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Livro aborda sensibilidade e música de Letieres Leite

Vanessa Aragão escreveu livro sobre uma das aventuras musicais baianas mais ousadas desde a Tropicália

Publicado quarta-feira, 08 de maio de 2024 às 18:13 h | Autor: Israel Risan*
Livro está disponível para vendas no site da editora Letramento
Livro está disponível para vendas no site da editora Letramento -

Um mergulho na construção de uma sensibilidade afro-brasileira. Assim Vanessa Aragão resume o livro Rumpilezz: A Performance e Sensibilidade de Letieres Leite e sua Orkestra, disponível para vendas no site da editora Letramento (editoraletramento.com.br).

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Além de um estudo da performance do grupo e da construção desta sensibilidade, o livro é também uma homenagem vibrante à genialidade musical de Letieres Leite (1959-2021) e sua emblemática Orkestra Rumpilezz.

Resultado da dissertação de mestrado da jornalista e cineasta, o livro ficará disponível durante um mês em pré-venda apenas de forma online pelo site e redes da Editora Letramento. O valor de cada exemplar é R$ 59.

Vanessa, que se dedicou a acompanhar Letieres e a Orkestra, de 2018 até a precoce morte do maestro, aos 61 anos, compartilha no livro as experiências nos bastidores e a proximidade com Letieres e equipe, oferecendo relatos sinceros e apaixonados sobre esta jornada.

Ao apresentar o projeto, um professor comentou que o trabalho poderia se tornar um livro, o que motivou a jornalista a levar as pesquisas adiante, buscando investigar o que os símbolos e ações da Rumpilezz queriam dizer através das performances.

“Eu sempre sonhei em escrever, publicar algo. Ali eu tive minha motivação certeira para continuar o mestrado e desenvolver minha pesquisa. Um misto de curiosidade por analisar o grupo, ao mesmo passo que este me inspirava o melhor da música que vejo no mundo: a fusão entre o jazz com a musicalidade afro-brasileira, vindas dos terreiros de candomblé", compartilha.

Ela conta que começou a se interessar por percussão e a conexão com o Candomblé em 2015, após voltar de uma viagem ao Rio de Janeiro.

“Quando voltei de uma temporada no Rio de Janeiro decidi fazer tudo que gostava e nunca tinha feito, e uma dessas coisas foi fazer aulas de percussão. Fiz durante o ano de 2015 na Funceb [Fundação Cultural do Estado da Bahia] e, a partir daí, o universo dos toques de Candomblé, da nossa própria história, foi se revelando cada vez mais pra mim”, relata.

“Fui pesquisando e buscando tudo sobre o assunto. Daí, fui conhecendo pessoas em torno desse universo, tanto percussionistas quanto produtoras culturais. E uma delas foi Edmília Barros, que é minha amiga desde então. Estava trabalhando num lugar que detestava e ela me chamou para organizar uma equipe e filmar o show Letieres Leite e Orkestra Rumpilezz Convida Caetano Veloso, na inauguração do Hotel Fasano, na praça Castro Alves”, lembra Vanessa.

Momento de clareza

Naquele dia 8 de dezembro de 2018, que também era o dia do aniversário do sagitariano Letieres, Vanessa teve uma epifania, um momento de clareza: “Eu nunca vou esquecer desse dia, das sensações, do pertencimento que senti. Os atabaques, os (tênis) All Stars dos músicos de sopro, essa mistura das tradições dos terreiros com a cultura pop. Foi uma paixão e amor verdadeiro ao primeiro show. Já conhecia antes, mas assim de pertinho, não. Desde os bastidores, eu pude ver e sentir um cosmo imenso de símbolos e significados de tudo. É assim, descrevendo essa cena em detalhes, que inicio o livro sobre eles, inclusive”, relata.

A partir dali, ela passou a acompanhar o conjunto, registrando e filmando, ao mesmo tempo em que iniciava seu mestrado na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB): “A partir de então, trabalhei com eles filmando, fotografando, fazendo a gestão das mídias digitais e estreitando esses laços”.

“Em 2019, entrei no mestrado em Cachoeira, mas meu projeto de pesquisa era outro. Comecei a participar do grupo de pesquisa MusPop, sobre música e mediações culturais, liderado pelas professoras Nadja Vladi e Tati Lima. No final de 2019, eu estava decidida a abandonar o mestrado. Até que veio 2020, pandemia. Vladi, minha orientadora, foi muito gentil comigo e com doçura me incentivou a continuar. Em reuniões do grupo, fui começando a ter ideias sobre algo que me motivasse a pesquisar: a Rumpilezz, tão pertinho de mim no momento”, lembra.

Incentivada por outro professor da UFRB, Claudio Manoel, Vanessa achou o caminho e seguiu adiante. O resultado está no livro. A publicação aborda desde o primeiro contato até os momentos mais íntimos nos ensaios e camarins. A autora conduz o leitor por uma jornada pela trajetória do grupo.

"Como eu vivi vários momentos nos bastidores e nos palcos com o grupo, tenho uma memória cinematográfica disso, dos detalhes, dos símbolos e das sensações que me provocaram. Fui descrevendo isso", adianta.

Teórico-conceitual

O livro não se limita a relatos pessoais, mas também oferece uma análise teórica profunda (o que aliás, é o que se espera de uma dissertação de mestrado) sobre a performance e a sensibilidade afro-brasileira presente na obra de Letieres Leite & Orkestra.

“Construí esse caminho da performance e dividi ela em tópicos que estruturavam para mim a Orkestra: nomenclatura, elementos vindos dos terreiros; protagonismo negro; o maestro que dança, entre outros, para desenvolver a análise do grupo”, enumera. Entre outras referências teóricas e acadêmicas para construir um caminho acadêmico, Vanessa partiu dos ombros de um gigante do pensamento afrobaiano: Muniz Sodré.

“A sensibilidade afro-brasileira veio por meio da minha leitura de Pensar Nagô (2017), livro do autor baiano Muniz Sodré, que traz o pensamento teórico-conceitual”, revela.

“De uma forma geral, como seria estruturada nossa sociedade e nosso pensamento filosófico se eles se baseassem nas sabedorias vividas e apreendidas nos terreiros de Candomblé, esses espaços sagrados de resistência africana desde seu início? Como seria nossa sociedade se fôssemos baseados nisso, e não no pensamento filosófico branco-europeu? Então, peguei isso para analisar como a Rumpilezz cria uma sensibilidade através da performance", resume.

Farol de novos tempos

Além disso, a jornalista inclui um breve histórico da música instrumental em Salvador, análise de elementos performáticos e uma entrevista exclusiva com o percussionista Gabi Guedes, o que traz uma visão abrangente e multifacetada do legado deixado por Letieres Leite.

Desta forma, Rumpilezz: A Performance e Sensibilidade de Letieres Leite e sua Orkestra se constitui em uma celebração da vida, da música e da cultura afro-brasileira, dedicada à memória e à energia viva de um dos grandes ícones da música brasileira contemporânea.

“Letieres Leite & Orkestra Rumpilezz para mim é um farol de novos tempos musicais. Este livro, que escrevi a partir de minha pesquisa de mestrado, elabora de forma sistemática a performance que mostra a inovação, sofisticação e retomada da valorização do protagonismo negro e dos elementos do Candomblé em uma orquestra, ou big band, como por exemplo a colocação dos atabaques e percussionistas na frente, em destaque", diz.

A autora

Vanessa Aragão é jornalista, cineasta e pesquisadora da música instrumental afro-brasileira.

Possui no currículo, além do mestrado em Comunicação na UFRB, uma pós-graduação em Gestão do Entretenimento na Escola Superior de Propaganda e Marketing, no Rio de Janeiro, onde trabalhou na produção cultural de eventos como o RioContentMarket e Rock in Rio 2013.

Em Salvador, passou por veículos de comunicação na reportagem e pela Diretoria de Audiovisual da Bahia, entre outros trabalhos. Hoje desenvolve projetos na área da comunicação em geral e, mais especificamente, com conteúdos e linguagens fotográficas e audiovisuais de produtos culturais na produtora Alfazema Filmes, buscando fortalecer a autoestima identitária.

*Sob supervisão do editor Chico Castro Jr.

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