TEATRO
Moncho Rodrigues vê ator nordestino com cultura brincante
Por Eduarda Uzêda

"O ator nordestino é herdeiro de uma cultura brincante, de uma tradição que veio do norte da Galícia, na Espanha, e de Portugal, que se perdeu. Aqui no Nordeste, entretanto, este legado continua muito vivo e presente em folguedos populares".
A afirmação é do premiado diretor teatral, dramaturgo, cenógrafo e figurinista espanhol Moncho Rodriguez, que vem desenvolvendo grande parte do seu trabalho na Espanha, em Portugal e no Brasil.
O artista, natural da Galícia e que contabiliza mais de 200 encenações, é pesquisador de novas linguagens cênicas no universo da dramaturgia ibérica. Moncho diz que o intérprete nordestino tem uma cumplicidade muito maior com o diabo do que com Deus. "Enquanto Deus se aproxima mais das questões morais e do castigo, o diabo está mais próximo da festa, das brincadeiras, do prazer, do mundo invisível."
Plataforma cultural
Em visitas periódicas a Salvador, Moncho, que é o diretor artístico da plataforma cultural Fafe Cidade das Artes - espaço referencial para Residências Artísticas e Criações Experimentais -, afirma que tem levado alguns artistas baianos para a Fafe, cidade portuguesa situada na Região Norte, e está feliz com os voos criativos.
Uma prova é a indicação do espetáculo Bartolomeus ao Prêmio Braskem de Teatro. A peça, que leva à cena a força da cultura popular com a influência das tradições ibéricas e nordestinas, tem os atores João Guisande, Daniel Calibam e Danilo Cairo representando um personagem brincante, denominação dada ao artista que participa do jogo cênico e da brincadeira de determinadas manifestações. Eles experimentaram em Fafe.
Olhar crítico
Instigado pela reportagem, o encenador, que deu a entrevista durante uma pausa de uma oficina para atores, faz uma comparação bem humorada da especificidade dos intérpretes teatrais. "Eu que sou galego, demorei de me acostumar com a expressão do ator espanhol, que de início me pareceu muito melodramática. Depois, compreendi que tem a ver com a cultura da vida e da morte, da relação do touro e do homem".
E continua: "Já o português é um ator mais formal, que tem uma ligação muito forte com a palavra, com a língua. Sobre o Brasil, o intérprete que mais me interessa é nordestino, que tem relação com o brincante, e por esta razão desenvolvemos parceria em Pernambuco, Sergipe e Bahia", acrescenta.
Moncho, que se define como "oficiante de teatro", não é apreciador da dramaturgia brasileira: "Com certeza, se o país tivesse uma educação elevada, a novela teria outro teor", afirma categórico.
Porta- voz político
O dramaturgo defende: "O ator deveria ser o porta-voz político de sua cultura e uma ferramenta que nos fizesse caminhar para utopia de mais humanidade, de mais prazer".
Com três peças em cartaz no último final de semana - Bartolomeus, Labirinto de Amor e Morte e Enluarandas-, Moncho agora viaja para O II Encontro Pedagógico de Teatro para Infância e Juventude, que acontece em Fafe, de 25 a 27 de março. O evento quer discutir a formação de crianças e jovens.
"O teatro infantil não pode continuar a ser apenas um caça-níquel. Isto é um insulto. A culpa também está na falta de observação dos pais para o percurso de seus filhos e das escolas, que têm que ter critérios seletivos que contribuam para a formação de seus alunos", finaliza.
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