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ECONOMIA

76% dos trabalhadores fazem “bicos” para complementar renda

De acordo com especialistas, a alta informalidade é reflexo da inflação e do desemprego

Por Júlia Isabela*

15/05/2023 - 6:00 h
Imagem ilustrativa da imagem 76% dos trabalhadores fazem “bicos” para complementar renda
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Os chamados “bicos” ou trabalhos informais são opções muito procuradas por quem precisa de dinheiro extra ou está desempregado, como revela um levantamento feito pela Serasa em abril. Segundo a pesquisa Impactos da Vida Financeira no Trabalho, 76% dos entrevistados (todos consumidores da base Serasa) precisaram recorrer a um trabalho informal para complementar a renda.

De acordo com especialistas, a alta informalidade é reflexo da inflação e do desemprego, além da falta de acesso ao crédito no mercado. Participaram do levantamento brasileiros que negociaram suas dívidas no último Feirão Limpa Nome, realizado em março, e os que continuam inadimplentes.

A especialista em educação financeira e gerente da Serasa, Patrícia Camillo, esclarece que o brasileiro está com menos poder de compra e maior dificuldade no acesso ao crédito, assim a renda não é mais suficiente para honrar tanto as dívidas atuais quanto as futuras. Por isso as pessoas recorrem a um trabalho extra, muitas vezes na informalidade, para começar a quitar suas dívidas.

“Sem dúvida, a busca por renda extra pode ser uma solução muito interessante para aquelas pessoas que buscam renegociar suas dívidas, ou até mesmo realizar algum plano ou algum sonho. Claro que essa busca tem que estar de acordo com a realidade de cada brasileiro, sua rotina e suas habilidades. Nos canais oficiais da Serasa têm muitas dicas sobre como conseguir essa renda extra e é importante que cada um analise a sua situação para entender qual se aplica melhor à sua realidade”, orienta Patrícia.

A gerente da Serasa aponta ainda que com o valor extra no orçamento familiar, algumas coisas importantes devem ser analisadas para que esse dinheiro seja utilizado para o pagamento de uma dívida. A primeira dica é que sejam priorizadas as contas básicas (luz, água, gás, aluguel). Depois, é importante olhar para as contas com os juros mais altos para que a quitação ocorra de forma mais instantânea e os juros parem de correr.

Já para o economista Marcelo Ferreira, o grande número de pessoas na informalidade demonstra um cenário econômico brasileiro complexo. “É um cenário econômico de altos índices de desemprego e, consequentemente, é um ciclo vicioso que prejudica a economia, porque as empresas arrecadam menos, né? Elas têm menores níveis de receita e assim passam a poder investir menos, e então contratam menos ou até demitem trabalhadores, o que leva a esse cenário de informalidade, porque as pessoas passam a não encontrar oportunidades dentro do sistema formal, nem para trabalhar e nem para empreender”.

“Quem está inadimplente precisa e deve buscar alternativas para tentar melhorar sua situação, melhorar de vida, e regularizar seu nome. Então, dadas as dificuldades, a informalidade não é, evidentemente, o cenário ideal, mas é talvez o caminho possível. Se a pessoa tem algum tipo de aptidão ou habilidade que possa converter em algo que se aproxime de um negócio, pode considerar a possibilidade sim”, diz o economista.

Falando especificamente do cenário baiano e do Nordeste, Ferreira explica que a região está consolidada há algum tempo com um dos maiores índices de desemprego do país, e que Salvador também é uma capital com alto índice de desemprego. Assim, com o cenário econômico nacional estando mais agravado, existe mais risco de quem está na cidade sofrer com as questões relacionadas à falta de oportunidades, se vendo impelido a partir para a informalidade.

De acordo Patrícia Martins, analista de risco financeiro, uma renda extra adicional é sempre bem-vinda, entretanto, quando os “bicos” se referem à atividade principal, isso traduz a precarização das relações de trabalho, ou seja, os trabalhadores ficam desprotegidos, sem vínculo contratual e com fonte de renda instável, o que não é desejável. Segundo ela, muitos desses trabalhadores sequer contribuem para a previdência social e, em caso de intercorrências, ficam completamente desprotegidos.

Um dos motivos que levam ao alto número de trabalhos informais é também a dificuldade de acesso ao crédito, principalmente para os inadimplentes, como explica a analista. “Para a concessão de crédito, as instituições financeiras cruzam uma série de dados, com o objetivo de avaliar a capacidade de pagamento do solicitante. Assim, os inadimplentes são identificados e isso dificulta bastante a obtenção de crédito e, em caso de concessão, são aplicadas taxas de juros mais altas para compensar o risco de empréstimo a clientes inadimplentes. Considerando-se que a taxa básica de juros, a Selic, está bastante alta, temos um impacto ainda maior”, diz Patrícia.

Se for inevitável trabalhar informalmente, o economista Marcelo Ferreira orienta: “Se houver realmente a necessidade da informalidade, antes de iniciar qualquer atividade é preciso avaliar os aspectos de orientação, de capacitação, e de acesso a crédito, de acesso a financiamentos e empréstimos, e a linhas de microcrédito, porque juntando esses fatores, que contribuem para tornar atividade com maior chance de êxito, as pessoas passam a ter possibilidade de desenvolver o trabalho e ter algum retorno”.

Ainda de acordo com a pesquisa Impactos da Vida Financeira no Trabalho, 49% dos consumidores segue otimista sobre seu futuro profissional e têm melhores perspectivas sobre o mercado de trabalho. A especialista em educação financeira e gerente da Serasa, Patrícia Camillo, comenta como é possível buscar melhores opções no mercado de trabalho enquanto se tenta superar a inadimplência.

“Uma dica que sempre damos é de ter um planejamento financeiro, pois ele ajuda bastante no entendimento dos gastos atuais e quais são as oportunidades de redução ou cortes enquanto essa busca de um emprego melhor ou aumento de renda acontece. Primeiro é preciso entender todas as entradas e saídas e categorizar esses gastos. Ali estarão as contas fixas que precisam ser mantidas, pois são necessárias para a sobrevivência, e aquelas que podem ser reduzidas e as que são consideradas mais supérfluas e podem ser substituídas, reduzidas ou até mesmo eliminadas. Esse entendimento é importante para aí sim fazer um planejamento de curto e longo prazos, até que a entrada seja maior que a saída, que é o ideal, de forma que seja possível poupar todos os meses para uma reserva de emergência”.

Saúde mental

Valéria Meireles, psicóloga do dinheiro, trabalha com a Serasa na análise dos dados sobre os impactos na saúde mental. Ela esclarece como a informalidade pode afetar o trabalhador psicologicamente. “As consequências de um segundo trabalho podem ser mais cansaço físico e estresse emocional. Especialmente para as mulheres, que já possuem jornada dupla, uma vez que chegam em casa e vão cuidar da limpeza, da comida e das crianças e acabam sendo ainda mais penalizadas”.

“Ter mais de um emprego/ trabalho é cansativo e estressante. Sendo possível, sugere-se que o “bico” seja feito em casa ou o mais próximo possível da mesma, para evitar desgaste com deslocamentos e gastos com transporte. Ter um “bico” que se considera de fácil e prazerosa execução também ajuda a não se estressar tanto, embora nem sempre isto aconteça”, complementa Valéria.

*Sob supervisão da editora Cassandra Barteló

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