MÚSICA
No auge aos 43 anos, Ratos de Porão faz dois shows na Bahia
Ratos de Porão tem apresentações em Salvador e Feira de Santana
Por Maria Raquel Brito*
Completar quatro décadas de estrada não é para qualquer um. Chegar a 40+3, então, é motivo ainda maior para celebração. É assim, celebrando mais um aniversário da banda e com energia de sobra, que o Ratos de Porão, um dos maiores nomes do punk rock brasileiro, desembarca na Bahia neste fim de semana. Em dose dupla, para a alegria dos fãs: primeiro na Casa Noise, em Feira de Santana, amanhã (27), no festival Dopesmoke, com as bandas Erasy e Gorencephalic, e outra no Largo Quincas Berro d’Água, em Salvador, no sábado (28).
O Ratos de Porão completou 40 anos em 2021, quando teve início também a turnê em comemoração ao marco, que resultou em um documentário em cinco partes no YouTube. Em solo baiano, os shows se transformam na Turnê 40 Anos (+3), já que desembarcam na boa terra em setembro, mês que a banda foi formada.
“Esse deve ser o auge do Ratos. Está sendo muito legal, para os fãs principalmente, ver a banda na ativa há tanto tempo assim e sem ser uma piada dela mesma, sendo tão relevante”, diz o vocalista João Gordo.
Ao longo das quatro décadas, gravaram 20 álbuns e oito EPs, sendo os mais recentes de 2022 e 2023: o álbum Necropolítica, de 2022, e o EP Isentön Paunokü, de 2023. Desde 1981, passou por algumas mudanças de formação e, hoje, conta com João Gordo nos vocais, Juninho no baixo, Boka na bateria e Jão na guitarra. Dessa união, resultam o vigor e a presença eletrizante do Ratos de Porão.
A banda subiu aos palcos soteropolitanos pela primeira vez em 1983. De lá para cá, desembarcou muitas vezes em Salvador, sendo a mais recente foi em 2019, no festival Rock Concha. Na ocasião, celebrou os 30 anos do emblemático álbum Brasil com um show memorável – para os fãs e para João Gordo, que se apresentou no melhor estilo punk e, da Concha Acústica, saiu direto para a ambulância. O episódio infame não desanimou o vocalista.
“Eu estava passando mal, com um problema de pneumonia. Consegui dar o show, depois fui direto para a ambulância, tomar oxigênio e tal. Hoje, tenho certeza que vai ser diferente”, anseia. “E é sempre bom ver os fãs, ainda mais na Bahia, que a gente tem um monte de amigos. A nossa história é longa, a gente vem em Salvador faz muitos anos”.
Se tem alguém que concorda com Gordo é Manoel Messias, fã de carteirinha da banda. Desde 1983, o músico de 52 anos só perdeu um show do Ratos de Porão em Salvador – o que compensou assistindo a vários em São Paulo, incluindo o show dos 30 anos, em 2011, e ode 40 anos, em 2022. Agora, ele se prepara para ver a banda em solo baiano novamente, e em dobro: marcará presença nas duas apresentações da Bahia.
“Eu sou muito fã do Ratos. Tenho vinis, CDs, camisas. A minha banda, Injúria, já abriu dois shows para o RDP, sou brother do Juninho (baixista da banda), já bebi cerveja em mais de uma ocasião com Jão (guitarrista) e bati papo com o Gordo”, conta, orgulhoso.
O som e as mensagens das músicas do Ratos de Porão, sempre políticas e mais atuais que nunca, atraem admiradores de todas as idades, da velha guarda aos mais jovens. No próximo fim de semana, Manoel é um entre muitos punks e rockeiros baianos que seguirão a banda por aqui. Para curtir a energia que só o Ratos de Porão tem, pelo menos duas caravanas sairão em bate e volta para Feira de Santana no dia 27.
Uma delas é a Caravana do Serjão, organizada por Luis Sérgio Anunciação, de 44 anos, que curte o grupo desde os anos 1990. De lá para cá, diz que a paixão e admiração pela banda só cresceram. “Eu faço [a caravana] desde 2019, quando eles tocaram pela primeira vez em feira de Santana. Sempre que tem evento de rock lá eu tento organizar para a galera descer. Não é uma missão fácil, tudo é feito por amor ao underground, sem retorno financeiro nem nada”, diz.
Retrocesso?
Ao se deparar com versos como “Misérias, queimadas, devastação / Por que ninguém faz nada para os deter?”, da canção Amazônia Nunca Mais, é difícil acreditar que a letra – de 1989 – não foi escrita ontem. O mesmo se repete em muitas outras pedradas sônicas dos Ratos, sempre carregadas de críticas sociopolíticas.
Para o Gordo, por mais que pareça haver nisso uma espécie de “presságio”, a atualidade das composições só revela quão pouco o país avançou ao longo das últimas décadas.
“É ‘Amazônia nunca mais’ há anos. Está cada vez pior, cada vez pegando mais fogo e com cada vez mais especulação e mais genocídio indígena. E a esquerda mesmo não faz muita coisa. Até faz, mas o estrago é tão grande, que eu espero muito mais ações para controlar essas queimadas e colocar todos esses fazendeiros em cana. Se os caras são agressivos, a gente tem que responder agressivamente”, argumenta.
As letras já existentes não deram conta do cenário político dos últimos anos. Em 2022, a banda lançou o álbum Necropolítica, descendo a lenha no bolsonarismo e ao avanço da extrema-direita ao longo das dez faixas. No ano seguinte, veio o EP Isentön Paunokü, com versões de músicas da clássica banda finlandesa Terveet Kädet, contemporânea dos Ratos, em que segue criticando apoiadores do ex-governo, sem poupar os chamados “isentões”.
Trazendo as críticas dos novos discos aos palcos baianos tão perto das eleições municipais, o vocalista descreve o pleito de 2024 como um “futuro distópico”. “Não dá nem para entender o que está acontecendo. Hoje em dia, a regra é falar merda, falar mentira. Quanto mais mentira você fala, mais ganha voto. É o fim do mundo, meteoro caindo”, diz o Gordo, que defende também que o Nordeste é o último bastião da resistência antifascista no Brasil.
Participação baiana
Na capital baiana, três nomes locais se juntarão aos Ratos de Porão no Largo Quincas Berro d’Água, no coração da cidade. São as bandas Lasso e Erasy, de Salvador e Feira de Santana, respectivamente, além do produtor cultural Rogério BigBross, o DJ do evento.
Segundo Fabiano Passos, baixista da Lasso, tocar no mesmo palco que o Ratos de Porão, uma das influências da banda soteropolitana, é uma responsabilidade gratificante. “É uma banda que eu particularmente gosto muito, desde que comecei a ouvir hardcore, das bandas que eu mais escutei minha vida toda. A Lasso está preparando um show bem coeso, para dar a nossa mensagem de forma bem direta. Vamos tocar muitas músicas do nosso novo disco que saiu agora, Parte”, antecipa.
A Erasy, que é de Feira de Santana, fará a ‘dobradinha’ entre a capital baiana e a Princesa do Sertão junto com o Ratos. Para eles, que já tocaram com a banda em outro show em Feira, estar novamente com os ídolos é um momento significativo.
“A gente está muito contente, satisfeito mesmo, com a oportunidade. Estamos fazendo eventos e produzindo um disco novo, que deve sair no começo do ano que vem, e devemos fazer turnê para lançar o disco. Esse evento com o Ratos de Porão apareceu numa hora muito importante pra banda”, avalia Luciano Penelu, vocalista da Erasy.
Ao longo da carreira quadragenária, o Ratos de Porão acompanhou a juventude de muitos fãs de rock. Um deles foi BigBross, que conta que a banda moldou sua consciência política. “Moldou também minha vida social e um adolescente começando a ouvir rock pesado. Muito do que eu sou hoje se deve ao Ratos de Porão e a bandas como eles. Bandas que me ajudaram a moldar política e socialmente”, diz o produtor, antes de defender que esse será o show do ano.
RATOS DE PORÃO 40 ANOS (+3), Lasso, Erasy, DJ BigBross / Sábado (28), 19h / Largo Quincas Berro d’Água (Rua do Açouguinho, 12, Pelourinho) / R$ 80 e R$ 40 / Ingresso social: R$ 64 + um quilo de alimento não perecível / Desconto de 40% para assinantes do Clube A TARDE / Vendas: Sympla
*Sob supervisão do editor Chico Castro Jr.
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