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Bethânia e Zeca fazem show na Concha neste sábado; leia entrevista

Por Vinícius Marques*

14/04/2018 - 9:31 h
Bethânia e Zeca Pagodinho celebram a amizade em um encontro inédito, hoje, na Concha Acústica
Bethânia e Zeca Pagodinho celebram a amizade em um encontro inédito, hoje, na Concha Acústica -

"Ela foi lá em Xerém cantar. Todo mundo ficou maravilhado", lembra Zeca Pagodinho em conversa com A TARDE sobre a participação de Maria Bethânia no CD/DVD O Quintal do Pagodinho 3 (2016). Quase dois anos depois desse encontro, nasce a nova parceria entre Maria Bethânia e Zeca Pagodinho: a turnê De Santo Amaro a Xerém, que chega hoje à capital baiana, às 19h, na Concha Acústica do TCA. A turnê que já passou por Recife ainda segue para o Rio de Janeiro, Belo Horizonte, São Paulo e Brasília.

"Eu nem sei como chegamos a essa parceria. Só lembro de ter abraçado a Maria e dito 'agora é nós. Ninguém quebra mais. Alô, Xerém!' e ela falou 'Santo Amaro e Xerém' e daí surgiu a ideia", conta Zeca.

Fã declarado da santo-amarense, Zeca não escondeu o nervosismo na noite de estreia em Recife. "Eu estava muito nervoso. Só pensava 'como é que eu vou cantar com Maria Bethânia? Eu não sou cantor, porra', mas ela dizia para mim 'nada de susto. Você canta e eu sigo'", contou o músico. "Ela me perguntou 'por que você tá assim, Zeca?', e eu falei 'porque eu vou cantar com a rainha!' e então ela respondeu 'e eu vou cantar com o rei. Também estou nervosa'. Aí eu pensei 'agora danou-se tudo', mas foi tudo muito lindo.

No show de hoje, Bethânia e Zeca se alternam no palco. No total serão 37 músicas, onde os artistas vão revisitar clássicos da carreira dos dois e algumas músicas inéditas, como a canção de abertura Amaro Xerém, escrita por Caetano Veloso a pedido de Bethânia. Outras canções inéditas escritas por Adriana Calcanhoto e Leandro Fregonesi completam o repertório.

Maria Bethânia também conversou com nossa reportagem. Em quase 20 minutos de conversa por telefone, falou sobre a parceria com Zeca, samba, novos projetos (inclusive nova parceria com Gal Costa) e política.

Eu estava muito nervoso. Pensava ‘Como é que eu vou cantar com Maria Bethânia?’

Como foi a estreia em Recife?

O Zeca ficou muito solto e feliz. Ele estava muito assustado e preocupado por ser um show com um pouco mais de dramaturgia, mas ele ultrapassou muito bem. Ele é um intérprete extraordinário. Eu estava muito feliz de estar ali realizando meu serviço ao lado dele e vendo o resultado do que criamos. O público foi extraordinário. E o mais importante foi que nós dois estivemos bem próximos, ligados e alegres, fazendo aquilo com vigor, que é o sentido desse encontro. É uma admiração pelo samba, a base de toda música nossa. Ele com o samba do morro e eu com o samba do Recôncavo, o samba de roda. São amigos se encontrando e homenageando quem merece, o samba (risos).

A primeira parceria de vocês foi para o DVD Quintal do Pagodinho 3, mas você se lembra quando foi o primeiro encontro com o Zeca?

Foi há muitos e muitos anos. Ainda na sala Sidney Miller, no Rio de Janeiro, quando Tereza Aragão era viva e trazia a velha guarda das escolas de samba para se apresentarem no centro do Rio. E eu conheci o Zeca exatamente em uma tarde da Velha Guarda da Portela. Foi nosso primeiro encontro. Depois voltamos a nos encontrar na casa de Alcione, de quem nós somos muito amigos. Estávamos presentes e eu o lembrei desse dia e ele me falou "Meu Deus, eu não lembro muito bem", e eu respondi "Imagino... Muito longe. Eu que tenho uma memória de santo-amarense". Ele me chamou para fazer uma participação no Quintal e eu o homenageei com um texto, que ele sabe de cor (risos). Ele sabe das coisas. É muito bonito isso.

Como se deu a parceria com Zeca para essa turnê?

Trabalhamos muito. Ele perguntou se eu gostaria de fazer alguma coisa e eu falei que sim e com ele mais ainda. O combinado foi fazer somente esses espetáculos, porque ele tem a carreira dele e eu tenho a minha. Ele tem outras vidas e eu tenho meu trabalho. Mas isso é um encontro, assim como tive com Caetano, Chico e Gil. Um encontro entre amigos.

O samba é o motor principal dessa turnê. Qual sua opinião sobre o papel do samba no cenário musical atual?

O samba é imortal. É igual a África para a gente (risos). É a raiz. Quando o João Gilberto inventou a bossa nova foi a batida do samba que ele modificou. O tropicalismo tem a raiz baiana do samba. O samba do Gilberto Gil e do Caetano, Desde Que o Samba é Samba, traduz isso muito bem.

Como funcionou a escolha de músicas para o repertório?

Total liberdade para ele (Zeca) ver o que queria, porque ele é a autoridade do assunto. Primeiro o que ele mais queria falar e cantar, e eu do meu lado também o que me interessava. Como a brincadeira é De Santo Amaro a Xerém, eu perguntei a Caetano se ele podia fazer um samba para nós dois cantarmos para significar esse encontro e Caetano, depois de algum tempo sem compor, fez um samba lindo e está feliz de ter feito. O Zeca se apaixonou na primeira vez que ouviu. Ele não gosta de aprender música nova, mas o Zeca tem um ouvido impressionante. Se ele gosta, ele ouve apenas uma vez e já sabe. Sabe e ainda dá um volta por cima que só ele para dar (risos).

Além da música de Caetano, você cantará outras inéditas?

Eu vou cantar Adriana Calcanhoto, que fez uma canção homenageando a Mangueira no ano em que fui campeã (A Menina dos Olhos de Oyá, 2016), tem um samba do Leandro Fregonesi em homenagem a Santo Amaro e tem um refrão do Fregonesi que ele fez para nós dois, Santo Amaro e Xerém. Essas são as inéditas. A música da Adriana foi feita para a Mangueira, outro segmento, as músicas do Fregonesi e do Caetano foram feitas para o show.

Como funcionaram os ensaios? O Zeca não é muito de ensaiar, já você é conhecida por ser perfeccionista, prefere tudo cronometrado, ensaiado.

Eu gosto de ensaiar muito. O Zeca não tem costume de ensaiar, não gosta. Eu dizia “Zeca, basta chegar 13h, que eu fico aqui com os músicos e você só chega e passa”. Eu chegava no estúdio e ele já estava lá há três horas (risos). Ele não saía dos ensaios, acabou gostando de ensaiar. No show em Recife ele falou “Bethânia me botou para ensaiar. Eu geralmente não ensaio”, foi ótimo (risos). Tem que ter o mínimo de ensaio para ter um convívio para palco e para cena.

Zeca é um intérprete extraordinário. Eu estava muito feliz de estar ali ao lado dele

Vocês pensam em estender a turnê para além das sete datas divulgadas ou talvez um DVD do show?

Agora não. Ele tem muita coisa para fazer e eu também (risos). Não falamos de DVD nem nada. Nós nos prometemos nos divertir, e inclusive ele fala todos os dias: “Bethânia me disse que era para a gente se divertir!” (risos).

Você gravou Vingança do Amor, de Pablo, no seu novo DVD?

Fiz dois versos do Pablo (risos). Ele ficou muito contente, o que me alegrou muito, pois eu admiro o Pablo. O público adorou! Eles festejaram mais que o Pablo (risos). Eu gostei da música e cantei. O que eu gosto eu canto. Sou livre.

E quando você lança seu DVD?

Não sei. A Biscoito Fino gravou e já deve lançar logo. O DVD já está pronto e para mim quando grava, já foi. Não é mais meu.

Depois dessa turnê, o que vem por aí?

Meu querer é descansar depois dessa turnê, mas carregando pedras, carregando canções, melhor dizendo (risos). Vou preparar um projeto que tenho aqui na minha cabeça e quero ver se este ano já dou corpo a ele. Depois da turnê eu vou... (gargalhada) eu vou para a praia. Descansar.

No fim do show de Recife aconteceu uma manifestação política da plateia. Qual sua opinião sobre esse momento político que estamos vivendo?

Não ouvimos, foi depois que saímos de cena, mas em todo lugar desde sempre tem “Fora Temer!”. Isso já está em tudo. Eu preciso me apurar com o que está acontecendo, porque eu estava focada nos ensaios, mas lógico que eu tenho algumas informações, mas preciso ler e me inteirar melhor. De todo modo, eu sinto o Brasil completamente desestabilizado. Sinto o Brasil fraco, sem potência. Fico morta de agonia de ver isso porque não sei quanto tempo pode demorar e a minha angústia é que seja logo. Fico ansiosa. O Brasil parece que está derretendo. Tenho uma sensação ruim. O pior para mim é não ter perspectiva de quando isso vai findar para começar outro. Qualquer que seja, mas que tenha tesão, poder. Fica frio, tudo com o pé atrás. Não gosto de nada que está acontecendo.

E essa gravação para o novo CD da Gal Costa?

A Gal me chamou. Ela está fazendo um disco só de canções inéditas e me ligou dizendo “Mana, eu queria que você viesse cantar comigo” e eu respondi “Meu Deus, tanto tempo depois você quer?” e ela disse “Eu quero! Você quer?” e eu respondi “Lógico que eu quero!”. É uma música do Jorge Mautner, muito forte, muito diferente, uma coisa muito contrita e dramática. Bonita, muito bonita. Como eu sabia que ia entrar nesses ensaios, neste trabalho com o Zeca, eu disse a Gal “Deixa eu fazer correndo a voz”. No dia eu mandei a voz para ela e ela aprovou, mas ela ainda não colocou a dela, porque estava em turnê na Europa, mas disse que quando voltasse colocava a dela e me mandava. Estou louca para ouvir. Foi uma grande surpresa e um grande alegria voltar a cantar junto com a voz da Gal e de novo se referindo a mãe. Gravamos “Oração a Mãe Menininha” e agora é o Mautner falando da mãe. Muito bonito.

* Sob a supervisão da editora Márcia Moreira

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