LITERATURA
O inferno de Belém é tema de obra do escritor paraense Edyr Augusto Proença
![Catedral de Belém está distante da cidade violenta que o autor descortina na obra | Foto: Carlos Casaes | Ag. A TARDE | 23.09.2006](https://cdn.atarde.com.br/img/2021/02/1200x720/belhell-livro-resenha-literatura-cultura_20212129284836-ScaleDownProportional.webp?fallback=https%3A%2F%2Fcdn.atarde.com.br%2Fimg%2F2021%2F02%2Fbelhell-livro-resenha-literatura-cultura_20212129284836.jpg%3Fxid%3D4591385%26resize%3D1000%252C500%26t%3D1723291045&xid=4591385)
O título do livro ja entrega ao leitor o universo da obra do escritor paraense Edyr Augusto Proença que tem conquistado leitores de outros países mais ainda é pouco conhecido por grande parte do público brasileiro. Trata-se do livro Belhell, junção das três primeiras letras de Belém, capital do Pará, com“hell”, inferno em inglês.
O resultado é uma descida ao Hades, aqui representado pelo submundo da capital paraense onde a violência dita as regras. Não falta sangue dos matadores de aluguel e de um serial killer– um médico que assassina mendigos e usuários drogas que vivem nas ruas e que tem múltiplos orgasmo com os crimes bárbaros.
"Levantou-se, vestiu-se, pegou o carro. Antes, no bagageiro, o fio de costurar tecidos humanos, fino, forte, letal (..) . Era insatisfeito da vida. Médico intensivista, seu plantão era opressivo, salvando vidas que chegavam em ponto crítico o tempo todo. Encontrara na Primeiro de Março, quase esquina com Riachuelo. Havia um mendigo ou crackeiro que dormia só, jogado em um canto onde fizera morada. O escolhido foi você! Era a hora. Parou o carro e foi chegando. Ele estava lá. Pé ante pé. O fio de costurar tecido humano em mãos enluvadas"
"Jogou fora o cigarro (...) Viu a vida de alguém indo embora, como já vira tantas vezes em posição inversa. Estava desesperadamente tentando se salvar. Agora, estranhamente manso, força invencível, sentiu o pau despejar sêmen e aquele corpo foi murchando, murchando, até ser deixado no chão, morto (...) Guardou o fio. Passou pano com álcool no volante, nas mãos. Olhou tudo e ntrou no carro novamente.
É apenas uma das histórias do livro do autor que, entre outras narrativas, descreve a vida de uma mulher anã que, por conta da mutação genética é abandonada pelos pais e acaba na prostituição e a trajetória de um rapaz que vai cada vez mais perdendo o caráter à medida que se lança no mundo dos cassinos, onde acontece grande parte da trama, com suas roletas, cartas e croupiês, empregados que dirige os jogos nos cassinos, pagando e escolhendo as apostas
Ritmo alucinante
Tudo em ritmo alucinante, em capítulos breves que prendem o leitor, ao mesmo tempo que este tambem é apresentado às ruas, vielas e becos de Belém, onde os personagens principais e secundários são criminosos prostitutas, usuários de drogas – craqueiros, cheiradores de cola e viciados em cocaina– além de guardadores de carro e matadores profissionais. A sétima obra do escritor tem selo da Boitempo.
O autor que teve quatro romances publicados na França –Os Éguas que recebeu lá o título de Belém e foi premiado, Moscow, Casa de Cabe e Pssica, um dos mais populares – mescla realidade e ficção. Em uma das histórias, por exemplo, ele fala da descoberta de um fato denunciado pela imprensa: um submarino clandestino que foi achado no Pará, totalmente ilícito.
A embarcação seria usada por traficantes para transportar drogas para fora do Brasil. No total, mais de 15 pessoas podem ter participado da sua construção. Edyr, aliás, costuma passear por lugares insalubres para contar suas histórias. Vale lembrar que ele também é jornalista e deve ter atuado na Editoria de Polícia.
Outro ponto que vale destacar na obra deste escritor é a transcrição do linguajar local. Além do bem conhecido "Égua", expressão que tem múltiplos significados e equivale ao "Oxente" baiano, Edyr fala muito do "Carro prata", cor dos automóveis de grupos de extermínio de Belém, presente no converseiro das periferias urbanas, algo correspondente ao carro preto que já dominou o imaginário baiano.
![Imagem ilustrativa da imagem O inferno de Belém é tema de obra do escritor paraense Edyr Augusto Proença](https://cdn.atarde.com.br/img/2021/02/724x500/belhell-livro-resenha-literatura-cultura_20212129284855-1.webp?fallback=https%3A%2F%2Fcdn.atarde.com.br%2Fimg%2F2021%2F02%2Fbelhell-livro-resenha-literatura-cultura_20212129284855.jpg%3Fxid%3D4591387&xid=4591387)
Na obra de Edyr também há espaço para as cenas de sexo, que ganham detalhes picantes. Em uma das histórias, o alvo da cobiça masculino é a bela Paula, que se transforma em uma grande jogadora de pôquer e que também se envolve sexualmente com uma copeira casada com um criminodo
Impunidade
Com o passar dos anos acredito que a sociedade brasileira vai pedir perdão aos nortistista, ao povo da floresta pelo abandono da população , pelo descaso e pela impunidade. O latifúndio, o desmatamento, o trabalho escravo, o tráfico de menores, a pedofilia e a ação de grupos de extermínio e de milícias são apenas alguns dos problemas da região de grande diversidade cultural.
Edyr Augusto faz sua parte denunciando através de seus livros e personagens a Belém que fica fora dos cadernos de turismo e que é avaliada como a região metropolitana com a pior qualidade de vida do Brasil, segundo o Índice de Bem-Estar Urbano (IBEU). Com a epidemia do Coronavírus, as cenas chocantes nos hospitais da região deixaram tudo muito claro e evidente.
Por outro lado, as péssimas condições de saneamento, de acessibilidade, do meio-ambiente e da habitação revelam uma região que cresce de forma desordenada, território fértil para a violência. Belhell é, como outras obras de Edyr, um retrato duro de uma cidade sem lei.
O autor também tem como mérito o texto conciso, sem enrolação, sem palavras inúteis para encher a narrativa. A violência de algumas cenas pode chocar alguns leitores mais sensíveis, mas os fatos são bem reais e nada distante da realidade brasileira. Fica a dica para quem não conhece, mergulhar no universo deste autor que tem assinatura autoral e estilo próprio.
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