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CULTURA

No Dia do Rock, livros parecem mais importantes que música

Chico Castro Jr.

Por Chico Castro Jr.

13/07/2016 - 10:04 h
dave grohl, foo fighters
dave grohl, foo fighters -

Da série "coisas que não fazem sentido": hoje comemora-se no Brasil - e somente aqui, diga-se de passagem - o Dia Mundial do Rock, instituído por duas rádios paulistas em homenagem ao festival Live Aid, realizado nesta data, em 1985. Consta que Phil Collins disse no show que gostaria que aquele dia fosse consagrado ao rock. Maldito Phil Collins.

Antes o careca surdo tivesse ficado calado. Talvez o rock não estivesse relegado à irrelevância que hoje amarga, especialmente no Brasil.

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Notícia velha: em seu relatório anual de 100 músicas mais tocadas nas rádios brasileiras, a empresa Crowley Broadcast Analysis, que monitora as transmissões, não listou uma faixa sequer do rock nacional em 2015. E do rock internacional, apenas duas, das bandas Maroon 5 e Magic, que são pop de festa.

E não só aqui: no último dia 6, a revista Spin noticiou em seu site que, segundo a empresa de monitoria Nielsen Music, o primeiro semestre de 2016 foi o pior em vendas de álbuns desde 1991.

Outro fator é o inevitável desaparecimento da geração de músicos que deu estatura artística ao rock, hoje entre os 70 e 80 anos. Recentemente, foram-se David Bowie, Lemmy Kilmister (Motörhead) e Prince, entre outros.

Conclusão: não há o que comemorar no "Dia do Rock". Ou há? Na verdade, o que há são dúvidas e controvérsias. Porque, ao mesmo tempo em que este cenário desolador está estabelecido, há uma curiosa (e bem-vinda) invasão de livros - biografias, na sua maioria - e camisas de bandas clássicas, vendidas às baciadas nas lojas de departamentos.

Livros versus discos

A impressão que fica é que a estética e a mitologia do rock permanecem, enquanto a música parece cada vez menos relevante. Enquanto a venda física de música cai - substituída pelo ainda duvidoso streaming - a oferta de livros, relatando a vida e a carreira de grandes roqueiros e bandas, parece subir. É como se a história do rock fosse hoje mais importante do que o rock em si.

Marcelo Viegas, editor da Edições Ideal, primeira editora especializada em rock do Brasil, concorda em parte: "Em alguns poucos casos isso acontece, sim. Por exemplo, no caso do Steven Adler, ex-baterista do Guns N' Roses. Lançamos no Brasil a autobiografia dele, Meu Apetite por Destruição: Sexo, Drogas e Guns N' Roses. A música produzida pelo Steven pós-GnR é insignificante, comparada ao seu legado com a banda", observa.

"Todavia, também lançamos livros de artistas que continuam produzindo em alto nível e arrastando multidões, como Dave Grohl, Slayer, Travis Barker (Blink 182) e Pitty. Nesses casos, não acho que dá pra dizer que as histórias são maiores que a música. Pelo contrário, a música continua ocupando papel central. Se os fãs buscam livros sobre seus ídolos é porque a música segue emocionando e inspirando ", diz.

Sobre os livros, há também uma questão óbvia: "As pessoas compram livros e camisetas porque a música é de graça. No caso dos livros que falam de rock, havia uma demanda reprimida enorme, pois esse tipo de literatura não chegava no Brasil, com raríssimas exceções", lembra o químico e roqueiro Nei Bahia, do podcast local Rocks Off e ex-parceiro de Fábio Cascadura em algumas composições.

"Acho também que o rock passou a entender a importância de ter memória, registro. Pois, se não for assim, o futuro será de Safadão, Los Hermanos e bateristas tocando em aplicativos de celular", acrescenta Nei.

Baterista da veterana banda punk local Pastel de Miolos e à frente do selo underground Brechó Discos, Wilson Santana também percebeu a predominância da procura por camisetas sobre os discos: "Camisas e adesivos vendem mais que os discos. Produzo merchans de bandas e percebo isso".

Outro fator é o evidente desinteresse dos jovens no Brasil pelo rock. A juventude "esclarecida", que não segue a tríade sertanejo-arrocha-pagode, virou as costas para o gênero, identificando-se mais com o hip hop e a MPB hipster de artistas como Tulipa, Marcelo Jeneci e Céu, entre outros.

"A última banda brasileira a causar burburinho foi Chico Science & Nação Zumbi - que, aliás, deu direcionamento para essa galera que hoje renega o rock. Depois dele ouvimos algo de novo?", diz Wilson.

Líder da antológica banda local Maria Bacana, André LR Mendes também vai nessa linha de raciocínio: "Todos nós matamos a indústria fonográfica, que era o grande vilão, mas também o grande mecenas. Que banda hoje chegará aos 30, 40 anos de carreira? Que grande banda apareceu depois disso? Cada download que fizemos ajudou nesse cenário. Foi o talento que acabou? Com certeza não", diz.

Sem tempo para ícones

Produtores na linha de frente do rock local, Rogério Big Bross Brito e Irmão Carlos seguem acreditando, apesar de tudo.

"Essa coisa do ícone do rock já foi, é da época em que entrar numa gravadora era que nem passar num concurso público. Hoje você grava com muita facilidade e tem muita banda acontecendo, não dá mais tempo de reconhecer alguém como ícone, toda hora aparece algum artista mais 'retado' que o outro", vê Carlos.

"Olha o Liniker: um sucesso instantâneo. O disco dele só tem três músicas e o ingresso do show no Pelô foi 60 paus. Aí você vê bandas com vinte anos que não atraem mais ninguém. Como funciona isso? É caos, transição", percebe.

O excesso de informação não ajuda nem um pouco, percebe Big: "O cara passa tanto tempo baixando tanta coisa que não tem tempo de virar fã. Por isso o fã mesmo ainda é o cara que ouve Bowie, Ramones, Motörhead, o cara que veste a camisa", afirma.

"Fora que você não vê mais qual é a banda de rock popular no Brasil. Ainda é Barão, Titãs, Legião. Se banda de rock hoje é o Malta, puta que pariu, me deixe com os véios de 70 anos mesmo", dispara Big Bross.

E aí voltamos ao início: o que comemoramos no Dia do Rock? "O passado, o presente e o futuro. Você pode celebrar o Dia do Rock ouvindo um disco dos Stooges e na sequência, o novo álbum do DIIV. Não concordo com o discurso caduco de 'na minha época era melhor'. Temos que viver o presente e valorizar bandas novas. Tem muita gente fazendo muita música boa por aí. Basta manter os ouvidos e a mente abertos", conclui Viegas. Tim-tim.

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