Menu
Pesquisa
Pesquisa
Busca interna do iBahia
HOME > cultura > LITERATURA
Ouvir Compartilhar no Whatsapp Compartilhar no Facebook Compartilhar no X Compartilhar no Email

LITERATURA

Escritores narram convívio com Clarice Lispector

Por Mariana Paiva

27/09/2013 - 21:53 h
clarice lispector
clarice lispector -

O escritor Affonso Romano de Sant´Anna remexia uns papéis guardados quando a ideia surgiu: ele e a mulher, a escritora Marina Colasanti, podiam escrever um livro para contar mais sobre a amizade com Clarice Lispector. Assim foi feito.

"Descobri que tinha lembranças que eu ainda não tinha contado para ninguém", Affonso afirma, deixando logo transparecer o caráter confessional do livro. Com Clarice chega às livrarias pela Editora Unesp e reúne memórias, contos, ensaios e crônicas dos dois autores. Tudo com o mesmo tema: Clarice Lispector.

No apêndice, a transcrição da entrevista que ela concedeu a Affonso, Marina e João Salgueiro no Museu da Imagem e do Som, no Rio de Janeiro, em 1976. Na ocasião, Clarice fala sobre momentos até então pouco conhecidos de sua história, como a infância pobre e a vida dos filhos, além de explicar aos três interlocutores seu processo criativo.

"Essa entrevista é histórica. Clarice falou durante três horas, ela estava sorridente, num momento muito feliz", Affonso conta. Foi a própria Clarice, aliás, que escolheu o casal para entrevistá-la.

O escritor conta que a ideia inicial era disponibilizar a entrevista num CD, que viria junto com o livro. "Ela não precipitava a frase dela para manter o ouvinte atento. Clarice ficava procurando a palavra dela, o essencial".

Afeto notório

A amizade com Clarice faz com que o casal seja procurado com frequência para fornecer informações e falar sobre a escritora. "Ela achava que podia confiar na gente. Apesar de já saber, na época, que Clarice era genial, não tinha a dimensão da coisa. Quanto mais tempo passa, mais impressionante ela fica", Affonso conta.

Marina conheceu Clarice ainda na década de 1960, levada por um amigo em comum: o jornalista Yllen Kerr. "Fiquei muda, quieta, só escutando. Se eu disse duas palavras, deve ter sido muito. Ela tinha uma presença muito intensa. Falava de um modo estranho, mas tinha uma coisa imantada nela", ela revela.

O encontro aconteceu no apartamento de Clarice, no bairro do Leme. Deste dia, Marina guarda bem as lembranças da janela, que dava para uma rua, e das paredes cobertas por retratos de Clarice, pintados ou fotografados.

"Tinha livros sobre as cadeiras, embora ela dissesse que não lia quase nada. E um cachorro nada simpático, desses de pelo curto, chamado Ulisses. A decoração era toda em tons de marrom, tudo de uma cor só", Marina lembra.

Tempos depois, as duas voltaram a se encontrar, desta vez profissionalmente. Foi quando Clarice começou a escrever crônicas para o Jornal do Brasil, no qual Marina trabalhava e para onde foi levada por Illen, o amigo em comum.

"Ninguém queria atender Clarice no JB. Os homens da redação achavam ela difícil, e ela já tinha passado pelo incêndio, então estava bem frágil. Ela tinha muito medo de perder os originais", Marina conta.

Por causa das queimaduras sofridas no incêndio em seu apartamento, Clarice não conseguia fazer cópias dos textos que produzia porque tinha dificuldades de segurar o papel carbono entre as folhas. "Ela não tinha mobilidade nas mãos, o carbono fugia. Tinha uma pessoa amiga que vinha entregar, e ela fazia mil recomendações para não perder os textos", diz.

O olhar do outro

A amizade entre Clarice, Afonso e Marina, entretanto, se daria algum tempo depois. Acostumados a receber amigos em casa, o casal ficou surpreso ao receber o recado da também escritora Nélida Piñon: Clarice estava sentida de nunca ter sido convidada.

Affonso e Marina então marcaram um jantar com amigos em comum. Tudo preparado para o jantar sair cedo - Clarice jantava por volta das 18 horas -, a convidada especial da noite alegou dor de cabeça e quis ir embora. "Clarice não aguentava o olhar do outro", diz Affonso, que terminou levando-a para casa antes mesmo do jantar ser servido.

Foi com Marina e Affonso que Clarice foi pela primeira vez a uma cartomante. Numa conversa, Marina deixou escapar que gostava muito de se consultar com dona Nadir, que morava no Méier. "Affonso não é chegado nisso, é menino sério, protestante. Mas fomos levar Clarice até lá".

Dona Nadir era uma senhora de cabelos brancos e que, segundo Marina, não parecia cartomante. "Tinha paninho de crochê, café na garrafa térmica, tudo de vovó. Mas falava com o astral".

No caminho de volta, Clarice sorria, mas não chegou a contar nada do que dona Nadir lhe disse. "Visivelmente foi ótimo, porque ela voltou lá várias vezes", Marina revela.

Tempos depois, dona Nadir foi usada como inspiração para a cartomante do livro A Hora da Estrela. Madame Carlota, nome que Clarice deu à personagem, prevê um futuro feliz para a protagonista Macabéa, instantes antes dela morrer atropelada por uma Mercedes amarela.

Clarice editora

Affonso conta que um dos traços mais impressionantes da personalidade de Clarice era a lucidez. "Ela dava pareceres sobre obras a serem publicadas e disse que não gostava de um certo livro não, mas que ele merecia ser publicado porque tinha quem gostasse. Ela não escrevia daquele jeito, mas defendia o direito do livro ser lido".

Compartilhe essa notícia com seus amigos

Compartilhar no Email Compartilhar no X Compartilhar no Facebook Compartilhar no Whatsapp

Siga nossas redes

Siga nossas redes

Publicações Relacionadas

A tarde play
clarice lispector
Play

“Flica é a mãe de todas as feiras literárias da Bahia”, diz curador

clarice lispector
Play

Programação da Flipelô

clarice lispector
Play

Felica: festa literária começa neste domingo de forma online e gratuita

clarice lispector
Play

Festa Literária da Caramurê aborda o livro como instrumento de transformação

x