DIVERSIDADE
Websérie documental baiana retrata cena artística LGBTQIA+
Dividido em cinco episódios com pouco mais de 10 minutos cada, o documentário já está disponível no YouTube
Por Eugênio Afonso
Na música Flutua, uma espécie de hino da comunidade LGBTQIA+, o cantor e compositor Johnny Hooker dá o recado: ‘baby, eu já cansei de me esconder entre olhares, sussurros com você, somos dois homens e nada mais, eles não vão vencer... ninguém vai poder querer nos dizer como amar’.
Pois é ancorado nesse lema e outros mais, como invisibilidade e marginalização de profissionais das artes, que já estão disponíveis, no canal do YouTube do projeto, todos os episódios da websérie documental Queerbrada. Um trabalho que retrata a marginalização da cena cultural LGBTQIA+ através de cinco histórias de artistas da terra.
Dirigido a quatro mãos por dois baianos, o cineasta Eduardo Tosta, um dos responsáveis pelo primeiro curta-metragem de animação baiana que esteve no Festival de Cannes, em 2021, e o jornalista Matheus dos Anjos, o audiovisual conta com uma equipe 100% LGBTQIA+.
“Queerbrada é um projeto que foi criado com a ideia de ser um documento. Existe uma necessidade de memória que precisa ser preenchida. Mas, para além disso, a série também surge com o propósito de plataforma para esses artistas que participaram. De modo geral, o ponto principal é engrandecer – ainda mais – a cena e os artistas LGBTQIAP+ de Salvador”, conta Matheus.
Todo o roteiro é centrado nas dores e delícias da comunidade, e a própria escolha do título é uma marca disso. Veio da junção da palavra queer (estranho, em inglês) – termo que se tornou uma espécie de guarda-chuva para minorias sexuais e de gênero – com a conjugação brada (presente do indicativo do verbo bradar), uma alusão ao ato de resistência política contra o silenciamento e o apagamento da categoria desde tempos imemoriais.
Matheus diz ainda que a semelhança com a palavra quebrada (quase queerbrada) não é gratuita, já que esse é um termo usado para se referir a locais periféricos, muitas vezes os únicos espaços disponíveis para que esses artistas possam ocupar e desenvolver sua arte. O diretor garante que trazer o público para esses debates é um jeito de fazê-lo ter consciência de que as questões da comunidade são de todos, inclusive de pessoas não LGBTQIA+.
“A importância de situar o público é a de ampliação, não só do movimento como um corpo político, mas também como potência para o crescimento da nossa arte e cultura”, detalha dos Anjos.
Periferia e silenciamento
Com produção da Camaleoa Filmes e o intuito de resgatar o debate sobre o preconceito e a discriminação que esses artistas sofrem diariamente, além da enorme dificuldade de divulgar seus trabalhos, o documentário tem um forte tempero soteropolitano.
Dividida em cinco episódios com pouco mais de dez minutos cada, Queerbrada documenta a rotina de artistas que lidam com fotografia, poesia, música e performance. Tem cantora lírica, fotógrafo, poeta, tatuadora e drag queen, personagens que contam suas histórias e falam sobre os desafios e dificuldades enfrentados para trabalhar com arte na cena LGBTQIA+ da capital baiana.
Para a drag queen Nola Criola, uma das participantes do projeto, documentar essas histórias é tornar eterno um legado que possa manter vivo, para as próximas gerações, esse gênero artístico.
“A série cumpre esse papel de maneira excepcional! Fora que o reconhecimento de outros artistas e o cuidado para conosco e com nossas trajetórias são enriquecedores e muito importantes para nossa autoestima e autoafirmação dentro do mercado”, agradece Nola.
Já Liz Reis, que também está na websérie e se define como cantora operística, atriz dramática e poetisa, Queerbrada traz visibilidade para artistas LGBTQIA+ que, na maioria das vezes, têm sua capacidade subestimada apenas por serem quem são.
“A série traz a oportunidade de nossa história ser mostrada de uma forma linda, e isso é muito importante para mim enquanto artista”, resume Liz.
Os episódios funcionam de forma independente, mas possuem um elo em comum: todos se passam no centro histórico e na periferia de Salvador. O público vai acompanhar os personagens por lugares como Pelourinho, Avenida Carlos Gomes, bairros como Periperi e Fazenda Grande do Retiro, além de casas noturnas que fazem parte da agenda cultural queer de Salvador, como o bar Âncora do Marujo.
“Os espaços que acolhem a arte e a cultura LGBTQIA+ geralmente são empurrados a existir nas margens do espaço urbano, nos becos, nos locais mais escuros e com pouco policiamento. E aqui em Salvador nós já temos um histórico de violência contra esses lugares”, conclui Matheus.
O projeto tem apoio financeiro do Estado da Bahia através da Secretaria de Cultura (Prêmio Cultura na Palma da Mão/PABB) via lei Aldir Blanc, redirecionada pela Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo, Governo Federal.
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