CULTURA
O que é que o BaianaSystem tem?
Por Nadja Vladi | Jornalista e professora adjunta da UFRB
Herdeiro direto da Tropicália, do Mangue Beat e da cena Axé (em toda a sua amplitude histórica), o projeto BaianaSystem não deixa de surpreender. No início da noite do domingo, 19, quando se prepara para sair de Ondina, no Furdunço, o burburinho que se cria em torno do Trio Navio Pirata, só aumenta. Quando o cantor e compoistor Russo Passapusso chega ao trio é possível ouvir uma gritaria de fãs.
Quase 20 horas, eles começam a tocar o novo single, Invisível, um samba-reggae à moda do Baiana, muito eletrônico, e com uma letra social sobre os trabalhadores invisíveis, milhares deles que estão ali no Carnaval segurando as cordas e vendendo cerveja da marca patrocinadora da festa. A Babilônia é ali.
O que temos na avenida é uma catarse à base de uma sonoridade grave, muito grave e de hits como Playsom, Terapia e Lucro. Quanto mais próximo do trio, mais vai sentindo a pressão. E a frequência mexe com qualquer um, quase um estranhamento. Esse é o grande saque do Baiana, não o único. A ideia de transformar o trio elétrico em um soundsystem, incorporando o grave dos cantores jamaicanos com os dos blocos afros, acoplado a base eletrônicas, é simplesmente genial.
O estranhamento inicial que a sonoridade pode provocar vai se quebrando por outras proximidades como o pagode, o samba-reggae, o reggae, as máscaras, e isso tudo é muito Carnaval, é muito Bahia. BaianaSystem se insere em uma cena cultural, o Carnaval, que é parte da complexidade de Salvador que não pode nem deve ser obliterado por nenhum artista. Dessa forma o grupo desenvolve com a cidade um circuito afetivo, social e comercial.
Revitalização
Parte do sucesso do BaianaSystem está na forma como ativa várias práticas musicais locais em um diálogo cosmopolita, sugerindo uma tentativa de revitalização da tradição local (samba-reggae, pagode) a partir de uma conexão com estéticas globais (dub, hip hop), dando um passo à frente na música urbana pop baiana. E também tem Russo Passapusso, sem sombra de dúvidas um vocalista dono de um carisma singular e uma voz em perfeita sintonia com a guitarra baiana (patrimônio do Carnaval) de Roberto Barreto, e o baixo animado de SekoBass, acrescido da experiência audiovisual provocada por Filipe Cartaxo.
É interessante observar que o BaianaSystem percebe o Carnaval como um combustível para a música que produzem. E como saem mais fortalecidos no final de cada percurso. Talvez eles nem caibam mais no pré-Furdunço (o debate já está posto nas redes sociais) pelo público gigantesco que arrastam, mas sem dúvida esse era o caminho que a música urbana baiana estava buscando para se ressignificar.
E não deixa de ser interessante ver um grupo que defende sua autonomia artística em um trio sem cordas, sem grandes patrocinadores, mas que a cada ano aumenta o número de foliões na avenida. O Baiana faz um percurso paralelo estético, político e ideológico em relação ao fluxo principal e consegue assim ser inserido no Carnaval como um produto que quebra a hegemonia das estrelas da festa. Isso já é muito bom!
BaianaSystem no Carnaval:
24/02 (sexta) - 17h- Furdunço - Avenida (saída no Sheraton e encerramento Praça Castro Alves);
26/02 (domingo) - 17h - Pôr do Sol na Praça Castro Alves (trio parado);
27/02 (segunda) - 00h00 - Navio Pirata - Barra/Ondina (saída no Farol ao final do percurso em Ondina)
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