AXÉ MUSIC
Movimento musical dos anos 80 e 90 ganha exposição interativa
Exposição ainda tem objetos que celebram a música carnavalesca
Por Eugênio Afonso
E lá se vão 40 anos desde que Luiz Caldas entoou ‘nega do cabelo duro / que não gosta de pentear / quando passa na Baixa do Tubo / o negão começa a gritar / pega ela aí, pega ela aí / pra quê? / pra passar batom / de que cor? / de violeta / na boca e na bochecha’.
Eram outros tempos e o politicamente correto ainda não ditava as regras da convivência social. Sorte do cantor e compositor baiano que, com o sucesso de Fricote, lançado em 1985, deu o pontapé inicial do Axé Music, movimento que em 2025 comemora quatro décadas de história.
E para celebrar a data, a CAIXA Cultural está exibindo a exposição Axé: A Força Sonora e Visual de um Movimento. A mostra permanece em cartaz até 16 de março, e a visitação poder ser feita de terça-feira a domingo, das 09 às 17h30, com entrada gratuita.
Com curadoria do músico e produtor cultural baiano Jonga Cunha, a exposição exibe peças históricas, como figurinos, cartazes, capas de discos e instrumentos musicais utilizados por artistas que foram fundamentais para a popularização do gênero.
Para Jonga, o projeto quer mostrar ao Brasil os 40 anos do maior movimento musical dos últimos dois séculos. “Um movimento que foi muito além da música e chegou a um comportamento social, um jeito de ser de um lugar que varreu o País durante muito tempo”.
Ele diz que a partir da Axé Music ser baiano passou a ser chique. “Só para dar uma ideia da importância do movimento. Ele mostrou ao mundo uma cara afro-brasileira que a cidade [Salvador] tem e que ninguém conhecia. Mostrou que aqui no Brasil existe a capital da percussão mais importante do planeta. Mais do que na África e em Cuba”, garante o fundador da banda Eva.
Nenel Rebouças, idealizador e realizador da exposição, afirma que a mostra na CAIXA tem como objetivo celebrar as quatro décadas do Axé Music, destacando sua importância cultural e musical para a Bahia e o Brasil.
“A exposição busca preservar a história do movimento, homenagear seus ícones e conectar novas gerações à essência do Axé, que revolucionou o cenário musical nacional e internacional. É uma oportunidade imperdível para reviver momentos marcantes, celebrar a história e compreender a profundidade deste movimento que tanto contribuiu para a identidade baiana”, destaca Rebouças.
Nenel defende a tese de que o movimento não apenas revolucionou o cenário musical, como também desempenhou um papel crucial na promoção da cultura baiana, projetando artistas locais em âmbito nacional e internacional.
“Além disso, impulsionou o turismo e a economia da Bahia, consolidando eventos como o carnaval de Salvador como referências globais. É uma expressão autêntica da alegria, diversidade e riqueza cultural do nosso estado”, alinhava o idealizador.
Espaços interativos
Axé: A Força Sonora e Visual de um Movimento também homenageia o produtor musical Wesley Rangel (1950-2016), fundador do Estúdios WR – espaço que produziu e gravou alguns dos maiores sucessos do gênero –, e Pedrinho da Rocha, artista visual responsável por criar a identidade estética da Axé Music.
A importância de Wesley é tamanha que, segundo Jonga, “no momento em que a WR viabilizou aos baianos poderem gravar em Salvador, eles não tiveram mais que entrar numa fila no Rio e em São Paulo para que um diretor artístico de uma gravadora vilipendiasse sua arte”.
E com mais de 45 anos trabalhando para a área de entretenimento, o outro homenageado, Pedrinho da Rocha, reconhece que o tributo é um registro importante do seu trabalho. “Já tenho 67 anos. É muito tempo dedicado para uma vida, né? Então qualquer registro é interessante também para o público. E isso termina sendo uma documentação para outras gerações do que aconteceu aí entre os anos 80 e 90, que, na minha opinião, foi uma revolução não necessariamente combinada. Essa é a grande importância que vejo nessa exposição e nessa homenagem”.
Ele conta também que deve ter feito mais de mil fantasias durante o período áureo do movimento e que, com seu envolvimento artístico, documentou o registro da evolução da Axé Music. E que hoje em dia, por conta do enfraquecimento do Axé, trabalha bem menos.
“Bem, eu ainda trabalho, obviamente, mas não mais tanto quanto, porque o carnaval mudou bastante. Eu trabalhava para, sei lá, entre blocos, bandas, camarotes, era mais de 20 entidades, hoje trabalho para cinco, uma meia dúzia, e trabalho mais só no final do ano, né?, complementa o artista visual mais simbólico da Axé Music.
Na mostra, o público vai poder participar também de algumas interatividades, como o ‘Palco Experiência’, onde os visitantes poderão simular uma passagem de som, utilizando bateria, teclado e percussão, para recriar o ambiente de estúdio e ensaio de uma típica banda de Axé.
Tem ainda o espaço ‘Você com seu Ídolo’, um painel que exibe os rostos de grandes ícones do Axé. O público poderá inserir seu próprio rosto no cenário e levar para casa uma foto digital, criando uma conexão com seu artista favorito.
Já o ‘Acervo de Sons’ é uma ferramenta digital interativa que oferece uma seleção de músicas emblemáticas gravadas nos Estúdios WR. Os visitantes poderão explorar esse acervo e ouvir as raízes sonoras do movimento.
Termo pejorativo
Quando surgiram os primeiros acordes do que viria a ser este novo movimento musical, em meados dos anos 1980, o termo Axé Music foi cunhado por um jornalista baiano justamente em tom de crítica.
A ideia era que fosse uma expressão pejorativa, já que o material produzido era considerado de baixa qualidade e brega em termos sonoros.
Mas o pessoal da música não deu a mínima, se apropriou do nome e transformou o Axé no que ele é hoje: um fenômeno musical que varreu o país, sobretudo no final do século passado, e que agora pode ganhar uma data comemorativa pra chamar de sua: Dia Nacional do Axé Music (projeto que tramita no Congresso Nacional).
Misturando samba-reggae, merengue, frevo, samba de roda e outros ritmos sonoros, rapidamente o Axé se tornou um dos fenômenos musicais mais populares no Brasil, inundando os estados brasileiros com seu estilo, sobretudo no período carnavalesco das décadas passadas.
É bem verdade que como todo ritmo musical transitório, faz já um bom tempo que o sertanejo desbancou o movimento baiano, e o Axé já não anda lá muito bem das pernas, mas a turma segue comemorando.
Todo fevereiro, pelo menos, tem Axé nos trios, só que agora ele já não é mais o dono absoluto da festa. Outros ritmos musicais invadiram o carnaval baiano mesmo sem pedir licença. E, por enquanto, vieram pra ficar.
*O cantor e compositor Luiz Caldas foi procurado pela reportagem para dar entrevista, mas não respondeu às perguntas que lhes foram enviadas.
Axé: A Força Sonora e Visual de um Movimento / CAIXA Cultural (Rua Carlos Gomes, nº 57, Centro) / até 16 de março 2025 / Visitação de terça-feira a domingo, das 9h às 17h30 / Entrada Gratuita
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