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DANÇA

Ateliê de Coreógrafos Baianos lança espetáculo sobre Carybé

Por Eduarda Uzêda

06/04/2021 - 6:04 h
O espetáculo Memória das Águas, de João Perene, dialoga com o universo profano, alegre e sedutor das obras de Carybé | Foto: Marcley Oliveira | Divulgação
O espetáculo Memória das Águas, de João Perene, dialoga com o universo profano, alegre e sedutor das obras de Carybé | Foto: Marcley Oliveira | Divulgação -

O universo do artista visual Carybé (1911-1949) que foi pintor, gravador, desenhista, ilustrador, mosaicista, ceramista, entalhador e muralista, entre outras especialidades, é o tema de espetáculo que inaugura o projeto Ateliê de Coreógrafos Baianos, inspirado no Ateliê de Coreógrafos Brasileiros, uma das maiores iniciativas de dança no Brasil e palco de vários talentos.

Trata-se da montagem Carybé em 3 Linhas, uma proposta coreográfica que se desdobra em três atos: Depois, o Tempo que não Existe, de Jorge Silva, que será apresentado sexta-feira, 9, às 20h, além de Memória das Águas, de João Perene, e Xirê de Mulheres, de Edileuza Santos, que serão apresentados sábado, 10, às 20 horas.

E mais: todos os espetáculos que integram o Carybé em Três Linhas serão apresentado gratuitamente, e de forma virtual, no Instagram pelo link instagram.com/ateliedecoreografosba ou no canal de YouTube da iniciativa.

Os dois projetos têm concepção e direção artística da bailarina, produtora e gestora cultural Eliana Pedroso, que adianta mais uma novidade: “Sexta-feira (dia 9), às 20h, também acontece o lançamento do catálogo Traços da Memória da Dança Contemporânea em Salvador – 2000 a 2010”.

Eliana Pedroso, que integrou o corpo do Balé Teatro Castro Alves e o lendário Balé Brasileiro da Bahia, escreveu seu nome no cenário da dança baiana e brasileira com o Ateliê de Coreógrafos Brasileiros. Projeto inovador, além de apresentar espetáculos de alto nível, contemplava a experimentação, a residência, a exibição de vídeos, os workshops, as mesas-redondas e as palestras. Os profissionais escolhidos por audição eram desafiados a escolher a trilha sonora do espetáculo, projeto de luz, cenografia, figurinos e elenco.

Bico de pena

E como a ideia do Ateliê de Coreógrafos Baianos foi gestada? Eliana mergulha nas suas memórias e conta que, “Na década de 1980, o governo federal criou um projeto com o Balé Brasileiro da Bahia e o Balé do Teatro Municipal do Rio de Janeiro para duas leituras da obra Quincas Berro d'Água, de Jorge Amado. No caso do Balé Brasileiro, do qual eu fazia parte, quem desenhou o figurino e o cenário para a coreografia foi Carybé”.

A coreógrafa conta que guarda os croquis feitos à bico de pena até hoje – e enfatiza que este espetáculo, que tinha direção de Carlos Moraes, foi muito importante para sua carreira.

“Para a criação do espetáculo Carybé em 3 Linhas, busquei três coreógrafos baianos com identidades coreográficas diversificadas. Eles ficaram livres para escolher as obras de Carybé nas quais queriam inspirar seus espetáculos”, diz.

O coreógrafo Jorge Silva, que assina a criação e a concepção do espetáculo Depois, o Tempo que não Existe, afirma que se inspirou em uma escultura talhada em madeira de Exu, o orixá da comunicação.

Silva, que traz no espetáculo os dançarinos Erick Luz, Raynara Sanches, Marcus Santos e Andreza Bastos, entrega que a estrutura coreográfica remete a uma encruzilhada – a qual faz uma alusão aos diversos caminhos percorridos pelo orixá. “Trabalhamos com alguns arquétipos de Exu e sinalizamos caminhos percorridos e sinalizados por ele que às vezes deixamos de seguir, simplesmente porque estamos sempre adiando as coisas”, reflete.

Como Exu traz duas cores, o vermelho e o negro, Jorge Silva trabalha a dualidade, a exemplo de vida e morte na mesma cena.

Já João Perene, que assina Memória das Águas, afirma que os quadros de Carybé O Sol, Na Praia, A tentação de Antônio, Roda de Samba e Na Lagoa serviram de inspiração para a construção do roteiro coreográfico de sua obra.

Imagem ilustrativa da imagem Ateliê de Coreógrafos Baianos lança espetáculo sobre Carybé
Depois, o Tempo que não Existe, de Jorge Silva, trabalha a dualidade de Exu com arquétipos do orixá da comunicação e do movimento | Foto: Divulgação

Profano e louvação

Ele lembra, bem como Eliana Pedroso, que nas pinturas e desenhos de Carybé, o movimento está sempre presente.

Perene, que tem como dançarinos Marcley Oliveira, Bárbara Barbará, Preta Kuiran, Marcela Botelho e Rana Moura, chama atenção para o fato de que, ao contrário dos outros coreógrafos de Carybé em Três Linhas que se voltaram para os orixás, ele trabalha com o profano, “com a alegria e a sedução do povo baiano”.

A coreógrafa Edileuza Santos, na sua coreografia ritualística Xirê de Mulheres, afirma que se preocupa sempre em construir um pensamento político.

“Xirê”, ela explica, significa cantar, tocar, louvar os ancestrais, acrescentando que trabalha com corpos maduros, “o que traz um percurso de experiências”.

Edileuza, que traz para sua coreografia os dançarinos Agatha Oliveira, Lorena Oliveira, Maria Ceiça, Sissi de Melo e Tariana Costa, afirma que “tenta estabelecer um diálogo entre a obra de Carybé e a diáspora africana para anunciar um futuro em que as mulheres tenham potencial para construir uma sociedade nova e diversa, embalada na ancestralidade negra”.

A publicação Traços da Memória da Dança Contemporânea em Salvador – 2000 a 2010 se propõe a registar os principais movimentos da dança contemporânea na cidade de Salvador neste período de 10 anos, preservar a memória e servir como fonte de pesquisa e inspiração para as novas gerações.

Eliana Pedroso destaca que um dos principais objetivos é preencher uma grande lacuna na bibliografia da linguagem da dança local.

Carybé nasceu na Argentina. Logo no início de 1950 se estabeleceu na capital baiana, onde viveu até sua morte, em 1997, aos 86 anos.

Durante os quase 50 anos em que viveu na Bahia, Carybé desenvolveu uma profunda relação com a cultura e com os artistas de Salvador. Torna-se Obá de Xangô, um dos mais importantes cargos do terreiro do Ilê Axé Opô Afonjá, da falecida Mãe Stella.

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