maiores nomes do samba no Brasil. Sempre que pisa em Salvador, ele tem vontade de colocar uma bermuda e um chinelo e caminhar pela cidade, conhecendo e curtindo.
Volta sempre que pode: em abril, se apresentou no Museu de Arte Moderna da Bahia, e agora retorna à capital baiana para cantar e encantar no Afropunk.
“Prestigiados são aqueles que usam a arte como luta. O Afropunk foi trazido para o Brasil e é hoje um dos mais importantes festivais do país. Isso me deixa muito feliz, porque precisamos de mais representações negras nos grandes eventos, como protagonistas e até mesmo no poder. E não de um monte de gente branca dizendo que entende as mazelas pelas quais passamos. Eles não passaram por essa experiência de ser negro”, defende.
Aragão, que se recuperou no ano passado de um câncer que afetou seu sistema linfático, voltou com tudo aos palcos. Começou este ano o projeto Sambazin de Jorge, que levará o samba raiz Brasil afora e também para outros países.
“Essa é uma fase cheia de projetos, turnê nova, 50 anos de carreira. E eu quero tudo! Quero aproveitar tudo mesmo, então as expectativas são as melhores possíveis. Eu e minha equipe estamos preparando tudo com muito carinho para ser um show muito especial. Tocarei meus principais sucessos, levando samba para quem gosta”, antecipa sobre a turnê, que deve desembarcar em Salvador em agosto de 2025.
Independente do mês, festa em Salvador tem gosto de Carnaval. E Léo Santana confirmará isso no sábado, levando todo o seu ritmo para o palco. Pela primeira vez no festival, o gigante baiano preparou um show com repertório exclusivo, figurino e ballet especialmente escolhidos para o Afropunk.
“Poder ser um dos representantes nesse festival tão grandioso e de uma representatividade ímpar é mais do que uma honra para mim. Eu sempre digo que toda forma de exaltar a cultura, seja ela qual for, é muito importante, em especial quando se fala de música e de dança que leva alegria às pessoas e muda a vida de tanta gente”, celebra
“Que mais festivais, empresários, instituições e produtoras continuem a enaltecer e valorizar cada vez mais a nossa cultura, que desde os nossos ancestrais é tão rica, envolvente e que tem tanta coisa boa para mostrar e ensinar”, declarou Léo.
Pluralidade sonora
A escolha dos nomes que comandarão os palcos do festival são sempre minuciosas, e levam em consideração, sobretudo, a mistura de gerações e gêneros musicais, com o objetivo de celebrar a música negra na sua mais bonita diversidade. É o que conta Haloá Sousa, executiva de Negócios da IDW, agência responsável pela realização do Afropunk no Brasil.
“O Brasil já era a segunda maior audiência dos canais globais do Afropunk, então já existia aqui uma demanda, uma comunidade que aguardava por este espaço. Quando a plataforma chega no Brasil, e especialmente em Salvador, há a junção das referências que as pessoas tinham do evento em Nova Iorque com o tempero da nossa cultura (...). Então, mesmo sendo um evento que nasce fora do país, ao aterrissar aqui entendemos que a nossa cultura precisava estar presente e ser celebrada. Acho que isso, desde o começo, ajudou o público a se identificar com a marca”, reflete.
Tem dado certo: em 2023, o Afropunk reuniu cerca de 50 mil pessoas nos dois dias. Para este ano, a expectativa dos organizadores é que o número cresça ainda mais.
A popularidade é tanta que o festival tem agora o Afropunk Experience, que leva a outros pontos do Brasil a chance de sentir um gostinho de uma das maiores rodas afro-diaspóricas do mundo. Em setembro, o evento aconteceu em Belém, no Pará, com shows de artistas como Dona Onete, Olodum e Black Alien. Em dezembro, desembarca em São Paulo, tendo com uma line-up formada por Rachel Reis, Amaarae, Doechii, Anelis Assumpção e Yago Oproprio.
Espetáculo à parte
Ano após ano, o público espera ansiosamente o anúncio das datas do Afropunk. E não são poucas as pessoas que garantem os ingressos antes mesmo da confirmação das atrações: não só confiam na curadoria, mas sabem que o festival, hoje, vai além da música. Superproduções, das roupas aos cabelos e unhas, são um espetáculo à parte.
A estudante Suyane Freire, de 21 anos, sabe bem disso. Natural de Petrolina, em Pernambuco, ela mora em Salvador há três anos e, desde então, não perde uma edição do Afropunk. Os preparativos começam meses antes, com a pesquisa por inspirações de ‘looks’, maquiagem e a decisão de como usar os cabelos.
“Um festival assim era fora da realidade para mim quando eu não morava em Salvador. E o que eu acho mais legal é que é uma celebração de todo tipo de música negra, de Erykah Badu a Silvanno Salles. É a possibilidade de conhecer mais sobre a cultura negra e também se expressar através dos looks, como ficam empolgadas em se produzir”, afirma.
Este ano, ela espera especialmente duas atrações: Erykah Badu e Duquesa. “Ver Erykah não é uma chance que a gente tem sempre. Ela é muito conceituada, e vai ser interessante ver como a influência dela na moda vai estar presente. E o álbum que a Duquesa lançou este ano, Taurus, Vol. 2, está perfeito, então estou ansiosa para vê-la ao vivo na ascensão dela”, diz.
Já Haloá defende que “Salvador e o Afropunk têm uma relação quase simbiótica”, dada a vocação da cidade para abrigar tantas expressões de ancestralidade. “O festival ter se estabelecido como um palco para a expressão da ancestralidade através da moda é uma evidência da força do Afropunk enquanto marca em Salvador. É esse abraço do público, com pessoas saindo de todo o Brasil para participar da celebração, que torna um evento dessa magnitude fora do Sudeste seja possível hoje”, afirma.
“Podemos levar esta experiência para outras cidades, como fizemos em Belém, que foi incrível, e faremos, em seguida, em São Paulo. Mas a forma que se vive o Afropunk, só temos aqui. Nosso objetivo é que Salvador continue recebendo esta grande celebração não só pelas razões identitárias, mas porque sabemos do impacto econômico para a cidade, sobretudo quando falamos em economia criativa, micro empreendedores da beleza e moda. A gente insiste em fazer esta roda girar. Salvador é potência criativa e econômica, e merece iniciativas como esta e muitas outras”, conclui.
Festival AFROPUNK Brasil / Sábado (09) e domingo (10), 16h / Parque de Exposições de Salvador (Av. Luís Viana Filho, 1590 - Itapuã) / Ingressos entre R$ 85 e R$ 608 / Vendas: Sympla / Classificação: 14 anos
*Sob supervisão do editor Chico Castro Jr.
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