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Peça resgata famosas personalidades baianas dos últimos séculos

Mulher de roxo, santa Dulce, Clarindo Silva, Floripes (primeira travesti assumida) são alguns dos retratados

Publicado sábado, 23 de abril de 2022 às 06:00 h | Autor: Eugênio Afonso
Rowena Ferri (em primeiro plano), seguida por outros personagens da peça, é a mítica mulher de roxo
Rowena Ferri (em primeiro plano), seguida por outros personagens da peça, é a mítica mulher de roxo -

‘Ali, sangrava, doendo lágrima a lágrima, debatendo-se entre a dor do ouro fundido atravessando a pele, a carne e o cálculo de um homem que, dizendo-se seu noivo, futuro marido e protetor, derretera as alianças de compromisso misturando-as à pólvora em nome de uma suspeita inafiançável’.

Esse trecho do conto O ouro da ira, da escritora baiana Clarissa Macedo, que consta do livro Histórias e Histórias da Bahia, é baseado na vida real de Júlia Fetal, figura jovem e simbólica de uma Bahia romântica, assassinada pelo noivo, o professor João Estanislau Lisboa, com uma bala de ouro confeccionada com as alianças do próprio noivado. 

Ocorrido no século 19,  esse famoso caso de feminicídio, conhecido como O Crime da Bala de Ouro, é uma das histórias que compõem o espetáculo de teatro A Mulher de Roxo e Outras Histórias da Bahia, em cartaz no Espaço Cultural Casa 14, no Pelourinho, aos sábados, até 14 de maio, sempre às 19h30.

 Escrita e dirigida pelo professor, psicólogo e diretor de teatro Adson Brito do Velho, a peça coloca em cena personalidades baianas que marcaram época e se transformaram em verdadeiras lendas urbanas de Salvador, como a mulher de roxo, santa Dulce dos Pobres, Clarindo Silva (Cantina da Lua), Floripes (primeira travesti assumida da Bahia), João Estanislau e Amilton Santos, o tratorista que desobedeceu uma ordem judicial e se recusou a derrubar barracos no bairro periférico da Palestina em 2003.

“As pessoas têm se identificado muito com os personagens. A peça também está servindo como material de reflexão. As pessoas saem de lá, agradecem e dizem que vão pensar sobre a questão do desrespeito aos valores humanos, da violência contra a mulher”, conta o diretor.

Ainda segundo Brito, a peça, além de informar, também quer emocionar as pessoas, sobretudo nesse momento tão peculiar que estamos atravessando. A ideia é rememorar importantes figuras da história da Bahia dos três últimos séculos, narrando passagens importantes da vida de cada uma delas.

“Infelizmente, a história da Bahia não consta da grade curricular dos ensinos médio e fundamental, está silenciada e foi retirada dos livros didáticos. Então, ficou essa lacuna em que os baianos não conhecem a história de sua cidade. A partir daí, eu faço um resgate desses personagens”, relata Adson.

Machismo e revolta

 Em 1h15 de espetáculo, os seis atores que compõem o elenco dão vida a todos os personagens: Alexandro Beltrão vive João Estanislau, Admilson Vieira interpreta Amilton e Clarindo, Sofia Bonfim faz santa Dulce, Rowena Ferri é responsável pela mulher de roxo, Regis Spiner dá vida a Floripes e Cláudia Rosa faz uma participação especial.

Para Beltrão, que também interpreta personagens secundários, como João Maurício, que foi curado a partir de um milagre de santa Dulce, e um oficial de justiça, na cena do tratorista, seu personagem principal traz à baila o tema do machismo patriarcal.

“A importância de João Estanislau está em mostrar a relação, muitas vezes doentia, nas relações afetivas, onde geralmente o homem quer tomar posse do corpo e da alma da mulher. A peça é um convite para que as pessoas tomem conhecimento também da nossa riqueza histórico-cultural tão pouco divulgada para a população”, resume Beltrão.

O ator Admilson Vieira conta que para compor Clarindo e Amilton fez pesquisas profundas através de muita observação e leitura. “Ficava observando como eles falam, gesticulam, e na peça tento passar isso da forma mais parecida. Acredito que o objetivo do espetáculo é reavivar, rever essas figuras que ficaram muito conhecidas na Bahia e conhecer o legado que elas deixaram para a sociedade”, comenta.

Além do elenco principal, outros profissionais também participam da encenação, já que diversas passagens da vida dos personagens são  narradas por Carlos Pronzato (cineasta argentino), Aline Nepomuceno (atriz), Léo Kret do Brasil (dançarina trans), Liana Cardoso (apresentadora de rádio e TV) e Cláudio Sacramento (radialista).

A Mulher de Roxo e Outras Histórias da Bahia / Espaço Cultural Casa 14, rua Frei Vicente, 14, Pelourinho / 23 e 30 de abril, 07 e 14 de maio / 19h30 / 30,00 (inteira) e 15,00 (meia) / Vendas no local no dia da apresentação, reservas pelo (71) 98631 3242 ou Sympla

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