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CULTURA

Juraci Tavares lança Umbilical, seu primeiro CD solo

Por Catarina Reimão | Agenda Arte e Cultura Ufba

07/05/2015 - 7:52 h
Juraci Tavares
Juraci Tavares -

O arrastar dos chinelos de couro anuncia que ele se aproxima, em passos lentos, de quem já não tem pressa. Pelas ruas do Santo Antônio, no Centro de Salvador, todos o cumprimentam. Juraci Tavares, que desde sua juventude compõe para blocos afros, como o Ilê Aiyê e Malê Debalê, começa a mostrar o rosto por trás dos versos.

Aos 65 anos, o músico, que também é construtor civil e filósofo, prepara um novo passo na carreira como artista: o lançamento do seu primeiro álbum solo. Umbilical, o disco, ganha os palcos e será apresentado amanhã, às 19h30, em show único no Teatro Sesc-Senac Pelourinho, onde será vendido por R$ 25.

O trabalho é fruto de sua musicalidade e militância em prol das causas negras e traz um diálogo entre a música e a poesia. Quem assina a direção musical do disco e do show é o baiano Márcio Pereira, mestre em Artes Musicais pela University of New Orleans. Juraci vê Umbilical como um parto, um disco que demorou o tempo necessário para nascer. O que fez com que viesse amadurecido poética e musicalmente.

As experiências da infância, no bairro da Liberdade, despertaram em Juraci a necessidade de interferir na realidade excludente que o cercava. Por volta dos anos 70, começou a frequentar espaços voltados para a preservação da cultura negra, em busca dos valores ancestrais africanos que norteiam suas ações enquanto cidadão e artista.

"Normalmente, esses valores não são passados nas escolas, deixando-nos apartados desses elementos de afirmação cidadã e autoestima. Essa ocultação permanece em nós negros por um longo período da nossa vida", explica.

O artista, que acredita em um ser humano cheio de pluralidades, afirma não ter um ídolo. No entanto, tem diversas referências, como o maestro Moacir Santos, os cantores Milton Nascimento e Gilberto Gil, e ressalta que sua maior fonte de inspiração são os blocos afros.

"Em relação aos blocos afros, eu afirmo que são escolas paralelas ao ensino oficial, porque desempenham papéis que a cátedra não faz chegar a nós negros. Valores que colaborariam para as nossas inserções nos variados aspectos da sociedade brasileira", declara.

Seja como educador ou poeta, Juraci tem a luta pela inserção da herança histórica como característica marcante de sua trajetória. "Quando escuto a canção Autoestima, penso em quantas vezes ouvi a expressão "você é uma negra linda". Mas só a partir da música dele abri os olhos para a exclusão presente no elogio", lembra Josiane Acosta, produtora artística do compositor.

O educador

Antes de se dedicar a carreira artística, Juraci lecionou durante 32 anos na antiga Escola Técnica Federal da Bahia. "Embora ele fosse professor de um curso técnico, já naquela época tinha o perfil de alguém da área de humanas. Filosofava, nos instigava a pensar diferente e se preocupava com a nossa formação humana", recorda Maria Clara Oliveira, ex-aluna do curso de Edificações.

O cantor teve como primeira formação a construção civil, em seguida se graduou em filosofia e iniciou o curso de música aos 51 anos. Em 1992, Juraci e sua esposa, Elisabeth Piedade, iniciaram um projeto de aulas de português e matemática dadas gratuitamente por eles, na sala de casa.

Em 1992, Juraci e sua esposa, Elisabeth Piedade, iniciaram um projeto de aulas de português e matemática dadas gratuitamente por eles, na sala de casa. Depois, ensinaram em espaços cedidos por amigos nos bairros Caminho de Areia, San Martin e Barbalho. "Muitas vezes fornecíamos o dinheiro do transporte para os alunos que moravam em bairros mais distantes", lembra ele. Em 2006, inauguraram o Centro de Humanidades Ossos 21.

Reinvenção

O Centro é um local inspirador. Reflete seus idealizadores. O corredor de entrada tem, nas paredes, placas em homenagem a poetas negros. Por toda casa é possível encontrar desenhos de pergaminhos com espaços em branco, esperando serem preenchidos com poemas.

A Escola de Música da Ufba (Emus) representa uma reinvenção de Juraci Tavares. Ele, que ingressou no curso prestes a se aposentar no Ifba, encontrou novos caminhos. "A Escola me recebeu com muita amorosidade. Foi nesse ambiente que comecei a descobrir a possibilidade de cantar, me ampliando da esfera da composição", explica. Entre as grandes conquistas durante o período que esteve na Emus, está a parceria com Márcio Pereira, que produz o artista desde então.

O primeiro disco transita entre a música e a poesia presente em seu livro, Vocábulos Caminhantes, para falar da herança africana na Bahia. As canções trazem versos livres e inquietantes que levam o ouvinte à reflexão, acompanhados de melodias leves e dançantes.

Com músicas como Comando Doce, que abre o DVD do Ilê Aiyê, Bonito de Se Ver, o álbum foi desenvolvido durante dois anos. Pereira conta que Juraci evidenciou o desejo dele mesmo divulgar as obras produzidas, tanto com o amigo quanto com outros parceiros.

Para Juraci, o nome Umbilical remete a um olhar filosófico, plural, rítmico, afro brasileiro. É uma homenagem à África, considerada, por ele, berço da humanidade. Juraci, mesmo aposentado, não pensa em descanso. O professor, compositor e poeta pretende continuar estudando. "Quero tentar o reingresso para diplomados e iniciar uma graduação em clarinete e, depois, ainda quero fazer um mestrado". Entre os planos, estão a publicação de mais um livro e uma turnê de divulgação do disco.

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