LITERATURA
Presidente do Olodum lança o livro 'Fala Negão – Um Discurso sobre Igualdade'
Por Eduarda Uzêda

'Fala Negão, o Discurso sobre a Igualdade', segunda publicação do presidente do Olodum e militante da luta social negra, João Jorge Santos Rodrigues, será lançada amanhã, a partir das 19 horas, na Casa do Olodum. Trata-se de uma coletânea de textos escritos e publicados, além de registros de conferências e entrevistas realizadas no período de 1983 a 2021.
Quem espera um discurso identitário radical de gueto vai se surpreender. João Jorge, que é mestre em direito público pela Universidade de Brasília (UnB), produtor cultural, poeta e escritor, acredita que a luta pela igualdade é uma batalha de todos e destaca que a ideia é conscientizar a sociedade de maneira plural.
Os textos mostram a forma de pensar de um homem que tem uma vida inteira dedicada à luta pela igualdade. “Tenho 65 anos de idade e 42 de militância. A ideia foi deixar estes depoimentos para as futuras gerações. Os da minha época lutaram pelas cotas e representatividade do negro na mídia, mas vejo hoje grande preocupação pela estética negra quando a maior luta é pela igualdade de direitos”, alfineta.
“Para aqueles que são apaixonados pelas artes, a cultura e a história oculta da comunidade afro-brasileira de Salvador, o livro narra a verdadeira odisseia vivida por um punhado de jovens artistas, intelectuais e militantes do Movimento Negro, responsáveis pela inserção do Grupo Cultural Olodum no cenário artístico nacional e internacional”, afirma Jacques d’Adesky, professor da PUC-Rio e pesquisador visitante na Universidade Laval, Quebec, Canadá, na apresentação da obra.
Em relação à publicação que tem selo do Grupo Cultural do Olodum em parceria com a Fundação Casa de Jorge Amado, ele complementa: “Nessas páginas, o leitor acompanhará o Olodum em suas viagens e peregrinações pela África, Europa, Américas e Ásia”.
Discursos e pronunciamentos
Entre os vários discursos e pronunciamentos, merece destaque o realizado por João Jorge na Câmara Municipal de Salvador em homenagem aos 40 anos do Olodum, quando foi agraciado com a medalha Zumbi dos Palmares, em 12 de novembro de 2019.
“Eu sou um destes garotos que viu, na cidade de Salvador, a perseguição da Polícia Federal na rua do Bispo, botando os presos de calcinha e de cueca na rua para fiscalizar todo mundo, um dos maiores guetos da América Latina, sim, o Pelourinho era um dos maiores guetos da América Latina”.
“Então a vida foi extremamente dura e perversa. Extremamente cruel com um menino que olhava para as ruas de Salvador e via os monumentos portugueses. Os homenageados portugueses, as mulheres portuguesas, e perguntava ao prefeito negro que eu conhecia, que era meu pai João Rodrigues da Silva, e nós? Cadê a minha identidade?”.
“Olha que eu superei ter que cortar o cabelo com máquina um e máquina zero no Sindicato dos Comerciários. Eu e meu irmão José éramos obrigados a cortar o cabelo porque pobre e preto não podia ter cabelo longo”, frisa.
João Jorge, que foi um dos mobilizadores do capítulo do negro na Constituição da Bahia de 1989, que trata dos direitos da comunidade negra e da cultura no ambiente do estado, afirma que a situação dos afrodescendentes só irá melhorar com políticas públicas eficazes que promovam a igualdade, além de punições severas contra os racistas.
Novas publicações
O autor, que anuncia brevemente mais duas obras – livros sobre poesias afro-brasileiras e de enredos do Olodum –, traz ao público a memória tanto de um ativista vigoroso quanto de um grupo cultural carnavalesco que vem imprimindo um discurso engajado.
No texto Olodum: O Perfume da Rosa, publicado em 2018 no jornal do bloco afro, ele afirma: “O caminho das estrelas, que o Olodum seguiu desde 1979, foi adubado por flores e espinhos. Contudo, o perfume das rosas embalou nossos corações e mentes, permitindo que em um lugar especial do mundo apresentássemos nossas ferramentas de jardineiros e carpinteiros do universo e da luta pela igualdade, no Maciel-Pelourinho, em Salvador da Bahia, no Nordeste do Brasil”.
“As inovações foram tantas na cultura local que o perfume da rosa Olodum tocou em nossos corpos e corações nesse caminhar para o sucesso e nos transformou em uma referência nacional e internacional. Um bloco afro de Carnaval, o Olodum, semeou a ideia de que é possível realizar, fazer cultura, arte, educação e transformar um bairro inteiro. Os primeiros dez anos foram de mostrar as garras, levantar a cabeça e firmar-se no cenário, superar as dificuldades e apresentar as novidades da cultura negra”, acrescenta.
“Um dos mais novos blocos afros da cidade, o Olodum criou ações e programas seguidos pelos demais grupos, a exemplo: a Escola Olodum, a Banda Olodum, o Bando de Teatro, a Fábrica de Carnaval, os seminários, jornais, livros, pesquisas sobre a África, campanhas contra as formas de violência e pela paz, bem como a luta internacional contra o apartheid na África do Sul, e o resgate
da poderosa história de João de Deus, Lucas Dantas, Manuel Faustino e Luiz Gonzaga, da
Revolta dos Búzios de 1798”, complementa.
João Jorge, no livro, fala também de pessoas que influenciaram sua vida, a exemplo de Nelson Mandela, Martin Luther King, Bob Marley, Desmond Tutu e Abdias Nascimento. O ativista defende a cultura da paz e da não violência.
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