LITERATURA
Poesia Total reúne todos os livros de Waly Salomão
Por Marcos Dias

Da trincheira da poesia, Waly Salomão lançou seus artefatos literários sabendo muito bem onde estava: "brasil é buraco de cárie". Mas inventou, na dinâmica deste mesmo lugar, uma "brava alegria" e "felicidade guerreira".
A travessia literária do poeta e agitador cultural pode ser fruída no livro Poesia Total, lançamento da editora Companhia das Letras. O volume reúne todos os livros do poeta, de Me Segura qu'Eu Vou Dar Um Troço (1972) a Pescados Vivos (2004).
Ótima oportunidade para reencontrar, em bloco, a força criativa do baiano de Jequié — que ganhou o Prêmio Jabuti em 1997 com Algaravias —, morto aos 59 anos, em 2003, meses após assumir a Secretaria Nacional do Livro e da Leitura.
Em 1972, nas páginas do jornal alternativo soteropolitano Verbo Encantado, ele já anunciava seu desejo por um "alargamento não-ficcional da escritura".
"Me Segura qu'Eu Vou Dar um Troço não é uma descrição de aventuras underground, objeto feito pro consumo ou coisa assim, mas preparado ao fio da navalha da linguagem".
O respeito ao seu projeto literário orientou a edição do livro. "Waly sabia o que queria e queria do seu jeito, e respeitar os livros originais é o caminho mais fácil. Não há muito espaço para o erro", comenta a editora Sofia Mariutti.
Para ela, que também foi responsável pela edição do fenômeno Toda Poesia, de Paulo Leminski, e Poética, de Ana Cristina Cesar, é complicado inclui-los numa mesma geração: "Talvez o que os une é a erudição e o rigor que tinham com o texto".
Ao mesmo tempo, acredita que o baiano se distingue por ter continuado a produzir ao longo dos anos 1990 e 2000 e seguir se renovando.
O próprio Waly resistia a classificações redutoras, como a de ser um poeta da chamada geração 70: "Eu não sou um fóssil, sou um míssil".
Ressignificação
De acordo com Sofia, a edição dos três poetas partiu de uma carência no mercado, já que as obras estavam esgotadas. "São autores que estavam injustamente esquecidos nas livrarias porque são clássicos contemporâneos, ainda não foram canonizados como Drummond ou Vinícius. A Companhia resolveu apostar neles, resgatá-los de estigmas como 'marginal', 'tropicalistas' e ampliar sua leitura, ressignificá-la".
O livro, que contou com a colaboração da família do poeta, a viúva Marta Braga e os filhos Omar e Khalid, foi lançado com sucesso nesta semana no Rio de Janeiro. Hoje é a vez de São Paulo e, no dia 27 de junho, Salvador faz a festa, no MAM.
Poesia Total sai com tiragem inicial de 5 mil exemplares, igual a Toda Poesia, de Leminski, que chegou aos 100 mil exemplares vendidos depois de pouco mais de um ano.
Além de contar com letras de canções inéditas, o livro apresenta no apêndice textos importantes da fortuna crítica de Waly, escritos por nomes como Paulo Leminski, Armando Freitas Filho, Caetano Veloso, Davi Arrigucci Jr. e Heloísa Buarque de Hollanda, entre outros.
Filho de pai sírio e mãe sertaneja, Waly formou-se em direito, mas nunca exerceu a profissão. Sua lei era outra. No filme Pan-Cinema Permanente, de Carlos Nader, diz que suas atividades como letrista, produtor de discos ou diretor de shows eram apenas meios de "levar o pão para casa".
E confessava: "A poesia é como se fosse minha ambição maior", deslizando para a compreensão de que a atividade poética é "a menos culpada de todas as ocupações".
Mas igualmente sem culpa, devemos a Waly e parceiros como Caetano Veloso, João Bosco, Adriana Calcanhotto e Jards Macalé a eterna beleza de músicas como Mel, Memória da Pele, Fábrica do Poema, Vapor Barato e Mal Secreto. Em tempo: há letras inéditas em Poesia Total.
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