HOMENAGEM
Orlando Senna recebe título de Doutor Honoris Causa
Aos 84, o grande cineasta baiano lança, também, seu novo filme, ‘Longe do Paraíso’
Por João Paulo Barreto
Amanhã, às 17h, uma justa homenagem acontece no Salão Nobre da Reitoria da Universidade Federal da Bahia, quando a instiuição concederá ao cineasta Orlando Senna o título de Doutor Honoris Causa. No release enviado para divulgar o evento, as informações sobre o diretor de cinema definem bem esses 84 anos de vida.
“Cineasta, escritor, roteirista e jornalista, Orlando Senna começou a produzir no cinema ainda nos anos 1960. Tem mais de 30 filmes, entre longas e curta-metragens, no currículo, entre eles a obra-prima Iracema, uma Transa Amazônica (1974), em codireção com Jorge Bodanzky, um dos filmes mais premiados do cinema brasileiro, atualmente com mais de 2,2 milhões de visualizações na internet. Coordenou e ajudou a implantar, ao lado de Fernando Birri e Gabriel Garcia Marquez, a Escuela Internacional de Cine Y TV – San Antonio de Los Baños, em Cuba. Nos anos 1970, trabalhou no teatro e em jornais no centro do país. Criou cursos de dramaturgia e roteiros de cinema no Brasil e no exterior”.
Não é pouca coisa. Mas essa trajetória de vida ainda traz mais.
Solange Moraes, amiga pessoal de Orlando e produtora de Longe do Paraíso, seu mais recente filme, em entrevista ao jornal A TARDE, pontua, ainda, a importância de Orlando durante os anos da gestão do PT no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando o cineasta ocupou cargo importante no Ministério da Cultura e contribuiu com um dos períodos mais férteis do nosso cinema.
“As políticas dos governos Lula e Dilma, nas gestões Gilberto Gil e Juca Ferreira, tiveram Orlando Senna como secretário do audiovisual, uma pessoa que, junto com sua equipe na SAV/ANCINE/CTAV, fizeram uma revolução no audiovisual brasileiro. Desde o projeto Revelando os Brasis, criado por Orlando Senna, passando por outro projetos igualmente relevantes, como o DOC TV, Nacional, América Latina e CPLP Audiovisual, até a criação da TV Brasil, da Lei do Audiovisual. Tudo isso foi uma transformação na forma de se fazer cinema no Brasil", salienta Solange
Munido de cultura
Ao A TARDE, Orlando Senna relembra esse período em Cuba, após sua saída do país e em como seu foco, bem como os dos seus companheiros de luta, era em prol de um cinema de ideias.
“Eu sempre estive no front, não com armas, mas através da cultura e da educação, e na política, acreditando que valeria a pena pensar um Brasil melhor. Saí da Bahia vivo, porque fui apadrinhado por Jorge Amado. Nós éramos uma geração inquieta, que acreditava poder mudar o mundo através das ideias", crava Orlando.
"Em Cuba, com Gabriel Garcia Marquez, Fernando Birri e outros companheiros, construímos uma escola que se propunha a ser uma Escola dos Três Mundos. E assim acabou sendo, por isso leva esse nome até hoje. Uma escola onde professor, aluno e diretor convivem no mesmo espaço de forma igualitária, nos espaços de alimentação, lazer e moradia. Sem distinção. Uma escola onde as ideologias são plantadas através do cinema", afirma o diretor.
O front citado por Orlando passa, também, pela dificuldade de produzir cinema no Brasil após o desmanche da cultura provocado pela ascensão da extrema-direita ao poder governamental em 2018. "As dificuldades com a produção sempre existiram, mas houve um retrocesso no setor audiovisual, causado não só pela pandemia, mas também pelo caos e desmonte gerados com o golpe contra a ex-presidenta Dilma e com a consequente eleição de um governo que não valorizou a cultura. Até agora estamos tentando reconstruir o que foi destruído. Isso não só interrompeu um projeto de governo, que tínhamos começado a pôr em prática no primeiro governo do presidente Lula, e depois com a Dilma. Enfim, desejo que o Lula consiga reerguer esse país novamente", estima Orlando.
Novo filme
Lançando oficialmente seu novo filme, Longe do Paraíso, também essa semana, Orlando Senna mantém seu espírito combativo e indagador dos aspectos sociais desse Brasil sofrido. A partir da história de uma tragédia familiar, o longa remete a Caim e Abel e ilustra de maneira brutal a desnecessária violência existente na discussão da reforma agrária.
“Digamos que escrever Longe do Paraíso é meu protesto por esse mundo desigual, que, biblicamente, para os religiosos, é assim desde Caim e Abel. Talvez por isso, o conformismo não deixa a revolução acontecer", define o realizador.
“A abordagem que constrói a narrativa do filme surgiu desde sempre. Mas a iniciei, mesmo, através de uma pesquisa, há 22 anos, e só agora ela chega às telas do cinema. Isso me faz ter esperança que um dia a reforma agrária aconteça e que possamos ter o direito à terra, trabalho e pão, como diz o poeta", salienta o cineasta.
Solange Moraes, produtora do filme, também comemora a chegada do novo trabalho de Orlando Senna.
“A chegada do Longe do Paraíso aos cinemas é um sentimento de dever cumprido para com o mestre Orlando Senna e a sua esposa, Conceição Senna, que confiaram a mim essa missão", relembra a produtora ao citar a saudosa Conceição, com quem Orlando dividiu sua vida.
Com seu tema urgente, Longe do Paraíso também encontrará sua audiência para além dos habituais frequentadores das salas de cinema. Solange explica: "Estamos numa parceria com o MST, desde o coquetel até às ações para que os trabalhadores rurais que fazem parte do movimento possam ver o filme nas salas de cinema e nos assentamentos desejados", pontua.
Fase de celebração, trabalho e de ainda mais valorização de uma história de vida brilhante, o título de Doutor Honoris Causa entregue pela UFBA brinda com esmero essa carreira. Orlando reflete sobre esse momento e define com precisão: "Uma sensação de reconhecimento de uma trajetória que construí por paixão à arte. É como receber um certificado por tudo isso. Um certificado que muito me honra e que me coloca num lugar de agradecimento à universidade e ao meu país".
Somos nós quem lhe agradecemos, mestre!
Cerimônia de entrega de título Doutor Honoris Causa a Orlando Senna / Amanhã, 17h / Reitoria da Ufba
Longe do Paraíso / Dir.: Orlando Senna / Com: Ícaro Bittencourt, Emanuelle Araújo Heraldo de Deus, Sonia Dias, Bertrand Duarte, Caco Monteiro, Felipe Mago, Everton Machado, Aline Brune e Lavínia Alves / Sessões: Quarta-feira (06): Cine Glauber Rocha, 19h / Sábado: (09): Saladearte CineMAM, 18h
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