ARMADILHAS FINANCEIRAS
Desenrola, Threads e até Barbie servem de ‘iscas’ para golpes
No ano passado, mais de 8 milhões de brasileiros foram vítimas deste tipo de crime
Não foi raro encontrar na internet promoções e conteúdos relacionados ao filme da Barbie nos últimos dias. A produção mobilizou uma legião de fãs e justamente por conta de seu apelo virou arma para golpes financeiros no meio digital. E ele não está só. Outros temas em alta nas rodas de conversa – como a nova rede social Threads e até o programa de renegociação de dívidas Desenrola Brasil – também foram transformados em arsenal para fazer vítimas.
Só no ano passado, mais de 8 milhões de brasileiros foram vítimas de golpes financeiros, segundo estimativa da pesquisa realizada pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas e pelo Serviço de Proteção ao Crédito. É como se quase 22 mil golpes fossem aplicados por dia.
Advogado e especialista em combate a fraudes, Afonso Morais já adianta que, na próxima semana, a média deve ser ainda maior com o Dia dos Pais em alta, estimulando o surgimento de falsas ofertas para a data. De acordo com ele, para os criminosos, momentos de entusiasmo sempre rendem mais vítimas, já que as pessoas estão mais descuidadas. Por isso, assim que surgem temas e iniciativas que geram mobilização popular, os golpistas fazem uso delas.
“Esse time de crime está cada vez mais organizado. Hoje, eles têm uma espécie de call center montado. Têm estratégia, marketing. Não é uma pessoa enviando mensagens, são robôs disparando um volume muito grande e 10% acabam se tornando vítimas”, afirma o especialista.
As modalidades de golpe são muitas. Morais explica que, com a Barbie, por exemplo, os criminosos estão oferecendo uma suposta “oportunidade única” para assistir ao filme da boneca da Mattel. “Eles disponibilizam um link para a pessoa assistir ao live action exclusivo da Barbie. Quando a vítima clica, o aparelho dela recebe um vírus que rouba todos os dados, inclusive financeiros”, explica o especialista.
No Threads, os golpes são semelhantes, mas, dessa vez, o que atrai as vítimas é a oferta de até R$ 12 mil apenas para comentar ou curtir publicações da rede social. O valor não é transferido e com os cliques os criminosos roubam dados de celulares e computadores.
Já com o Desenrola Brasil, a estratégia mais usual é outra: o chamado ataque de phishing. Segundo o especialista, essa modalidade de golpe vem disfarçada de uma mensagem que aparenta ser legítima, mas na verdade busca induzir a vítima a fornecer informações confidenciais, como senhas e números de cartões. Elas podem chegar direto na caixa de entrada de e-mail, SMS e Whatsapp ou por meio de um site fraudulento.
Foi nas redes sociais que o designer e ilustrador Abel Marcelino, conhecido como Petit Abel, se tornou vítima e instrumento de golpe. Com um perfil de mais de 200 mil seguidores no Instagram e trabalhos para o Big Brother Brasil e GloboPlay, o artista viu sua conta ser hackeada e usada para tirar dinheiro de seus seguidores.
O perfil passou quase uma semana nas mãos dos criminosos. Para atrair as vítimas, eles utilizavam as ilustrações de Abel oferecendo oportunidades de investimento com retorno financeiro rápido. Entre os seguidores, os prejuízos foram de R$ 200 a R$ 3 mil.
Abel depois descobriu que houve uma tentativa de portabilidade da operadora telefônica dele. Foi aí que ele percebeu que tinha sido vítima de um golpe que utiliza o chip do celular para roubar todos os dados da vítima. “Depois, quando fui vasculhar, percebi no meu e-mail que essas tentativas de login estavam acontecendo já há três meses. É uma quadrilha que estuda os perfis, a linguagem deles, o público e vai tentando por todos os caminhos possíveis até conseguir quebrar uma fragilidade da segurança”, conta.
O ilustrador acredita que o que fez ser escolhido pelos golpistas foi justamente a relevância de seu perfil e o fato de suas ilustrações estarem sempre ligadas a algo que está acontecendo e repercutindo nas redes sociais. Na tentativa de evitar mais prejuízos, Abel fez um boletim de ocorrência e depois de muita burocracia conseguiu recuperar a conta com o Grupo Meta.
“Melhor remédio”
Advogada especialista em proteção de dados, Maria Clara lamenta as dificuldades enfrentadas na hora de tentar recuperar o prejuízo. De acordo com ela, geralmente é muito difícil rastrear os passos do golpe, por isso, prevenir acaba sendo sempre o melhor remédio.
“Os golpistas podem estar escondidos atrás de diversas camadas de anonimato na internet, utilizando técnicas de ocultação de identidade, servidores proxy ou até mesmo a dark web. Mas, às vezes, é sim possível “reverter” o prejuízo. Alguns exemplos são golpes com rastro digital com registros de endereços IP, transações financeiras ou atividades em redes sociais”, afirma.
O primeiro passo de quem foi vítima, segundo a especialista, é buscar ajuda especializada para resolver o problema o mais rápido possível e mitigar os danos. “O auxílio pode ser da polícia, de um advogado da área, de um técnico de tecnologia da informação. Estes profissionais vão poder orientar a bloquear ou alterar senhas, comunicar os golpes às plataformas ou aos bancos, encontrar saídas para recuperar acessos, ajudar na eventualidade de reporte de incidentes e outras medidas de urgência necessárias”, alerta a advogada.
Para evitar cair em uma armadilha, a orientação da especialista é ter no meio digital o mesmo cuidado do mundo offline: verificar sites antes de fornecer informações, manter softwares atualizados, proteger a privacidade nas redes sociais, utilizar senhas complexas e variadas e, sempre que possível, ativar a autenticação de dois fatores. Maria Clara chama atenção ainda que os prejuízos que inicialmente podem não ser apenas financeiros. Existem, por exemplo, os chamados riscos extrapatrimoniais, como é o caso do “golpe do amor”, e o roubo de dados para finalidades diversas, como o uso de convênios médicos.
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