DIA DO MUSICOTERAPEUTA
Músicas e sons ritmam mudanças de vida para crianças e adultos
Abordagem promove desenvolvimento cognitivo, emocional e social de indivíduos com diferentes necessidades
Por Matheus Calmon e Franciano Gomes
Cauane Menezes é mãe de um garoto de 3 anos que até pouco tempo tinha dificuldades em quesitos como interação social e atenção. Ela encontrou na musicoterapia uma chave para mudanças significativas tanto no comportamento, quanto em suas relações com o mundo.
"Já vi um progresso nele absurdo. Já havia feito outras terapias, eu não conhecia, não tinha noção do quanto é legal. O relacionamento dele com o profissional aqui no Instituto Navarro, que transmite as sessões, está sendo maravilhoso. Ele adora fazer, está sempre entusiasmado, feliz. Ouve o som do teclado e já começa a dançar", conta Cauane ao Portal A TARDE enquanto o filho, em uma sala ao lado, participava de uma sessão.
Ela avalia que neste primeiro mês, o garoto virou "outra criança". "Ele é uma criança não verbal e eu sinto os estímulos que a musicoterapia proporciona, que antes ele não tinha. E a gente sente que isso está vindo de uma forma bem rápida, que ele super se concentra".
A musicoterapia é uma abordagem terapêutica que utiliza a música como ferramenta para promover o desenvolvimento cognitivo, emocional e social de indivíduos com diferentes necessidades. Ela oferece estímulos que podem levar a mudanças significativas no comportamento e na comunicação.
Até 2020 haviam 15 Associações de Musicoterapia, entre elas, a Associação Baiana de Musicoterapia (Asbamt). Ao Portal A TARDE, a entidade, que nesta sexta-feira, 15 de setembro, comemora o dia da musicoterapia, diz ainda lutar pela regulamentação da profissão
Através da música, por exemplo, o filho de Cauane está se tornando mais curioso, concentrado e engajado em seu processo de aprendizado e interação, transformando-se em uma criança que experimenta o mundo de uma maneira mais rica e estimulante.
Com a percepção de que a música age diretamente no cérebro e provoca diferentes reações em quem a escuta, a ciência passou a estudar tal eficácia. A musicoterapeuta Gal Vieira, do Instituto de Saúde Corpo e Mente, explica que sons têm imensa abrangência e conseguem fazer com que quem os ouve execute, se mostre e desperte seu potencial.
"Todo o cérebro é ativado só pelo fato de você escutar uma música. A música e os sons têm uma abrangência imensa. Antigamente, a gente acreditava que aqueles neurônios acabavam. A gente sabe hoje que outras áreas do cérebro podem estar funcionando e cumprindo aquela área que foi lesada. Então a gente dando estímulos para esse cérebro, existe essa plasticidade, a pessoa vai melhorando e vai evoluindo de uma forma mais significativa".
Ela explica que, muitas vezes, a pessoa não tem problemas aparentes ou diagnosticados, mas sofre de ansiedade ou hiperatividade e, nestes casos, a musicoterapia pode auxiliar. Há outros casos, a exemplo de autistas e pacientes neurológicos que tiveram AVC ou Alzheimer, que a prática é indicada por período maior.
"O principal objetivo que eu tenho observado é o foco e atenção e, a partir daí, a gente consegue estimular a fala, a coordenação motora, funções executivas, de como eu vou executar essa atividade. Então, a musicoterapia abrange todas essas áreas".
Na área emocional, a música também tem papel fundamental. "Hoje em dia há muitos estudos, não só de musicoterapeutas, mas também de médicos, neurologistas que estão estudando o efeito do som e da música no cérebro ou no indivíduo".
Mas neste processo, além das músicas e sons, o silêncio também possui função primordial. "A pausa é necessária na vida de todas as pessoas, ainda mais hoje em dia, no processo que a gente tem vivido. Estamos percebendo que a demanda da vida cotidiana está sendo muito grande, você está sempre funcionando", explica a profissional.
Ela exemplifica que muitas crianças autistas têm hiperatividade e dificuldade para sentar e se relacionar com outra pessoa.
"Se você consegue fazer um trabalho com ele de um silêncio, de uma parada, de uma pausa, e fazer com que ele sente para interagir, ele vai começar a te olhar, a perceber ele. O corpo dele naquele momento, vai perceber você e, a partir daí, vai conseguir responder o que você tá precisando".
Gal conta que é apaixonada por musicoterapia e lembra que conheceu a possibilidade da graduação quando estava em dúvidas na época do vestibular. Em determinado momento, ela encontrou uma conhecida que lhe apresentou o termo pela primeira vez. Depois, com sua mãe, esteve na faculdade, conheceu a musicoterapia e decidiu que era esta a sua missão.
Uma das suas pacientes é uma senhora com Alzheimer que não tinha o hábito de cantar e, nos primeiros atendimentos, ficava com o olho fechado e tinha dificuldades de interação social. "Hoje ela está cantando. Chego lá e ela diz assim: 'trouxe o pandeiro?'. Pouco depois ela mesmo pede a música e está trazendo outras músicas. Quando você vê a evolução do paciente, o reconhecimento, nada paga. Eu sou realmente apaixonada".
A musicoterapia pode ser trabalhada na área organizacional, em empresas, na área hospitalar, com idosos, enfim, são várias áreas
Formação
Gal frisa que é importante que o musicoterapeuta seja um profissional qualificado, ou que tenha feito graduação, como ela, ou que seja pós-graduado.
Quem atualmente está na reta final da pós-graduação em musicoterapia é o educador musical Márcio Oliveira. Ele também ressalta a importância da qualificação do profissional que fará a musicoterapia. "Meu trabalho é educação musical para autista, tenho licenciatura em música e estou fazendo a formação em musicoterapia, por isso ainda não faço o trabalho do musicoterapeuta".
Ele conta que após se formar, vai trabalhar com crianças no Transtorno do Espectro Autista. "Pode ser trabalhado na área organizacional, em empresas, na área hospitalar, com idosos, enfim, são várias áreas".
Para os autistas, ele explica que a educação musical traz vários benefícios. "Controle emocional, qualidade de vida, ajuda em habilidades como fala, interação social, coordenação motora, e outras. Ela proporciona essas habilidades ajudando a incluir essa criança na sociedade, seja na escola, na rua, ou qualquer outro ambiente".
Márcio explica que quem escolhe a música e os instrumentos durante o processo é o próprio paciente, através da forma como interage com cada opção. "No início tem uma atividade livre, com vários instrumentos. O que ele mais interagir será o que vai ser feito o trabalho com ele".
O educador exemplifica a atuação da prática com uma criança que não consegue escrever ou riscar, quer seja por excesso de força ou pela falta dela. "Um exemplo simples do processo de educação musical é o uso de uma baqueta de instrumento. A gente coloca na mão e começa a dosar a força. Depois, pega caneta e papel para escrever. Então, isso já reflete na escola e em atividades pedagógicas".
Luta pela regulamentação
Segundo a União Brasileira de Associações de Musicoterapia, até 2020 haviam 15 Associações de Musicoterapia, entre elas, a Associação Baiana de Musicoterapia (Asbamt), que abrange também o estado de Sergipe. Ao Portal A TARDE, a entidade, que nesta sexta-feira, 15 de setembro, comemora o dia da musicoterapia, diz ainda lutar pela regulamentação da profissão.
A entidade afirma esperar que, no ensejo da regulamentação da profissão, mais projetos de lei avancem na abertura de oportunidade para o campo de atuação profissional, além da ampliação do acesso à população aos atendimentos em diversas políticas públicas.
O presidente da Associação, Ricardo Romanha, conta que a entidade tem o papel de cuidar desse profissional. "A musicoterapia hoje tem como definição o uso da música e seus elementos através de um profissional qualificado. Estamos vivendo um momento interessante. A gente tem o papel de fomentar essa luta pela regulamentação, pois entendemos que precisa de um profissional com esse olhar".
Todo o cérebro é ativado só pelo fato de você escutar uma música. A música e os sons têm uma abrangência imensa
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