LITERATURA
Livro 'Migrantes' traz ilustrações impactantes sobre o drama dos refugiados
Por Eduarda Uzêda

"Migrantes, refugiados, deslocados, bombardeios, violência, guerra, fome, medo, êxodo, campos, meninos, meninas, órfãos, barcos, resgates, afogados, fronteiras, apátridas, ilegais, desaparecidos, crise humanitária, pacto mundial sobre migração, direitos humanos...Silêncio. Quantas fronteiras eles têm de cruzar para chegar em casa?
O texto é do cineasta grego Theo Angelopoulos (1935-2012) e está presente na contracapa do livro de arte Migrantes, da artista visual peruana, Issa Watanabe. A obra que traz ilustrações sem palavras da autora, entretanto, dizem tanto quanto as palavras do diretor. Não só falam como evocam, causam comoção e provocam reflexões.
A públicacão que narra a jornada de migração de um grupo de animais antropomorfizados (remetem a homens mulheres, velhos e crianças que aparentam diferentes nacionalidades) tem grande força imagética. Apresenta também um testemunho impactante de todo sofrimento daqueles que deixaram uma vida de angústias e incertezas para trás em busca da esperança de dias melhores.
Em tempo de crise dos refugiados no Afeganistão, com a tomada do poder do grupo extremista islâmico Talibã, os registros de milhares de pessoas amontoadas no aeroporto e algumas penduradas no avião para fugir de um destino trágico chocam, tal como o testemunho de Watanabe que parece clamar por ações humanitárias.
Em Migrantes, os animas/humanos atravessam florestas escuras de árvores sem folhas, talvez metáfora dos regimes opressivos, que destroem os frutos da vida e da criação.. Quase no fim da jornada flores descoloridas já aparecem e, deipois, as cores retornam às folhas das árvores. Mas na contracapa voltam as florestas escuras, sinaluzando um ciclo que volta a se repetir
Edição primorosa
A edição brasileira, fruto da parceria do Selo Emília, Solisluna Editora (www.solisluna.com.br),
e Livros da Raposa Vermelha é primorosa . O livro, capa dura e de belas ilustrações lançado este ano no Brasil, traz os animais antropomorfizados em cenas que também consternam o mundo: os fugitivos apinhados em um barco no oceano, enfrentando as correntezas e os temporais.
Quem não se lembra das tristes imagens dos fugitivos africanos que chegaram em precárias embarcações nas ilhas italianas de Lampedusa e Sicilia? Dos corpos – inclusive de crianças – boiando no mar ? E das dezenas de migrantes que foram encontrados mortos em botes de borracha no Mediterrâneo, aparentemente sufocados após inalar combustível?
No livro de Ilustração de Issa Watanabe, os migrantes durante a travessia pela floresta são acompanhados de perto pela morte, desenhada com um rosto de caveira e um manto florido. Até quando viajam pelo mar, a morte os vigia montada em um belo pássaro azul (um pelicano? ) É esta morte pequenina que ampara um coelho que não resiste e foi deixado para trás pelos outros bichos. Eles lamentam a perda, mas precisam prosseguir a viagem.
Fotojornalismo
Em entrevista para edição portuguesa , a autora afirma que primeiros desenhos de Migrantes foram desencadeados por um trabalho do fotojornalista sueco Magnus Wennman, com crianças sírias, vítimas de guerra; e por uma história vivida pela autora em Maiorca, Espanha, com o acolhimento de um refugiado.
Issa Watanabe queria contar às crianças e adolescentes independentemente da cultura ou origem geográfica o que é a migração forçada sem mascarar os fatos. A opção por desenhar animais e por ter feito um livro sem palavras acabou conquistando também aos adultos.
Este é um um livro para ler várias vezes porque a cada momento um detalhe do traço da autora se torna mais emblemático como a expressões da animais. É uma obra para ler com crianças que irão perguntar muitas coisas a exemplo de: Por que a morte oferece uma maleta aos viajantes? Por que estão fugindo? Hora de refletir eelaborar respostas.
É uma publicação para se desfrutar ao lado do amado relembrando a experiência de migração em terra estrangeira. Ou para se ler sozinho e chorando em silêncio porque as palavras não dão conta de tudo e o sentido de termo humanidade parece que se perdeu. E como lembra o poeta peruano Javier Heraud, citado em outra edição do livro da autora, "cada um é feito de um pedaço de morte e de caminho..." É edição para presentear e se oferecer de presente.

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