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Fundador do Grupo Limiar conta a receita do sucesso

Publicado sexta-feira, 30 de janeiro de 2015 às 10:36 h | Autor: Joyce de Sousa
João Ramos
João Ramos -

Quando o engenheiro eletricista mineiro João Ramos veio para a Bahia, em 1978, para trabalhar no então Polo Petroquímico de Camaçari, jamais poderia imaginar que se transformaria em um grande empresário no estado. No primeiro dia em Salvador,  ele logo percebeu que precisaria fazer a sua parte para ajudar a dinamizar a economia local. Seis anos depois, fundava a Limiar, com uma padaria instalada em uma garagem. Em quase 37 anos, o Grupo agora possui uma fábrica de pães congelados e fatiados prontos para consumo que abastece além da  Bahia, os estados de Sergipe e Alagoas, com planos de expansão para todo o Nordeste. Nesta entrevista, João Ramos  conta sua história de empreendedorismo e  os planos do  grupo baiano, que emprega 400 pessoas. Ramos revela que pretende abrir uma outra fábrica no Nordeste, mas antes, ainda este ano, deve dobrar a produção na Bahia, que hoje é de 50 toneladas/dia. Como lida com produto essencial, o empresários não teme crises.

Como começou a sua história de empreendedorismo?

A empresa começou com uma sociedade com o empresário Nivaldo Lariú, que se notabilizou  por ser o autor do famoso Dicionário de Baianês. No meu primeiro dia na Bahia, onde cheguei para  trabalhar no Polo, há quase 37 anos, fui logo fazer umas comprinhas. Foi quando notei que nos rótulos das embalagens não havia praticamente nenhum produto que não fosse de empresas do Sudeste. Os pensamentos foram remetidos às minhas aulas de geografia, em Minas, com o professor Alberto Furtado Portugal, que sempre dizia aos alunos que, quando se tornassem adultos, que dessem sua contribuição   para mudar a realidade do Nordeste. Aquilo ficou marcado, foi quando a semente da Limiar foi lançada. Seis anos depois, em 1984, fundamos a empresa, a uma quadra do supermercado que fui quando cheguei, na Pituba.

Como surgiu a ideia de trabalhar com produção de pão, se vocês era engenheiros do Polo? Geralmente, é uma área que tem tradição de quem já teve algum padeiro na família...

Sim, eu e o Nivaldo Lariú, que éramos colegas na Copene, estávamos pensando em abrir um negócio na Bahia, mas não sabíamos ao certo em que área, talvez ao algo com material elétrico, mais ligado à nossa área. Ficamos mais ou menos uns dois anos discutindo o que faríamos. Foi quando eu recebi um hóspede em casa, um primo paulista, que estranhou, à época, o fato de nenhuma padaria de Salvador abrir aos domingos. Ele, então, sugeriu que abríssemos uma padaria que funcionasse aos domingos e deixou uns rabiscos do projeto e custos. O papel ficou lá, uns dois ou três anos, jogado em um móvel, até que resolvemos resgatar aquele papelzinho e tocar o projeto. Outro fato também contribuiu: numa viagem de férias que fiz ao Rio de Janeiro, assim que chegguei lá, a primeira coisa que vi foi um anúncio de um curso de panificação na Barra da Tijuca. Fizemos, eu e minha esposa. Então, quando voltei, eu falei para o Nivaldo sobre tocarmos o projeto da padaria sugerido pelo meu primo. Procuramos um ponto comercial e nos instalamos em uma garagem na Pituba, na Rua Pernambuco. Notamos que, à época, o bairro da Pituba era cheio de pessoas de outros estados que estavam acostumadas com padarias abertas aos domingos. Percebemos também que havia uma simpatia natural dos baianos pelos cariocas. A poucos metros, já existia uma padaria chamada Morumbi, um bairro paulista. Então, resolvemos abrir a nossa com o nome fantasia Ipanema, um bairro carioca. A empresa já era Limiar, mas o nome fantasia era Ipanema.  Foi um sucesso, com filas e filas! Quem ia aos domingos, virara nosso cliente também durante a semana.

Como a Limiar saiu de uma padaria que funcionava numa garagem para ser hoje esta grande empresa?

Com o sucesso da Padaria Ipanema, resolvemos abrir mais duas unidades,   já com o nome de Pani House, que até hoje tem uma lá na Pituba. Tínhamos, nessa época, três padarias: duas na Pituba e uma no Stiep. Nesse meio tempo, Lariú decidiu sair da empresa, por questões meramente pessoais, e meu irmão comprou a parte dele. Hoje somos quatro sócios: eu, meu irmão e minhas duas filhas (Nara e Maíra), que dão à empresa um perfil essencialmente familiar. Mas, a mudança de padaria para a empresa que nos tornamos hoje começou quando percebemos, com as três unidades, que havia muito trabalho e muitos custos. Havia dificuldades para coordenar as três lojas e  manter a qualidade.  Comecei a fazer pesquisas em outras padarias maiores e redes antigas em outros estados e vi que era um trabalhão sem fim, à medida que mais unidades eram abertas. Para reduzir custos e se tornar mais eficiente, apostamos em um centro de produção que abastecesse as lojas. Então, em 1993, eu decidi saí do Polo, porque durante nove anos, de 1984 a 1993, eu estava tocando o negócios da Limiar, paralelamente, com o trabalho no Polo - tendo meu irmão mais à frente da empresa e eu, lá e cá. Saí do Polo, porque vi que era preciso repensar o modelo de atuação da empresa, criar um novo conceito de produção. Daí fizemos um centro de produção, na Boca do Rio, que passou a abastecer as lojas. Somente em 2012, inauguramos a fábrica aqui na via CIA-Aeroporto..

Qual a área de atuação da empresa e os planos para o futuro?

Estamos investindo R$ 10 milhões este ano em novas linhas de produção. A meta é dobrar a capacidade atual, de 50 toneladas/dia, até 2016. Até 2019, nossa intenção é alcançar 200 toneladas/dia, além de inaugurar, até 2020, uma outra unidade no Nordeste, provavelmente em Recife, para ampliar a atuação na região. Hoje, a fábrica, que funciona 24 horas, emprega 400 funcionários e atende aos estados da Bahia, Sergipe e Alagoas. Além dos pães fatiados prontos para o consumo vendidos em supermercados e delicatessens, a empresa destaca-se pela produção do pão francês congelado, entre outros, fornecidos às padarias nos três estados. Eles já representam metade da produção. Dentro do objetivo de ampliar a atuação no Nordeste, também já firmamos contrato com a BR Mania, rede de lojas de conveniências dos postos da Petrobras, para fornecimento de pães congelados. Outro projeto do grupo é passar a fabricar pãozinhos de queijo congelados para preparo em fornos domésticos.

O senhor não teme as previsões de um ano difícil para a economia agora em 2015?

Nosso setor trabalha com um produto básico, essencial. Nos momentos de crise, a população acaba limitando  o consumo a produtos essenciais, como os pães, daí porque a empresa está apostando suas fichas nos negócios, na contramão de outros setores da economia. Ao contrário do que se possa imaginar, às vezes, nessas situações conjunturais da economia, este segmento cresce ainda mais.

O senhor contou sobre a sua constatação, há 36 anos, de que não havia muitas empresas de bens finais na Bahia? A questão não mudou muito desde então. Qual seria o principal entrave?

A Bahia tem tido baixos índices de atratividade e competividade, de acordo com relatórios internacionais. Isso me deixa triste, porque sou mineiro de certidão, mas me sinto um baiano, apaixonado pela Bahia. Às vezes, eu me sinto mais baiano que muitos baianos. Mas, o fato é que para se tirar licença ambiental aqui, por exemplo, são dois ou três anos. É uma morosidade, uma burocracia, uma máquina emperrada. O mesmo acontece para se conseguir um financiamento, pois este não sai sem a licença ambiental, e a licença não sai, sem o avará sanitário... Além disso, há um problema cultural, sobretudo, no Nordeste, de se empurrar um empreendimento importante com a barriga, como se aquilo não fosse representar um impacto significativo na renda de muitas pessoas. Mais do que política industrial, tem muito a ver com a cultura do povo também. O baiano tem muito isso de não se preocupar com o futuro, de viver o presente, e não dar a devida importância para programar o futuro, seu e do seu estado. Claro que há exceções, e que isso vem mudando muito, ao longo dos anos, mas ainda é um entrave para um progresso.

Mas, muitas empresas estão vindo para cá, visando a ampliação de seus mercados no Nordeste...

Sim, e aí entramos nos pontos positivos da Bahia, que tem uma localização estratégica no país. Há ainda a questão do estado ter cerca de 15 milhões de habitantes, ou seja, um senhor mercado. Nós mesmos já estamos subindo para outros estados,  visando todo o Nordeste, que tem tido um crescimento extraordinário. Estando na Bahia, pode-se produzir para vender tanto para o Nordeste, quanto para o Sudeste. O estado também já tem ótimas indústrias de base, e agora só falta a indústria de transformação. Quem tem visão, deve investir aqui em transformação. Questões político-partidárias à parte,  creio que se tivéssemos um empreendedor como governador, teríamos uma outra Bahia. Agora, por exemplo, quando aumenta o turismo, a gente vende muito mais. Só falta a Bahia investir mais não apenas em qualificação técnica, mas em qualificação ética também, para que as pessoas tenham mais responsabilidade e comprometimento também com o trabalho, visão de futuro, isso claro considerando as exceções e a melhoria, a cada ano, desse cenário que vem muito da cultura regional. Mas, na Limiar, apesar de algumas dificuldades, temos tido muito mais aspectos positivos com nossos funcionários, graças também aos nossos programas constantes de capacitação técnica e conscientização profissional.

E o por que nome Limiar?

Justamente por isso. Aqui,  todos, funcionários e clientes, são tratados como se estivessem num limiar para uma nova experiência melhor em suas vidas, a partir dos nossos produtos. O que queremos é que todos agreguem bons conceitos e rotinas saudáveis ou produtivas em suas vidas, a partir deste nosso Limiar.

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