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09/04/2021 às 6:05 - há XX semanas | Autor: Chico Castro Jr.

LITERATURA

Coletânea de críticas de João Carlos Sampaio é lançada nesta sexta-feira

O jovem crítico de cinema de A TARDE morreu em 2014 | Foto: Agnes Cajaiba | Divulgação
O jovem crítico de cinema de A TARDE morreu em 2014 | Foto: Agnes Cajaiba | Divulgação -

Telefone tocando de madrugada é notícia ruim na certa. Não deu outra na casa deste jornalista na manhã de 2 de maio de 2014. Do outro lado da linha estava o cineasta baiano Lula Oliveira (exatamente o mesmo que aparece na matéria logo abaixo desta). "Chico, João morreu", disse Lula. "Que João, Lula?", respondeu o repórter, ainda sonolento. Esclarecido "que João", coube à esposa deste jornalista a amarga tarefa de informar a ex-mulher de João, já que Lula não tinha contatos da família do então crítico de cinema deste Caderno 2+. Sete anos depois, o livro Pó da estrada: Escritos de João Carlos Sampaio é lançado em uma justa homenagem ao jornalista, crítico de cinema, ser humano de rara generosidade, torcedor apaixonado do Vitória e aratuipense orgulhoso.

O lançamento será numa live que acontece nesta sexta-feira, 9, às 19h, no YouTube da Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema), entidade da qual foi um dos fundadores (youtube.com/abraccine), reunindo dois colegas / amigos de João na Abraccine, Luiz Joaquim (PE) e Marcelo Lyra (SP), mais a equipe baiana que produziu o livro: Flávia Santana e Tais Bichara (organização e produção), João Paulo Barreto e Rafael Carvalho (curadoria de críticas), Lara Perl (coordenação editorial) e Rafa Moo (projeto gráfico).

João Carlos Sampaio foi o principal crítico de cinema de sua geração. Formado no iníciozinho dos anos 1990 pela Facom - Ufba, teve breve passagem pelo extinto jornal Bahia Hoje entre 1993 e 1995. Demitido após uma greve histórica da qual participou, foi imediatamente acolhido pelo jornal A TARDE, no qual escreveu exclusivamente sobre cinema daquele ano em diante até sua morte em 2014. Foi das páginas deste Caderno 2+ que os curadores João Paulo e Rafael pescaram a maioria dos textos do livro, gentilmente cedidos pela direção do jornal.

Naquele momento em que João começou a escrever, os jornais de Salvador só tinham dois críticos de renome, ambos então já considerados veteranos: André Setaro na Tribuna da Bahia e José Augusto Berbert de Castro, aqui mesmo no Caderno 2 do A TARDE. "João começa a escrever sobre cinema num momento de carência de novas vozes críticas na Bahia, de uma visão renovada e jovial para o cinema. Havia os críticos veteranos, de uma tradição antiga, mas a cena crítica aqui era pouco renovada", observa João Paulo Barreto.

"Coincidentemente, a trajetória profissional dele confunde-se com um dos momentos mais revigorantes do cinema brasileiro, com a Retomada e o período de revitalização do cinema nacional, entre o final da década de 1990 e a virada do novo milênio", acrescenta.

Aquela movimentação toda foi como sopa no mel para o jovem crítico, que começou a fazer o que nem André nem José Augusto faziam mais naquela época: viajar pelos festivais, circular pelo metiê do cinema e do jornalismo de cinema como até então nenhum outro crítico baiano conseguiu fazer antes.

"A circulação profissional de João Carlos Sampaio pelos festivais de cinema de todo o país, mais o interesse latente em comentar e dedicar atenção crítica aos filmes brasileiros e baianos que chegavam ao circuito comercial da Bahia, tudo isso permitiu a ele compor uma visão ao mesmo tempo crítica e compreensiva das mudanças e perspectivas do cinema brasileiro e suas rotas de mudança e de ampliação", afirma Rafael Carvalho.

"Isso o coloca num lugar muito especial e importante para se entender a produção contemporânea e a necessidade de continuidade do projeto de incentivo aos filmes brasileiros e ao pensamento crítico", acrescenta.

As andanças de João pelo país e seu trabalho incansável em A TARDE o cacifaram para atuar em outras frentes do cinema, como por exemplo, na curadoria de festivais, como o Cine PE e a Mostra Cinema Conquista, além de integrar comissões de seleção e júris oficiais de eventos importantes, como o Festival de Cinema de Gramado e o Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, além de compor o júri indicativo do filme brasileiro pré-candidato ao Oscar em 2005.

"João era (e consegue ainda ser) um cruzador de caminhos e aglutinador de gente e histórias, mas de ferramentas pouco óbvias. Escrevendo, produzindo, curando ou julgando filmes e projetos, ele sempre transitou com muita facilidade entre gerações e nichos de realização quase como se não houvesse lugares diferentes de onde e para onde transitar. Gosto de pensar nele como uma pessoa que amava os filmes, mas, mais do que isso, amava o cinema", observa Taís Bichara.

"E, por entender cinema como coisa feita por gente e para gente, sempre foi de olhar para todas as “fitas”, como dizia ele, e para as pessoas que construíam elas, com muita generosidade, pescando valor e beleza, e desejando compartilhar isso com mais gente. É também por isso que ele é tão lembrado como um embaixador do cinema baiano fora do país Bahia, e embaixador do cinema de outros cantos no seu próprio estado", acrescenta.

Especial como era João, um sujeito que parecia impermeável ao baixo astral, a coordenação editorial do livro, de Lara Perl (via Editora Gris), caprichou na beleza da editoração, tratando o volume como uma espécie de "diário de viagem" do homeageado, incluindo em meio aos textos trechos de seus escritos em rede social, pequenas observações de João sobre a vida, o cinema, o Brasil, o Vitória e sua amada cidade-natal, Aratuípe, no Recôncavo Baiano.

Não a toa, parte da equipe foi até a cidade, junto com a fotógrafa Hury Ahmadi, registrar os locais preferidos de João e tentar capturar um pouco de sua essência.

"A relação de João com Aratuípe foi central na construção do livro. Encaramos o processo de edição como uma estrada em busca de fragmentos que ele nos deixou e que foi abrindo janelas para outros mundos, como a sua infância, memórias, rotina, amizades, música, futebol e, claro, os próprios filmes. No livro, tudo isso vai aparecendo na parte que chamamos de “Linha de tempo”, uma espécie de diário construído a partir de textos que Tais e Flávia resgatam da sua timeline do Facebook", conta Lara.

"Ali encontramos João em primeira pessoa, comentando os mais diversos assuntos do cotidiano, com seu humor e estilo tão próprios. Visitar Aratuípe foi seguir o seu comando, conhecer um pouco a paisagem vivida por ele e poder criar novas imagens, trazendo para o livro uma atmosfera de sonho", conclui.

Com tiragem de 500 exemplares, parte será distribuída gratuitamente para acervos de cursos de Cinema e Comunicação e cineclubes da Bahia. Há ainda uma versão em audiolivro, narrado pelo ator, escritor e locutor Daniel Farias e pela psicóloga e psicanalista Guacira Cavalcante, disponível em www.editoragris.com.br, também onde o livro físico pode ser comprado.

O projeto tem apoio financeiro do Estado da Bahia através da Secretaria de Cultura e da Fundação Cultural do Estado da Bahia (Programa Aldir Blanc Bahia) via Lei Aldir Blanc,direcionada pela Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo, Governo Federal.

Salve Janjão de Aratuípe! Viva o cinema, viva a vida.

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