MUSICAL
Primeira ópera do baiano Gilberto Gil estreia em Salvador
Unindo as culturas brasileira e indiana, ópera acontece neste sábado
Por Eugênio Afonso
Em um mundo onde o ódio tem despontado fortemente como um elemento presente na comunicação e convivência entre os seres humanos, a ópera-canção Amor Azul quer unir céu e mar para que o amor se faça presente.
Primeiro trabalho operístico do multitalentoso compositor e cantor baiano Gilberto Gil, 82, reconhecido como um dos maiores da MPB, em parceria com o maestro italiano Aldo Brizzi, 64, que atualmente dirige o Núcleo de Ópera da Bahia, Amor Azul será apresentada no próximo sábado, dia 23, às 18h30, na Concha Acústica do Teatro Castro Alves.
Aclamada por onde passou – Paris e São Paulo –, a obra mescla música popular brasileira com canto lírico e dança indiana. Dividida em dois atos, a apresentação conta a história de amor – através de 40 canções – entre a divindade Krishna e a mortal Radha, inspirada no poema indiano clássico Gita Govinda, de Jayadeva Goswami.
É uma viagem entre a Índia antiga e o Brasil contemporâneo, conectando culturas através da orquestra sinfônica, do balé indiano e de gêneros musicais brasileiros, como samba e afoxé, além de ritmos afro-brasileiros e o uso do veena, um tradicional instrumento de cordas do país de Ghandi.
Para Gil, Amor Azul é uma obra musical poético-literária e teatral sobre um texto milenar da cultura indiana com deuses, semideuses e humanos. “O Gita Govinda, poema que dá lastro à ópera, foi escrito por Jayadeva, um dos maiores poetas da Índia ancestral, há cerca de mil anos”.
“Tem um lado da minha busca espiritual conhecidamente associado ao mundo oriental (Índia, China etc). Um trabalho ligado a esse campo, como é o Gita Govinda, tem necessariamente a ver com o meu interesse particular pelas culturas e religiões dessa parte do mundo”, acrescenta o nosso Buda Nagô.
No entanto, a versão completa da obra – com cenário e encenação – ainda está por vir, segundo o compositor de Tempo Rei, que também vai estar no palco como narrador. “Aqui em Salvador, trata-se de uma versão-concerto da ópera, tal como foi apresentada em Paris e São Paulo. Nesta versão-concerto, eu canto alguns trechos do personagem Jayadeva”.
Regente da orquestra, Brizzi conta que, como toda história de amor, o espetáculo tem momentos de encanto, paixão, traição, ciúme, raiva, saudade e loucura. “A ópera contém também muita espiritualidade e misticismo, além da junção de MPB e do canto lírico, do alujá com uma orquestra que é lírico-sinfônica, mas que ao mesmo tempo é uma expansão sinfônica da maneira de Gil tocar o violão. Estas são novidades que tornam este projeto único”.
Ele acredita que um mundo que vai rumo ao ódio gratuito precisa de muito amor para que céu e mar se encontrem. “No nosso caso, a MPB e o canto lírico, para se fundir no mais ‘azul dos azuis’ (citação de um verso que Krishna canta na ópera)”.
A parceria com Gil, segundo o maestro, foi um grande momento vivenciado em um encontro que durou cinco anos. “Senti no meu parceiro uma concentração e dedicação total. Cada nota, a mais simples, foi feita com amor, cuidado e sempre à procura da profundeza do sentido”, pontua Brizzi.
Nuances variadas
São mais de 150 artistas no palco, incluindo a Orquestra e Coro da Neojiba e solistas do Núcleo de Ópera da Bahia. Entre eles, está Irma Ferreira, 33, cantora, atriz e professora de canto lírico baiana, responsável por dar vida à protagonista Radha. Antes, a própria Irma já tinha interpretado Gopi, outra personagem da obra.
“O amor de Krishna e Radha é uma história rica em significados, afinal Krishna é um Deus, a personalidade suprema, e Radha, uma mortal. E a forma como Radha o ama, e que ela espera que ele a ame, não é a mesma vista por Krishna, que tem, igualmente, o amor de todos os humanos, e isso a põe à beira da loucura, até ele ser flechado pelo deus do amor e se apaixonar por ela”, salienta a soprano.
Em Amor Azul, a história é contada de forma que o amor possa ser visto e sentido em várias fases. “Então, Radha vai passar por uma paixão ardente, raiva, ódio, decepção, insanidade, e, ao fim, pela entrega e realização do amor maior. Está sendo, sem dúvida, um desafio imprimir todos os sentimentos existentes nessa trama sem me inebriar pelas possibilidades que essa música traz ao caminhar tão profundamente entre a ópera e a canção”, detalha Irma.
Ela conta ainda que a personagem Gopi ocupa um lugar significativo em suas realizações artísticas. “Ela representa as mulheres humanas e toda humanidade se apaixona por Krishna. Então, ela é amiga de Radha, mas também é enlaçada nessa paixão. O desafio de fazer Gopi foi justamente traduzir essa complexidade em poucas intervenções musicais”.
E, por fim, garante que cantar em casa, na Concha, com o autor de Andar com Fé, conduz a experiência a um outro patamar. “Porque estar no palco com Gil vai além da realização artística. É uma realização pessoal, espiritual e principalmente ancestral”.
Além de Gil, Brizzi e Irma, o espetáculo tem ainda as performances dos solistas Josehr Santos (Krishna), Graça Reis (Sakhi) e Jean William (Espírito da Floresta).
Amor Azul / 23 de novembro / 18h30 / Concha Acústica do Teatro Castro Alves / Inteira R$ 180; meia R$ 90 / Vendas: bilheteria do TCA e Sympla
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